Desde que me mudei de residência no ano passado vinha brigando com uma vespa. Era abrir a janela da cozinha, ela entrava. E ficava esvoaçando e chateando; para espantar travava uma guerra... comigo mesma! Porque sempre sofri de uma fobia impertinente de insetos.

Nesta semana andei refletindo sobre a semelhança deste capítulo da vespa na minha rotina com as nossas reações a determinadas situações. Em muitas, mas, preferencialmente, nos dramas amorosos. Alguma coisa não dá certo e nos fechamos para a vida. Trancamos as janelas. Tudo passa a não prestar: os homens; o amor; as nossas experiências... Uma desilusão amorosa, em muitas das vezes, tem a capacidade de nos provocar uma auto-nulidade desastrosa! Estigmatiza toda uma rica programação de vida que, neste território, invariavelmente, tem muito a oferecer.

Por que reagimos como eu faço com a vespa? Trancamos todas as nossas portas e janelas. O ar fresco não entra; a atmosfera do cômodo não se renova, nos engalfinhamos numa iniciativa doentia - e inútil - de espantar um problema que, em verdade, reside mesmo é do lado de dentro.

A vespa, com efeito, continuará voando e entrando. Alguma coisa a atrai para dentro da minha cozinha - muito provavelmente, o pote de mel sobre a minha geladeira! E este pote de mel atraente é justamente a determinante necessária à presença da vespa, chamando-a feito um ímã! Da mesma forma como, trancando nossas janelas emocionais, com todo o mel atrativo lá dentro de nós, não alcançamos espantar a "vespa" dos nossos traumas e das nossas recordações que teimam em esvoaçar à nossa volta! E trancar, diga-se, de nada adianta! Piora o que já está ruim. Fechando nossas "janelas", emperrando neste estacato de tempo que nos enfurna em experiências que já ficaram para trás, sem valia, e nada mais são do que isso - experiências - cortamos todo o respiradouro vital: o único possibilitador de irmos ao encontro da grande renovação de todos os dias que, inevitavelmente, nos cura; nos presenteia com novas chances, com novas pessoas, com novos acontecimentos e novas oportunidades - com o grande milagre que, em verdade, é a vida!

Melhor é o contrário: destrancar, em caráter de urgência, as janelas! Mesmo que ainda doa. Mesmo que o apego ao passado grite, proteste, induzindo-nos a um continuum sem fim de emoções que já não nos servem beneficamente. Sei que o efeito do tempo é o maior agente propulsor de que, naturalmente, tudo se encaminhe para isto. Refiro-me, contudo, àquele tipo de reação pertinaz susceptível de resistir mesmo aos efeitos sedativos da passagem dos meses e dos anos, levando-nos a reviver, como num disco quebrado, as mesmas lembranças estagnadas desagradáveis e responsáveis pela falsa ilusão de que o amor e o mundo não valem a pena. Por causa de um único episódio, todo o resto da humanidade passa ao papel de vilã... Concordam comigo que é atribuição excessiva de valor a um grão de areia perdido na vastidão imensa das praias?!

Refletindo sobre este paralelo nas múltiplas vivências humanas, decidi, num dia desses - particularmente propício, em razão do calor excessivo do dia - abrir de vez as quatro janelas da cozinha. Dane-se a vespa! Que entre! A casa é minha, são alguns milímetros contra um metro e sessenta e dois; espanto e pronto! É questão de lógica: no meu território, é ela ou eu!

Alguém poderia alegar que vespa é um bicho perigoso. Meu filho mesmo já foi ferroado por uma aos dois anos; inflamou, teve que tomar antibiótico, o dedinho ficou todo inchado, um horror! Sei disso tudo. Mas ferroadas acontecem, e há remédio. E uma vespa não vai alterar o curso da minha rotina doméstica por causa disso, assim como aquela ferroada não alterou todo o fluxo da vida do meu filho.

Na vida, meus queridos leitores, ferroadas acontecem. São treinamento de resistência e da nossa capacidade de superação. O que não justifica que as ferroadas dominem as nossas horas, inutilizando o melhor das nossas vidas, e nos cegando para o incrível potencial de felicidade inerente a cada um dos nossos dias!

Espantem as vespas! E sejam livres e felizes!

Com amor,



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Christina Nunes
Enviado por Christina Nunes em 11/06/2006
Reeditado em 26/09/2006
Código do texto: T173601
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