Generalização do ódio

"Ninguém deve ser elogiado pela sua bondade quando não tem forças para ser mau" — François de La Rochefoucauld.

O ódio tem sido qualificado como mal, ao ponto de se tornar um preconceito. Porém se todo e qualquer ódio é mau, então não vale poder odiar o mal? Talvez o ódio seja também uma maneira de se amar. Alguns necessitam do objeto do ódio, necessitam dele nem que seja para disfarçar. E, quem tentou derrotar o ódio foi odiado. Deus também odeia. Disse Javé, Deus de Israel – “Eu odeio o divórcio” (Ml. 2:16). Por isso:

Eu te odeio. Eu te odeio porque você não me abandonou quando te trair; preferindo me perdoar. Eu te odeio porque você fala verdades que não quero ouvir. Eu te odeio porque em sua presença sinto-me vexado. Eu te odeio porque eu não soube te fazer feliz, e, mesmo assim tu me recebes. Eu te odeio por me aceitar naquilo que fracassei. Eu te odeio porque me tornei um embaraço; mas pra ti, sou ativo. Eu te odeio porque sem você a vida é pior. Eu te odeio porque você contou comigo quando não deveria. Eu te odeio porque não sou o que você queria que eu fosse. Eu te odeio porque não tive coragem de morrer só para te fazer sofrer. Eu te odeio porque você sempre esperou o melhor de nós. Eu te odeio porque você não sofreu só por mim. Eu te odeio porque não tive coragem de te trocar. Eu te odeio porque vejo em ti o meu sofrimento. Eu te odeio porque tu me fazes carinhoso. Eu te odeio porque estamos sempre juntos. Eu te odeio porque você ler o meu coração. Eu te odeio porque não sou igual a você. Eu te odeio por mais alguma coisa que não sei dizer, mas eu odeio te esquecer porque me faz lembrar de te.

Odeio-me porque te odeio. Eu me odeio porque não soube ser melhor que você. Eu me odeio porque tu me tens quando não deveria me ter. Eu me odeio. Eu me odeio porque sendo o que sou tu não me odeia.

Eu odeio a tua vida porque nela, todos fingem te ouvir. Eu odeio a tua história porque tudo ali lembra você. Eu odeio tua carne porque ela lembra a mim. Eu odeio teus amigos porque eles te odeiam. Eu odeio teus seguidores porque eles entendem mais de te, que de mim. Eu odeio teus dependentes porque eles recusam mais do que eu te nego.

Eu odeio os que te odeiam porque me estimulam a te odiar com vingança. Eu odeio os que te odeiam porque eles me instruem a trair meu ódio. Eu odeio os que te odeiam porque eu odeio os teus oponentes. Eu odeio os que te odeiam porque só eu sei te odiar.

Eu odeio o ódio porque me faz odiar você. Eu odeio o ódio porque ele me faz insensato contigo. Eu odeio o ódio porque ele não tem motivo de odiar você. Eu odeio odiar, porque eu não amo o ódio, mas odeio não amar o ódio para ser feliz te odiando.

Eu odeio não te amar odiando. Porque tu me amas sem odiar. Que ódio não saber; não poder; não suportar; não assumir; não admitir; corresponder o teu amor sem ódio; esse ódio que me desafia a te amar sem odiar. Mas houve um tempo em que te amava; e, simplesmente não te odiava! Odeio esse tempo porque esse tempo te deixou! Que ódio, sem ódio!

Luiz Clédio
Enviado por Luiz Clédio em 06/08/2009
Reeditado em 10/08/2009
Código do texto: T1739936