FOME DE ARTE (Celismando Sodré-Mandinho)

FOME DE ARTE

( Celismando Sodré – Mandinho -)

A preocupação em rediscutir o papel da arte nas escolas, nunca se fez tão urgente como na época atual. Vivemos em um mundo cada vez mais “endurecido” pela máquina, pela competição, pelo desejo do lucro e pela busca do consumo desenfreado; e uma das formas saudáveis para combater estes males do espírito moderno é o incentivo a toda e qualquer manifestação artística, o que deveria ser uma função primordial da escola; que na maioria das vezes tem contribuído para a morte da criatividade, servindo como uma mera instituição reprodutora, repressiva e formadora de técnicos insensíveis para o exercício de uma função burocrática e repetidora na sociedade atual. Quase sempre o sujeito sai da escola como um analfabeto artístico, alienado, e sem pensar criticamente sobre o mundo que o cerca.

Desde cedo,agindo de forma inconsciente, podamos a curiosidade natural da criança, repreendendo-a quando ela nos bombardeia com uma seqüência de perguntas sobre tudo, quando quer tirar dúvidas exigindo respostas para as mais diversas indagações; como seria importante se essa curiosidade filosófica natural fosse estimulada na família, nos outros ambientes sociais e principalmente na instituição escolar. Mas, geralmente a prática é outra, moldada na educação para a opressão, no freio aos próprios impulsos artísticos, os alunos questionadores e criativos, que não aceitam as respostas prontas dos livros didáticos e nem dos professores são antipatizados, muitas vezes julga-se pelo desempenho demonstrado pelas notas, reforçando a memorização em detrimento da criatividade, esquecendo, ou não valorizando a inventividade artística. Como trabalhar com arte num ambiente tão tradicional como este? A escola precisa passar por um processo de transformação radical para se adaptar a tais exigências, os professores precisam passar por uma verdadeira reciclagem para ampliar o seu próprio campo de visão, e o Estado que se diz democrático, precisa oferecer as condições dignas e progressistas para possibilitar uma verdadeira revolução na escola, possibilitando também, uma nova maneira de conceber a arte nos currículos escolares.

Na teoria das inteligências múltiplas de GARDNER, aprende-se que o equilíbrio emocional é um dos componentes básicos para a formação integral do indivíduo. E como desprezar a arte como uma forma para obter esse equilíbrio? Todos nós somos seres dotados de uma carga emocional que precisa ser trabalhada de diversas formas, e, além disso, é preciso que a escola atue para resgatar a sensibilidade humana de abstrair, ver o outro como seu semelhante, se preocupar com o meio ambiente, sentir-se como parte integrante dele, vivendo assim uma vida mais harmoniosa com o seu próximo e com o universo. Para FISCHER (1967), “a arte pode elevar o homem de um estado de fragmentação a um estado de integração total. A arte dá ao homem a capacidade de compreender

a realidade e ajuda não só a suporta-la, mas de transforma-la, aumentando sua determinação de torna-la mais humana e mais acolhedora para a humanidade,”na verdade, a verdadeira evolução esta inteiramente ligada a esta capacidade de procurar melhorar o próprio relacionamento, que deveria ser cada vez mais sereno e harmônico entre as pessoas e entre os povos, e destes para com o meio ambiente que o cerca.

Vive-se hoje o paradoxo da democratização das informações, através do acesso cada vez mais fácil aos meios de comunicação de massa; com um mundo alienante e massacrante das informações rápidas para consumo imediato, sem oportunidade até para a “digestão”das informações adquiridas; as multimídias, com suas mensagens instantâneas, refletem um mundo multifacetado, em que o indivíduo vê mais não analisa, ouve mais não identifica o som, toca mais não sente a textura,digere mais não sente o gosto e nem procura raciocinar com profundidade sobre tudo que o cerca e sobre os acontecimentos da vida. Para o pintor HENRI MATISSE; “o esforço necessário para libertar-nos exige uma espécie de coragem, e essa coragem é indispensável para o artista, que deve ver todas as coisas como se os visse pela primeira vez; é preciso ver a vida inteira como no tempo em que se era criança, pois a perda dessa condição nos priva da possibilidade de uma maneira de expressão original”. Por incrível que pareça, ao longo da nossa história, mesmo com todas as experiências que vamos adquirindo, à medida que o tempo passa e ficamos mais velho, vamos perdendo a sensibilidade e a ternura sobre as coisas mais simples e mais importantes da vida. A estética – o belo da arte – vai deixando de ter significado, tornamos-nos desprovidos de emoções e sentimentos nobres, e o mundo vai perdendo aquela graça que tinha quando éramos criança, a magia da vida vai desaparecendo diante da nossa petrificação sentimental.

É preciso que todos os educadores, que todos os artistas gritem para serem ouvidos nos pátios escolares do mundo todo, nas praças, nos gabinetes diretivos, nos congressos e nos governos: QUEREMOS ARTE, O MUNDO TEM FOME DE ARTE PARA O RESGATE DA SENSIBILIDADE E DA ALEGRIA DE VIVER!!! .

A inquietação esta presente no mundo atual que exige mudanças em todos os sentidos, a educação como uma das necessidades básicas da vida não esta fora dessas exigências, inclusive a educação estética. Segundo JEAN-CLAUDE FORQUIM “é preciso valorizar as diversas formas de sensibilização para com o meio ambiente, de despertar o sentido de uma educação estética: ensinar a criança a prestar sistematicamente atenção as cores, formas, sons, movimentos, estruturas espaciais e arquitetônicas, elementos naturais e artificiais que caracterizam a sua paisagem vital”, o indivíduo que cresce neste ambiente,mais humanizado, onde prevalece o estímulo constante desde a mais tenra idade, tende a ser um cidadão mais equilibrado socialmente e mais preocupado com as questões inerentes ao ser humano, com a própria natureza e com o universo como um todo. Porém, para que isso ocorra, é necessário que a

própria sociedade consiga sua emancipação através da participação coletiva e democrática, sem a exclusão de determinadas classes ou minorias sociais, com igualdade de oportunidades nas escolas para todos. Enquanto a sociedade for injusta e desigual, enquanto houver uma escola de melhor nível para a elite e uma escola pública defasada, o próprio acesso a arte será excludente.

É fundamental esclarecer também que o conceito de arte é muito amplo, e não se restringe apenas a cultura erudita, é preciso ter muito cuidado com certas interpretações preconceituosas para não gerar discriminações, a arte popular tem tanto valor quanto a arte clássica. Deve-se respeitar todas as manifestações artísticas e culturais de um povo, ou de uma classe social, e nas escolas isto deve ficar bem claro. Os próprios PCNs, quando falam em multiculturalidade, contemplam essa necessidade de respeito, e apresentam algumas mudanças e inovações no que diz respeito ao novo ensino da matéria artes nos currículos escolares. Mas, para ANA MAE BARBOSA, ainda apresenta uma linguagem baseada em terminologia pedagógica livresca que será pouco operacionalizada, porque não leva em conta as diversas realidades dentro de um mesmo país, generalizando o aspecto multicultural sem que haja o respeito as diferenças, e sem discutir com profundidade qual o papel da arte e do artista em diferentes culturas. Nota-se nos meios acadêmicos, e em outros locais de debates, que há consenso entre os pedagogos, artistas e demais estudiosos da educação, da necessidade de arte nas escolas de forma ampla e abrangente, contemplando todas as crianças e jovens, sem qualquer tipo de exclusão. O grande problema que ainda atravanca essa nobre intenção,é, como possibilitar isso a todos de uma forma eficiente, despertando consciências adormecidas e sensibilidades reprimidas? Essas respostas, todos nós educadores, de maneira urgente, teremos que dar o quanto mais rápido melhor, temos que correr contra o tempo em um mundo que caminha para insensibilidade artística, para a violência desenfreada e para a destruição da vida em nosso planeta.

MANDINHO
Enviado por MANDINHO em 02/06/2009
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