Excêntrico, monárquico, humano (1958-2009)

Michael Jackson, cuja carreira teve início aos cinco anos – no grupo familiar ‘Jackson 5’ –, faleceu esta semana, deixando ao mundo um legado histórico de conquistas e intensas perturbações.

Primeiro negro a passar na MTV norte-americana, considerado por muitos o grande propulsor da referida mídia, lançou Thriller, o álbum mais vendido da história e é dono do famoso ‘moonwalk’, passo memorável e inovador, que pode ser comparado ao andar de Chaplin, a Gene Kelly em Andando na chuva ou aos passos de Fred Astaire.

Como cantado em Billie Jean, “Tenha cuidado com o que você faz, porque uma mentira se torna verdade” e parte de sua vida conturbada remete aos traumas de sua infância, referentes ao relacionamento com seu pai e o início prematuro de sua carreira, privado de sua infância por longos ensaios e shows.

As conseqüências em sua vida adulta foram alvo de grandes críticas e sensacionalismo nos tablóides midiáticos, acerca da relação com as crianças, supostos casos de pedofilia, ‘Síndrome de Peter Pan’, seu rancho Neverland e outros mais.

O vencedor de 25 Grammys, espalhados por sua carreira solo, a partir de 1971, e a época dos Jackson 5, onde era cantor e obteve grande sucesso, o levou a grandes marcas no mundo musical que dificilmente serão batidas, detentor de 41 canções que alcançaram o topo das paradas norte-americanas e mundiais.

Curiosidade, pesar e luto por sua morte foram observados por vários cantos do mundo, onde recepcionaram seus passos e sua carreira e, dificilmente, tal alvoroço é perceptível em mortes de ídolos, relembrando o que houve acerca da morte de Elvis Presley e o que, possivelmente, deve acontecer quando o ex-beatle Paul McCartney falecer, cantor que, inclusive, apresentava certa antipatia por Michael, posto que este detinha os direitos autorais de músicas dos Beatles, o que frustrava muito McCartney, que tinha que pagar por cantar músicas muitas vezes de sua autoria.

Em ‘Black or white’, tem-se o seguinte trecho: “Veja, não se trata de raças, apenas lugares, rostos, eu já vi o brilhante ficar mais opaco, eu não vou passar a minha vida sendo uma cor”.

Michael Jackson levantou bandeiras sociais, causas altruístas e beneficentes ao redor do mundo e, penso eu, tal memória deve ser recordada acima das extravagâncias e peculiaridades do artista, afinal, como costume do ser vivente, o falecido deve ser sempre lembrado por suas qualidades e não por suas falhas.

Michael Jackson fez o que muitos cantores têm possibilidade de fazer e efetivamente não concretizam: a diferença na sociedade, mudar a realidade – mesmo que de alguns, mesmo que apenas uma tarde, cinco minutos, um filme, uma visita rápida, um discurso.

Poucos artistas têm consciência da função social que apresentam frente ao seu público, à sociedade, aos indivíduos que choram por eles, que tomam para si as ofensas sofridas por ele, que compram seus CDs e os levantam frente às críticas, poucos artistas conseguem pensar nos outros, nas minorias, quando encontra-se no auge, no sucesso.

E foram marcantes as doações a hospitais, as pesquisas contra câncer, o combate e a conscientização de crianças e adolescentes acerca dos perigos das drogas, o dinheiro investido no tratamento de queimaduras, o combate à fome na África, ao racismo, a busca pela educação de crianças e pela erradicação do abuso infantil, durante sua carreira.

Apesar de ser chamado de Rei do Pop, Michael Jackson conseguiu ser humano e, como tal, passível de inúmeras falhas, mas também de numerosas virtudes, humanização difícil de encontrar em artistas com menos sucesso, repercussão e pouco mais de 15 minutos de fama e carreira trágica: ele conseguiu mobilizar os olhos do mundo para diversos problemas mundiais, problemas que têm urgência para ser resolvidos e, acredito eu novamente, esta deve ser a melhor maneira de olhar para o falecido: buscar suas qualidades, sorrir por elas, e tomar para si o fardo de continuá-las no cotidiano.

Enquanto ocorre o imenso alvoroço midiático acerca da morte da mencionada celebridade, José Sarney agradece a mudança de foco da sociedade, Lula, o Ministério Público, o Supremo Tribunal Federal, o Senado e os olhares da sociedade tornam-se tolos novamente – porque têm coisas que nunca mudam, excêntricas, monárquicas, humanas e tolas...

Lucas Sidrim
Enviado por Lucas Sidrim em 26/06/2009
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