A CORUJA E O TATU

Os modernistas brasileiros, na década de 20 do século passado, escolheram como seu símbolo animal o Jabuti. Em 1959, Edgard Cavalheiro criou o Prêmio Jabuti, que hoje é o mais importante prêmio literário do Brasil. O integralismo de Plínio Salgado propôs como símbolo do verde-amarelismo a Anta. Oliveira Vianna, um dos iniciadores da sociologia brasileira, argumentou, nos tempos do Estado Novo de Getúlio, que o Tatu seria animal simbólico mais enraizado em terras brasileiras. Nos inícios da colonização, em diversos documentos, o Brasil é denominado de "Terra dos Papagaios", " Terra dos Macacos". Este recurso ao mundo animal, para simbolizar situações ou habilidades humanas, remonta a tempos imemoriais de nossa história. Serpentes, crocodilos, hipopótamos, leões, boi ápis, gatos já estão presentes na literatura dos faraós egípcios e na literatura bíblica. Às vezes se misturava homem e animal, como no caso das esfinges e do minotauro. A Águia Romana dominou o mundo durante séculos. Na Grécia antiga a ave da deusa Minerva era a coruja. E como Minerva, na mitologia, saira da cabeça de Júpiter, ela se tornou a deusa

dos amantes da sabedoria (os filósofos). Deixando de lado Minerva, a coruja se tornou o símbolo da filosofia. Hegel nos diz que " a Ave Minerva levanta vôo ao crepúsculo" . Com isto quis significar que a filosofia vê, penetra, interpreta e desvenda a escuridão da realidade humana, assim como a coruja, com seus grandes olhos, atravessa a escuridão e, na escuridão, descobre sua comida. A missão da filosofia seria iluminar a mente humana, obscurecida pela frágil luminosidade que acompanha os acontecimentos. Platão dizia que a maioria dos homens se encontra como que vivendo numa obscura caverna, e pensa que este é o mundo real. O filósofo deve retirar as pessoas deste ambiente sombrio e trazê-las para o mundo da luz.

Mas, nem todos aceitam que a coruja seja um símbolo completo para esta tarefa da filosofia. Talvez, símbolo melhor para essa missão filosófica fosse o galo, que anuncia a aurora. Pois a filosofia busca idéias claras e distintas. Outros agumentam que a coruja levanta vôo e apenas contempla o mundo panoramicamente do alto, sem colocar os pés no chão. E uma filosofia abstrata, metafísica, encastelada em torres de marfim, seria apenas uma perturbação mental. Uma filosofia sem consequências para o aperfeiçoamento dos homens, e a transformação social, de nada valeria. Por isto, o símbolo da coruja deveria ser complementado pelo símbolo do Tatu. Esta filosofia do tatu seria uma filosofia que penetra no chão da realidade, preocupando-se com os problemas concretos dos homens em cada região. Uma filosofia telúrica. Uma filosofia engajada, libertadora, conscientizadora.

Penso que estão com razão os que assim argumentam. Segue disto que os amantes da sabedoria (os intelectuais, os filósofos) deste nosso país, em suas elocubrações nas academias, ou fora delas, deveriam se preocupar, em primeiro lugar, com a solução dos problemas brasileiros, e não apenas tentar descobrir o que filósofos, sociólogos ou políticos de outras terras pensaram. Maquiavel aconselha que o político seja, ao mesmo tempo, lobo e raposa (não devemos necessariamente concordar com Maquiavel!); eu penso que todo pofessor ou intelectual (filósofo ou não!) deveria se espelhar na simbologia da coruja e do tatu. Interpretar e propor soluções para os problemas humanos concretos. Filósofos do mundo, unamos a coruja e o tatu!

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