O místico cinco

Artigo - [ 16/08 ]

O místico cinco - http://www.cruzeirodosul.inf.br/materia.phl?editoria=44&id=210774

Adalberto Nascimento

O pentagrama quase foi utilizado como símbolo oficial das primeiras Olimpíadas (Atenas, 1896). Todavia, ele acabou sendo substituído por outro, composto de cinco círculos entrelaçados

O governo dos Estados Unidos, durante a Segunda Guerra Mundial, simplesmente confinou, em campos de concentração, os japoneses e seus descendentes que viviam em território americano. Além de humilhados, milhares de nipônicos foram saqueados e vítimas de muita sacanagem. A justificativa utilizada para esse ato ilegal era de que aquela gente formava uma “quinta-coluna” dentro da terra do Tio Sam. Pois é, os gringos ficaram “ensamdecidos”. Aqui também os - hoje queridos - japas foram vítimas de odiosos preconceitos.

No início daquela guerrra, organizações minoritárias germânicas formaram uma “quinta-coluna” na Polônia e na Ex-Tchecoslováquia, para facilitar a invasão desses países pelas tropas de Hitler. Ainda hoje, grupos minoritários são vistos como integrantes da tal “quinta-coluna”. Para os ingleses, são os católicos irlandeses; para os Estados Unidos e vários países da Europa, são os árabes (principalmente após o ataque às Torres Gêmeas, em 2001); para os árabes, são os judeus e vice-versa. E assim vai...

Essa expressão, “quinta-coluna”, foi utilizada pela primeira vez na Guerra Civil Espanhola, em 1936, quando um general disse que, além das quatro colunas que ele comandava, havia uma quinta infiltrada em Madri, para ajudar a consolidação do general Franco como ditador. E, de fato, o “generalíssimo” acabou governando a Espanha de outubro de 1936 até sua morte, em 1975. Foi um “arrcáide de ruim”, como dizem os espanhóis de Sorocaba.

Até aqui falamos do cinco de forma subliminar, ligando-o intrinsicamente a um assunto militar. Mas ele está presente em muitas outras coisas. Uma delas, por exemplo, é a estrela de cinco pontas - o pentagrama -, símbolo utilizado nos primórdios do cristianismo pelos cristãos gnósticos.

Muito tempo depois das primitivas seitas cristãs, o pentagrama quase foi utilizado como símbolo oficial das primeiras Olimpíadas (Atenas, 1896). Todavia, ele acabou sendo substituído por outro, composto de cinco círculos entrelaçados, cada um dos quais representando um dos cinco continentes. Os círculos, digamos, foram adotados por serem mais condizentes com o espírito olímpico de inclusão e harmonia.

Em tempos remotos, Pitágoras acreditava que o cinco representava o ser humano - simbolizando as cinco extremidades (cabeça, dois braços e duas pernas) através de um pentagrama, cujas pontas representavam os cinco elementos: fogo, água, ar, terra e espírito. Para os gregos, o pentagrama era uma figura consagrada à deusa Higeia (deusa da saúde), cujo nome é um acrônimo, em grego, daqueles cinco elementos.

Como vemos, o cinco está associado a várias coisas religiosas e místicas. Mais um exemplo disso provém do islamismo, que é fundamentado em “cinco pilares”: um único deus, cinco orações diárias, caridade aos necessitados, autopurificação através do jejum e peregrinação à Meca.

Já para os judeus, “Hamesh” (mão, em hebraico) representa os livros da Torá, os cinco primeiros livros do Antigo Testamento, também chamados como “mão de Miriam”, irmã de Moisés. No islamismo, como símbolo de cinco boas virtudes, temos “Hamsa” - “mão de Fátima” -, sobrinha de Maomé. Conceitos de “brimos” briguentos e, como vemos, adeptos do nepotismo.

Para os católicos, por sua vez, a festa de Pentecostes celebra o aparecimento do Espírito Santo aos apóstolos, cinquenta dias depois da Páscoa. Pentecostes vem do grego e quer dizer “quinquagésimo dia”. E também temos que os cinco primeiros livros do Antigo Testamento são designados como Pentateuco (do grego, “os cinco rolos”).

Para pelo menos mencionarmos algo mais oriental sobre este assunto, temos que os antigos chineses acreditavam haver cinco elementos primordiais: madeira, fogo, terra, água e metal. Tipificando dois desses elementos: fogo era “Yang”; água, “Yin”. Com base no principio filosófico chinês da dualidade, “Yin” era o princípio passivo, noturno, escuro, frio; e “Yang” era o princípio ativo, diurno, luminoso, quente. Coisas “made in China”...

Já por estas bandas e hoje em dia, o cinco virou uma coisa utilitária - de marqueteiro. Hotel cinco estrelas, cheque cinco estrelas, cliente cinco estrelas...

Pra encerrar este nosso “pentapapo”: sempre que penso no cinco, lembro-me da “Quinta de Beethoven”. E, por consequência, de uma “pegadinha” feita por um querido amigo de origem japonesa, contemporâneo de faculdade e, infelizmente, já falecido. Resumindo: ele disse-me que a quinta sinfonia de Beethoven fora feita em homenagem à namorada chinesa do genial compositor alemão. Intrigado, perguntei: como assim? E o Hiromi Sakoda, com aquele jeito alegre de ser - só dele -, simplesmente entoou, em tons crescentes e sorridamente: “Chan, Chan, Chan, Chen...”.

Muito melhor a Quinta de Beethoven, mesmo em chinês, do que uma quinta-coluna.

Adalberto Nascimento é engenheiro e escreve a cada duas semanas neste espaço, sempre aos domingos (dal@globo.com) - http://www.cruzeirodosul.inf.br/materia.phl?editoria=44&id=210774

Douglas Lara
Enviado por Douglas Lara em 17/08/2009
Código do texto: T1758204