A religiosidade e a ignorância de mãos dadas
Uma das melhores formas de adquirir sabedoria e combater o etnocentrismo é viajar por diferentes lugares e conhecer as mais diversas culturas. A minha esposa e historiadora Alristela Cruz, por exemplo, demorou a aceitar a idéia de que a cultura da sua região de origem era igual as demais, pois no seu ponto de vista a forma como os outros viviam carecia algum tipo de reparo. Os conhecimentos adquiridos na universidade aliados às viagens e a literatura, certamente ofereceram-lhe suporte necessário para mudar de opinião e perceber que não existe uma cultura melhor do que outra e que aquela que antes lhe era sagrada e intocável, hoje merece ser alvo das suas análises.
Confesso que fiquei surpreso com a rápida análise de Alristela ao observar a contribuição do cristianismo para a economia e a cultura da sua cidade de origem, no Rio Grande do Norte. De acordo com a historiadora, a crença infundada e demasiada da maioria daquela população solidifica o conformismo de alguns, impedindo-os de crescer profissionalmente, de melhorar economicamente e evitar, por exemplo, o descontrole de natalidade, pois a Igreja Católica, predominante naquela região, é contrária a prevenção da gravidez dentro do casamento. Desta forma, é muito normal termos famílias carentes numerosas e mulheres sendo obrigadas a manter relacionamentos insustentáveis simplesmente para manter um dos sacramentos da igreja.
Não pretendo ganhar fama de beligerante, nem quero discutir as crenças do ponto de vista dogmático, mas partindo do princípio de que todos têm o direito de professar a fé, me utilizo desta prerrogativa para fazer a minha análise sobre a inegável contribuição religiosa, sobretudo cristã, para a perpetuação da miséria, da conservação de relações mal-sucedidas, do descontrole demográfico e da alienação total do ser humano.
Por outro lado, não quero contribuir com os ludíbrios das igrejas nem daqueles que vivem à custa dos crédulos. Esses últimos acreditam piamente que só existe bondade nas pessoas que ecoam o nome de deus, mas são eles próprios que desejam todo tipo de vingança e castigo sobre aqueles que não se convencem da existência de um ser supremo que coordena todas as coisas do universo. Como pode um seguidor de toda a bondade se contaminar com o ódio? Para a maioria das denominações religiosas isso é totalmente compatível. Confesso que em algum tempo tentei me enganar, mas a franqueza e a sinceridade não me permitiram fazer parte desse conto de fadas. O fato é que as mentiras inculcadas como verdades absolutas transformavam as certezas em dúvidas, mas hoje tenho plena convicção de que toda pessoa pode ser correta e provida de caráter sem necessitar de um credo religioso, e ainda sim, terá a oportunidade de ter uma vida ainda melhor. Muitos também terão uma vida cheia de graças se viverem dentro de uma igreja. É uma questão de escolha, o problema é que muitos não têm a opção.
O mundo que encontramos só pode continuar intocável para aqueles que se permitem continuar na ignorância. Graças às pessoas que se despem das suas crenças originais é que podemos usufruir dos modernos recursos nas áreas da saúde e da tecnologia. Se cada cientista que contribuiu para o desenvolvimento humano fosse se prender ao pragmatismo religioso, certamente não haveria remédios para as mais simples doenças nem uma máquina para realizar o mais singelo serviço. Para a Igreja Católica, Galileu Galilei e Nicolau Copérnico estavam errados e mereciam ser mortos. Ainda hoje Charles Darwin é visto como um impostor pelos cristãos radicais, principalmente por aqueles que se nega a estudar as suas teses. Todas as pesquisas sobre o DNA corroboram as idéias do biólogo, dando sustentação para novas descobertas e tratamentos de saúde.
Tal como Alristela, Darwin era católico e ambos não tinham interesse em fugir um centímetro do pragmatismo da igreja romana. Mas a mentira tem pernas curtas e a verdade vem sempre à tona. Igreja e cientistas estão certos? Depende. Só se existirem duas verdades. A escolha é sua, a minha missão é provocar a reflexão.