Presídio Federal não resolve criminalidade
Depois de tantas mortes ocorridas em maio de 2006, principalmente no Estado de São Paulo, decorrentes das rebeliões nos presídios e ataques violentos a policiais e civis, diversas vozes se levantaram para exigir o aumento da duração das penas de prisão, o endurecimento da legislação penal, chegando alguns até a pedirem a adoção de prisão perpétua. Além de não serem soluções das mais adequadas sob os pontos de vista jurídico e sociológico, essas propostas enxergam apenas a conseqüência do problema, não a causa.
É muito pouco provável impedir por completo a ocorrência de crimes, porém é amplamente possível diminuir os aspectos favoráveis à sua prática. Para isso nosso País necessita pôr em ação uma séria política pública preventiva de combate à criminalidade e voltar os olhos não só para a repressão do delito, um dos aspectos do sistema penal, mas olhar e agir com relação às causas do crime, como a corrupção, injustiças sociais, fatores econômicos, culturais, educacionais, entre outros. Vale lembrar que pobreza não é sinônimo de criminalidade. Se assim fosse não existiriam delitos econômicos, os chamados crimes do colarinho branco, em que os delinqüentes gozam de certo status social, como proprietários de casas de câmbio, gerentes de instituições financeiras e empresários de alto escalão.
Com efeito, a criação do primeiro presídio federal, no município paranaense de Catanduvas, localizado a menos de 500 quilômetros de Curitiba/PR e com início das atividades previsto para 20 de junho de 2006, não incidirá na origem das infrações penais. Evitará – e assim esperamos – que os presidiários de lá não fujam nem se rebelem. Também não podemos dizer que a construção dessa penitenciária trata-se de solução imediata, vez que desde 1984 a Lei n. 7.210 (Lei de Execuções Penais) dispôs sobre a construção de presídios federais e somente agora, após mais de 20 anos e tantas vidas ceifadas, será inaugurado o primeiro estabelecimento penal federal, de uma série de cinco. Os demais serão em Campo Grande/MS, Mossoró/RN, Porto Velho/RO e Viana/ES, um em cada região do Brasil.
A expansão da onda criminosa não deve ser enfrentada apenas de modo repressivo, instrumentalizada pelo direito penal. O direito, sozinho, pode muito pouco. Apesar do reduzido tamanho dessa frase, seu sentido possui vasta dimensão e expressa uma incontestável verdade da vida social. O direito, aqui entendido como a lei, não pode ir de encontro à realidade nem deve ignorá-la. Por exemplo, nenhuma lei pode dizer que é crime a gravidez de uma mulher durar mais de cinco meses, pois é próprio da natureza humana a gestação durar além desse período. Portanto, a legislação precisa estar de acordo com a essência humana e a realidade social vigente para que tenha efeitos práticos e não se transforme em letra-morta.
Noutros termos, não basta criar presídios de segurança máxima e nele enclausurar pessoas, pois dessa forma a sociedade brasileira permanecerá com seus nichos de mazelas propensos ao surgimento de inúmeros novos candidatos a ocupantes das penitenciárias federais. Legislar na tentativa de que o direito, por si só, solucione problemas e transforme a realidade é fazer da lei letra-morta. E no caso de ausência de uma séria política criminal talvez seja ainda pior: faz dos cidadãos futuras pessoas-mortas.
Curitiba/PR, 07.JUN.2006.