AS VERTENTES DOS ARTISTAS...

Não sei por que sempre me pego a pensar sobre as vertentes dos artistas, suas particularidades, seus dons, suas fontes de inspiração e suas manias como ser humano passível de todo tipo de manifestação nos aspectos da exigência humana. Às vezes em conversas informais fico indagando como é que as pessoas são na prática, ou seja, como é que o compositor age para produzir uma música. Aliás, o artista tem a metamorfose entre a sua figura comum e o seu dom de produzir a sua arte. Essa mudança de personalidade e esse momento em que a inspiração toma conta da sua alma é que me chama atenção, pois cada um encerra uma particularidade diferente. Assim, ontem mesmo, perguntei a um poeta que une como elemento do seu dom uma dupla face, por reunir duas características de produção, por ser poeta e ao mesmo tempo músico. Meu questionamento era porque ele produz mais poesia do que música? Ele se limitou a responder que era por preguiça. Essa resposta sincera me levou a referendar a idéia de que é mais fácil trabalhar com as letras do que com as melodias.

Eu reluto em debater essa questão entre a figura do poeta e do compositor. O primeiro é aquele que busca inspiração das letras e consegue transformar suas idéias num composto de palavras que tomam conta do coração das pessoas, através da sua expressão de um fato que se transforma num episódio de profunda absorção pela emoção humana, eis que contada de forma tão encantadora que traz a vibração da alma. Ou então, os versos saem cheios de metáforas que incutem na mente do leitor aquela vontade inequívoca de captar a mensagem. Conquanto o compositor é capaz de reunir na sua obra um lado misterioso (para nós leigos), por trazer uma harmonia entre a poesia e a junção com as letras musicais, através do lado bipolar do dom artístico, pois une o dom de fazer letras lindas como a capacidade intrínseca de produzir a música, através da sintonia entre a palavra e o estratagema musical, de tal forma que o compositor transforma a poesia numa outra emoção distinta, através do sentimento e da emoção dos acordes de um violão, da harmonia de um teclado ou do rasqueado de uma acordeão.

Que mistério é esse? Responderia o observador mais formal que a poesia pode ser feita por um grande amante das letras, já a música exige do seu agente de produção um estudo específico, para que possa - na sua execução - alcançar suas prerrogativas que estão implícitas no estudo e na dedicação em torno da literatura musical. Pois eu diria a esse amante do formalismo que não é bem assim! Existem aquelas pessoas enviadas para produzir música que nunca freqüentaram um banco escolar na área. São autodidatas. Aliás, caso formos fazer uma estatística dos compositores que perambulam no meio artístico, teremos um dado incomum, pois a maioria deles emerge de métodos espontâneos ou da chamada filosofia empírica do conhecimento, ou seja, aprendem por si só, sem necessidade de ajuda técnica, pois geralmente começam olhando e prestando atenção em quem desenvolve o ofício, até que pegam um violão ou em qualquer outro instrumento e aprendem com tamanha facilidade.

Mas qual é a diferença entre o erudito e o autodidata. Aí é que vem questão cultural, porque alguns (rara exceção) procuram o lado erudito e passam a buscar as fórmulas de fazer música, ou seja, buscam a sinestesia (visão extensiva da música), para ir atrás das escalas que incorporam letra e notas musicais. Esse músico tem a ciência ao seu lado, mas, curiosamente, será transformado num simples maestro e muitas vezes nem chega compor uma única música. Entretanto, outros que buscam a existência efêmera da música aleatória, produzindo composições que buscam retratar momentos corriqueiros (no folclore popular), eis que muitas letras demonstram as alegrias e as tristezas envolvendo o lado humano das pessoas. Entretanto, não há dúvida que qualquer um deles - o erudito e o autodidata - são seres privilegiados, ante a própria definição de música, segundo a Wikipédia musical: "Definir a música não é tarefa fácil porque apesar de ser intuitivamente conhecida por qualquer pessoa, é difícil encontrar um conceito que abarque todos os significados dessa prática. Mais do que qualquer outra manifestação humana, a música contém e manipula o som e o organiza no tempo. Talvez por essa razão ela esteja sempre fugindo a qualquer definição, pois ao buscá-la, a música já se modificou, já evoluiu. E esse jogo do tempo é simultaneamente físico e emocional. Como "arte do efêmero", a música não pode ser completamente conhecida e por isso é tão difícil enquadrá-la em um conceito simples."

No confronto entre o poeta e o compositor; fica meu profundo respeito pelo segundo. Ocorre que manejar as letras é coisa mais comum. O que é compatível entre os dois é a inspiração que surge pelo caminho estreito da alma. Entretanto, o poeta tem como instrumento de trabalho o computador (antigamente a caneta ou o lápis). Já o compositor tem como apetrecho para produzir a sua obra um instrumento musical. Ou melhor, o compositor possui um requisito a mais na sua criação que é o dom de transformar as palavras e as frases em uma melodia e em um ritmo.

Teve uma ocasião - na minha ofuscada visão sobre o tema - que dei uns versos para um músico e pedi que ele transformasse em música. Não saiu nada. Até hoje não sei se foi porque entreguei os versos a um músico que não compõe, ou porque o compositor - no momento de fazer uma canção - deve ter uma simbiose entre a letra e a melodia. Gostaria de ter essa explicação um dia, daí a razão destas minhas ponderações, pois sou bem curioso sobre esse aspecto, já que sou um admirador "de carteirinha" do compositor.

Se algum compositor tiver ocasião de ler este meu apelo, por favor dê-me algumas aulas. Tenho curiosidade até quanto à memorização da letra. Não sei se ela vem por essa simbiose a que me referi acima, ou se pela insistência de aperfeiçoá-la à melodia e ao ritmo? Até nisso o poeta perde para o compositor, pois ao lhe faltar o ingrediente da escala musical ou da junção entre as palavras e a melodia, os versos ficaM espalhados e dispersos no mundo do papel ou da memória do computador e muitos poetas não memorizam suas obras, como é o meu caso.

Enfim, creio que ambos são necessários e produtivos para o mundo, no sentido de trazer coisas lindas que tocam o coração e emocionam as pessoas. Assim, cada um deles - com sua sabedoria - leva para nossa sociedade um legado de alegria e de descontração para que a vida seja aceita com mais brandura.

Machadinho
Enviado por Machadinho em 24/08/2009
Reeditado em 24/08/2009
Código do texto: T1771323