Universidade de (a)conhecimentos
Fazendo uma breve abordagem histórica da universidade, Clark Kerr afirmava que em 1520 mais de 85 das instituições que existiam na época, pelo menos 70 eram universidades. Com isso, as universidades se tornaram uma instituição de grande importância e têm-se observado os inúmeros conceitos e funções que se tem dado à mesma. Karl Jasper afirmava: “é o lugar por concessão do Estado e da sociedade uma determinada época pode cultivar a mais lúcida consciência de si própria”. Ou seja, tinha como função investir ideias; ser disponível para a educação do homem no seu todo, pois é um centro de cultura; o ensino das aptidões profissionais deve ser orientado para a formação integral. Oterga y Gasset não ia muito além: transmissão de cultura; ensino das profissões; investigação cientifica e educação dos novos homens da ciência. Então, ocorre para a universidade uma multiplicidade de funções, diferenciadas pelo conhecimento de cada individuo, e a distinção entre as funções manifestas e funções latentes úteis para analisar relações intersistemáticas entre o sistema universitário e o sistema de ensino superior, ou entre este e o sistema educativo, ou ainda entre e o sistema social global.
Há alguns que ainda tentam estabelecer uma estrutura organização mais desenvolvida e diversificada a fim de ampliar os pontos de saída para as universidades que a mantêm estabilizadas como devem. Assim, discorre-se sobre a alta cultura, que é uma cultura-sujeito, e a cultura popular, que é uma cultura-objeto, objeto das ciências, da etnologia, do folclore, da antropologia cultural, ligeiramente transformadas em ciências universitárias. A tentativa do tratamento “democrático” das universidades causou uma explosão universitária, a alteração significativa da composição de classe do corpo estudantil, que se transformou numa classe pouco valorizada, por parte, e a ampliação dos quadros de docentes e investigadores possibilitaram a massificação das universidades e com ela, a vertigem da distribuição em massa da alta cultura universitária.
Outro tópico importante, que é a relação educação-trabalho, pondera sobre a dicotomia da relação entre educação e trabalho. É comprometimento de as universidades realizarem um trabalho intelectual qualificado, produto de uma formação profissional contemplada e implicando no oferecimento de uma correspondência estável ao mercado de trabalho, para fundir-se num processo produtivo ao qual o universitário se adapte. Apesar disso, é evidente que hoje as universidades não conseguem conter o controle da educação profissional, já que ocorreu uma massificação da quantidade dessas instituições que não produzem um trabalho rígido e que ofereça perfis profissionais qualificados. É de praxe toda universidade indicar que está de acordo com as normas exigidas através de dados. Entretanto, é notório que na prática esses dados são enganosos no que diz respeito ao desenvolvimento tecnológico, à transformação da ciência, enfoca produção, e das competitividades internacionais das economias, tópicos que não estão sendo realizados de acordo com base cientificamente fundados e sérios.
Pode-se afirmar ainda que a participação ativa da universidade perante a sociedade tem-se mostrado improdutivo, haja vista dois problemas de alto grau que são enfrentados pela instituição: a natureza da investigação básica e as virtualidades e limites da sociedade. O primeiro problema diz respeito ao aumento dos custos e a conversão progressiva da ciência em força produtiva que acabou por pôr em causa a própria validade da distinção entre a investigação básica e aplicada. Aplica-se ao fato de que as grandes empresas multinacionais abriram as suas próprias instituições universitárias e ao fato de que o Estado priorizou os incentivos fiscais às universidades e centros de maior rigidez nas investigações científicas e produtividades. A universidade se relaciona com a sociedade com uma incomensurável responsabilidade social perante os problemas do mundo contemporâneo. Não obstante, é raro essa obrigação ser cumprida e, por isso, as universidades são criticadas por não mobilizarem o conhecimento cientifico a favor dos problemas sociais.
A supremacia dessa universidade deve ser constituída pela validade da mesma e, portanto, da concordância consensual da sua essência institucional. Entretanto, vários fatores levaram a crise de sua legitimidade, devido à intensa separação entre as classes presentes na educação de ensino superior e na alta cultura, fatores que se mostraram visíveis socialmente. Este colapso institucional relaciona-se a falta de autonomia da universidade, devido a dois fatores problemáticos: a crise do Estado-Providência e a desaceleração da produtividade. O primeiro fator define-se porque o Estado tem passado de produtor de bens e serviços (escolas, por exemplo) para a de comprador de bens e serviços produzidos no setor privado. O segundo fator relaciona-se aos cortes que tendem a universidade a procurar meios alternativos de financiamento que dificulta a aparência adequada da autonomia da universidade e a sua responsabilidade social.
A hegemonia da universidade e a crise de sua legitimidade, ligadas aos fatores já argumentados, causaram a esta instituição uma avaliação de desempenho funcional que ocasionou estranheza e até hostilidade. Isso fez com que a universidade perdesse a sua centralização perante a sociedade. Por sua vez, a avaliação de desempenho funcional das universidades tem ocorrido com enormes dificuldades devido a três problemas principais: a definição do produto universitário, os critérios da avaliação e a titularidade da avaliação. E, sem estes, teríamos um quadro bem diferente se as universidades tivessem mais autonomia a fim de multiplicar os conhecimentos científicos beneficiando a sociedade com a massificação dos poderes hierárquicos e realizar a ascensão dos indivíduos. Um dos fatores mais plausíveis que se podem considerar como motivos da ocorrência desta situação é a perda de poder político e social para impor condições que garantam uma avaliação equilibrada e despreconceituosa do seu desempenho.