DA VERDADE...

O real nunca é o que poderíamos acreditar, mas sempre o que deveríamos ter pensado.

Bachelard

Desabam sobre ti Amazonas de idéias, Nilo de dejetos. Em cada onda, em cada movimento, podem-se acafelar maquinações inquisitivas, sutis, refinadas. Não temas. A Razão-Crítica é o recato da inteligência, nos auxilia nas escolhas salutares, nas buscas daqueles gestos fundantes do “Ser-Feliz”.

Se fores, a fundo, nas engenharias verbais, te espantarás com tantas operações argumentativas que não passam de meros jogos sofísticos, falaciosos. Às vezes, ocorre isso sem a consciência do próprio indivíduo, é o cúmulo da alienação. É que nosso imaginário não se constrói sobre vazios, sobre “nadas”; ele se ergue a partir de nossas pisadas, de nossos caminhos ideológicos. Pior: quanto mais falsa a consciência, mais pedante, mais impostora.

Não há razão sem verdade. O problema é que esta não pode ter como critério o desejo pessoal, o desejo de uma minoria, ou mesmo, de uma maioria. Ser, portanto, “politicamente correto”, necessariamente, não quer dizer racional, verdadeiro. O bom funcionamento da razão consiste, sim, no uso de argumentos válidos, consistentes, coerentes, lógicos, construídos a partir de critérios, de fato, objetivos. A Verdade, deves saber, não é um somatório de delírios, não são representações do que se imagina ser. No rigor do termo, verdade nada mais é do que “o reflexo do objeto na mente”. Ou seja, “a adequação do pensamento com a coisa”. Desde que, claro, entendamos pensamento como consciência e coisa como fenômeno.

A tirania do não haver Verdades é cretinice intelectual, é perversão da inteligência como se existissem apenas o sujeito e suas verdades. Bazarian (O Problema Da Verdade) está certo: “Verdadeiros ou errados só podem ser nossos conhecimentos, nossas percepções, nossas opiniões, nossos conceitos ou juízos a respeito do objeto”. Vale, no entanto, um alerta: não confundamos pura coincidência entre uma conclusão qualquer de nosso raciocínio e estatísticas empíricas com atividade racional, analítica, crítica. Em síntese, posso te afirmar, sem o menor receio: “sem o sujeito cognoscente não há verdades”.

Neste processo, do “Ser-Feliz”, em meio a turbilhões de moldagens das coisas, do mundo, dos fenômenos, o exercício da Razão-Crítica é um “imperativo categórico”. Sabemos das várias acepções da verdade e de seus critérios. Que compreendes, por exemplo, por verdade material, verdade formal, verdade axiomática, verdade moral, verdade pragmática, verdade político-estatal, verdade dogmática e até verdades irreais? Se não podemos falar em verdade desfocada do “reflexo e da construção fiéis e corretas do objeto na mente, em forma de sensações, representações, conceitos, teses ou teorias”, o critério da verdade é absolutamente imprescindível. A solução, destarte, está no chamado “critério de autoridade”, no “critério da evidência”, no “critério da ausência de contradição”, no “critério da utilidade”, no “critério da prova”, no “critério da prática”, no “critério da teoria” ou num misto disto tudo?

Desde, enfim, o “que é, é. O que não é, não é”, reproduzido por Sócrates, ao “Conhecereis a verdade e a verdade vos tornará livres’, do nazareno, buscamos o que ouso chamar de excelência ética da verdade. Nada mais gera tanta Felicidade, nada mais é tão elevado, nada mais é tão duradouro, nada mais é tão virtuoso quanto a verdade. Vivermos em mentirarias, nos atolarmos em areias movediças das auto-ilusões, é desperdício, é estupidez, é negação de nossa própria essência. Ainda que sejamos isolados, perseguidos, caluniados, achincalhados, humilhados e mortos.