Meu dinheiro & seu dinheiro
O dinheiro foi criado para servir de mediador e facilitador nas trocas de bens materiais, com o objetivo de sanar as dificuldades criadas pelas trocas diretas (escambo), justamente pela falta de parâmetros de valor entre as mercadorias; atualmente, ele está chegando a um estágio tão avançado de tecnologia, que podemos afirmar, com certeza, que e o dinheiro é hoje apenas uma forma de medida de valor virtual por excelência, pois quaisquer transações de médio ou grande porte são todas efetuadas por meios eletrônicos, onde o papel-moeda nem aparece. A coisa é tão natural que, por qualquer razão, no caso de se encontrarem grandes somas de dinheiro em espécie com alguém, já se caracteriza como sendo algo ilegal, escuso, sob a lógica da ocultação de evidências de fraudes. Acontece que, desde o aparecimento da moeda com a função de intermediária de trocas, de medidas de valor etc., ela veio ganhando o “status” de instrumento de poder, com a força de provocar até guerras, de “comprar” a dignidade humana, de mudar o destino de nações e, o que é pior, de carregar toda a humanidade para a autoexterminação, através da destruição ambiental desenfreada e gananciosa.
Vamos fazer justiça - a culpa de tudo isso não está nos costados do dinheiro, isto é lógico, mas sim na índole do ser humano, cujo apego aos bens materiais é de tal monta, que chega a cegar até eclesiásticos ou então a outros mais, tidos como modelos de virtudes. É difícil de se escusar de rir quando ouvimos alguém se referindo a bens monetários sob seu controle como “meu dinheiro”, quando muitas vezes ele é fruto de falcatruas, de corrupção, de chantagem, de contrabando, de lenocínio, de exploração da fé alheia, de tráfico de drogas, e por aí vai!
Levantemos, pois, quatro formas de evidências, por onde iremos comprovar o quanto de desvio de conduta o apego ao dinheiro pode provocar:
1. Imaginemos alguém que se proponha a comprar algo para si, com o seu próprio dinheiro – ele irá tomar o máximo de precauções para que o custo-benefício seja o mais proveitoso possível, isto é, que seja algo da qualidade mais aceitável, pelo valor mínimo de mercado e que lhe satisfaça de maneira bem suficiente;
2. Agora vejamos o que acontece quando esse mesmo alguém vai usar o seu próprio dinheiro para comprar algo para outrem – daí o cuidado com a qualidade deixa de existir, desde que seu preço seja o mais irrisório possível, pouco se importando com a satisfação do presenteado;
3. Agora, se a compra for para si, mas com numerário alheio – o que irá importar será o máximo da qualidade, custando o que custar, mesmo que seja acima do mercado, mas que lhe traga o máximo de satisfação;
4. Por último, no caso da compra de algo para alguém, com o dinheiro de terceiro – nesse caso, tudo vira uma festa, pois nada mais importa, nem a qualidade do produto, nem o quanto custa, e muito menos se irá ou não levar qualquer satisfação ao usuário.
Tudo isso é muito lamentável, mas convenhamos, com apenas raras exceções, é a pura realidade da vida contemporânea, desde os primórdios da civilização. É isso aí - como poderíamos esperar algo melhor para a humanidade do que a iminência do seu desaparecimento da face da Terra? O desrespeito para com o próximo atinge a píncaros muito altos, a ponto de haver uma total desarmonia espiritual, ambiental, social, religiosa e política, que está transformando o homem num ser irracional, com atitudes absolutamente selvagens, na contramão da civilidade.
Muitos poderão condenar minha amargura de conceitos, mas ninguém conseguirá me contradizer com seriedade, porque as evidências são por demais incontestáveis – nunca conseguiremos esconder os raios do Sol com uma simples peneira. O delírio que a força poderosa da moeda exerce sobre o homem não tem explicação plausível - como é possível alguém “vender a alma ao diabo” simplesmente para ter posse sobre bens materiais, muitas vezes em abundância tão desmedida, a ponto de ser impossível o desfrute de tudo, mesmo num prazo de duzentos anos de desperdício nababesco, e ainda continuar lutando para aumentar mais e mais o seu patrimônio, mesmo à custa da desgraça alheia?