Canoas, um lugar de ficar...

Não sendo filho daqui, eu sempre escutei dizer que Canoas (RS) era uma “cidade-dormitório”, uma estação onde passava o trem que ia a Caxias, ou um ponto de abastecimento de combustível para quem ia a São Leopoldo, Novo Hamburgo ou a Serra. Depois, ouvi que era a cidade da Petrobrás, do avião “encostado” no INPS, das invasões do Guajuviras e dos problemas sociais da Mathias. Também foi a cidade do “já teve”, como cinemas, restaurantes (quem não lembra “o Casarão”), o Veronese e o Oriente. E por aí vai...

O fato é que, por imposições profissionais, trabalhei em Canoas por três vezes. Em 1965 fui subgerente da Caixa na Base Aérea. Depois dei umas voltas pelo interland e voltei em 1969, também como subgerente para a “nova” agência, da XV com a Fioravante Milanez. Defronte ao prédio atual. Nessas duas oportunidades, eu trabalhei em Canoas, mas morava em Porto Alegre. Houve outras voltas, desta feita maiores, que me levaram para longe, trazendo-me de volta em 1989, aí como gerente, no prédio atual, onde me aposentei em 1990.

Pois foi em fins de 1999 que descobri que Canoas não era tão-somente um lugar de passar, mas de ficar. A permanência mais eficaz na cidade, o entrosamento com as pessoas, os meios culturais, universitários e religiosos me fizeram ver a realidade e conhecer melhor a cidade, a ponto de me convencer a fixar raízes aqui, eu que em 25 anos de trabalho fizera 21 mudanças. A partir de 2000, descobrindo a aprazível rua Caramuru, ali onde o centro entesta com a Mathias, passei a morar em Canoas. Hoje circulo por aí com a naturalidade de um filho da cidade.

Não é a melhor cidade do mundo? Não, claro que não é! Canoas, como tantas outras, tem seus defeitos, a maioria deles proveniente do descaso dos homens públicos e da intelectualidade, como a falta de uma proposta para a cultura, inexistência de um teatro (embora tivesse sido prometido na campanha municipal), boas livrarias e a interação de suas universidades com a carência cultural do povo.

Existem boas tentativas da Fundação Cultural, por exemplo, atuando junto à cultura popular, mas ainda é pouco, uma vez que em 67 anos de emancipação ainda não se conseguiu despertar na população um interesse pelas letras, pelas artes e pelos bons sons. Embora existe uma boa gama de escritores, poetas, artistas plásticos, etc. ainda há chão a percorrer.

No terreno social faltam iniciativas de se fugir da mesmice de uma cidade urbanisticamente deformada pela BR-116 e pela linha do Trensurb, onde o ato de atravessar a cidade é uma constante operação de risco. No entanto, outros aspectos nos levam a expectar as boas graças do futuro, uma vez que conquistamos, nos últimos dez anos, bons supermercados, um shopping de boa qualidade, com mais de dez cinemas (embora na maioria dos dias, vazios), etc.

Quanto ao urbanismo, constata-se um centro sufocado pelo número de carros, pela necessidade de estacionamentos e pela política equivocada de equacionar a convivência dos veículos e dos transeuntes, onde se dificulta a vida de ambos. Isto sem falar no péssimo planejamento de nossas calçadas e em outras deficiências, injustificadas para uma cidade que tem uma significativa arrecadação de tributos.

Mesmo assim, Canoas chega jovem aos 67 anos. Jovem de espírito e de sonhos; rica em convívio e hospitalidade; pujante de trabalho e de ideais; próspera de obras e de vida. Tudo isto nos revela uma cidade boa para se morar, não mais passar, mas ficar, ficar e fazer história, com as pessoas de bem, com os poetas, intelectuais, artistas, povo em geral e todos que fazem do pensar uma proposta e uma busca de vida, capaz de melhorar as coisas, em um estado e em um país onde faltam tantas coisas.

Antônio Mesquita Galvão
Enviado por Antônio Mesquita Galvão em 13/06/2006
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