ENERGIAS DE ORDEM QUÍMICA
9 ENERGIAS DE ORDEM QUÍMICA
9.1 CONCEITO
Segundo Flamínio Fávero, são aquelas que atuam por substâncias que entram em reação com os tecidos.
São as que agem através de reações químicas com os tecidos.
Modos de ação.
Podem agir de modo localizado ou de modo sistêmico, daí a divisão em cáusticos e venenosos.
9.2 Cáusticos
9.2.1 Definição - Cáustico é toda substância que quando colocada em contato com um tecido, com ele reage desorganizando-o. Podem agir externamente ou internamente.
9.2.2 Classificação – Classificam-se em coagulantes e liquefacientes. São substâncias coagulantes os ácidos fortes, como o sulfúrico, o clorídrico, nítrico, sais metálicos como nitrato de prata, permanganato de potássio, essências como terebentina, sabina.
As substâncias coagulantes desidratem os tecidos, formando escaras endurecidas, de cores diferentes, dependendo da substância. Por exemplo, o ácido sulfúrico provoca escaras esbranquiçadas.
As substâncias liquefacientes são os álcalis, soda cáustica, liquefacientes provocam escara úmida, amolecidas pela liquefação dos tecidos.
Sua ação depende não só da natureza química da substância como também da sua concentração e da região atingida, assim ácido e álcalis diluídos não danificam a pele. Uma substância que não produz dano à pele pode lesar irreparavelmente a córnea. Importa também o tempo de contato entre a substância e o tecido atingido.
As lesões provocadas por cáusticos são denominadas genericamente vitiolagem, qualquer que seja a substância usada, em razão do nome popular do ácido sulfúrico, óleo de vitríolo, que foi muito usado no passado.
Causa jurídica-geralmente a intenção é provocar lesão corporal, deformar a vítima daí a região mais atingida ser a face, o pescoço, tórax e escápulas. Esta eventualidade é hoje em dia rara no nosso meio. São comuns os acidentes, domésticos e industriais.
A morte por ação cáustica é também eventualidade rara mas não impossível.
9.2.3 Veneno
A legislação atual não define o que seja venenoso, deixando a critério do perito esta conceituação.
A Consolidação das Leis Penais diz em seu artigo 296 parágrafo único: “Veneno é toda substância mineral ou orgânica que ingerida no organismo ou aplicada ao seu exterior, sendo absorvida, determine a morte, ponhe em perigo a vida ou altere profundamente a saúde.” Esta definição satisfaz as exigências médico legais.
Em outras palavras – Veneno é toda substância que absorvida e atuando química ou bioquimicamente sobre o organismo lesa a integridade corporal ou a saúde do indivíduo.
Envenenamento são as lesões mortais ou não, provocadas pelos venenos.
Da definição de veneno, podemos inferir diferença fundamental com os cáusticos. Para atuar como veneno, a substância precisa ser absorvida e por reação química ou bioquímica determinar uma lesão corporal ou perturbação funcional que pode chegar à morte.
Encontramos substâncias venenosas nos 3 reinos da natureza: mineral, vegetal e animal. Não se inclui no grupo de venenos a ação de microorganismo e suas toxinas, incluímos porém a secreção de certos animais, cobra, insetos, aracnídeos. Em medicina legal, não se faz a clássica distinção da parasitologia entre peçonha e veneno.
Vias de absorção dos venenos.
Os venenos podem ser introduzidos no organismo pelas mesmas vias que são introduzidas os medicamentos.
A ação de certas substâncias varia de acordo com a via de penetração (curare veneno de cobra são inócuos por via oral, pois são digeridos no estômago).
A) Pele. A pele é impermeável à maioria das substâncias, porém alguns inseticidas, gases de guerra podem ser absorvidos pela pele íntegra.
B) Mucosas. Aparelho digestivo (gástrica, intestinal, retal)
Aparelho respiratório
Ocular
Nasal
Genito urinária
C) Serosas.
D) Tecido celular subcutâneo.
E) Via muscular.
F) Via sanguínea.
9.2.3.1 Eliminação dos venenos
Absorvida a substância cai na corrente sanguínea, em tempo variável, de acordo com a substância e a via de introdução (mais rápida por via sanguínea e respiratória que por via oral e cutânea), distribuindo-se por todo o organismo, sendo metabolizada principalmente no fígado, fixando-se nos órgãos, de acordo com as afinidades da substância com os diversos componentes do organismo. Por exemplo: álcool com grande afinidade pela água concentra-se mais no sangue e no liquor; fósforo com grande afinidade pela gordura é encontrado na medula óssea, embora suas ações possam se fazer seletivamente em outros órgãos, dependendo aí das alterações que provoquem nas funções destes. Serão então eliminados na forma da própria substância ou então transformados.
Como principais vias de eliminação, temos:
A) Aparelho digestivo: vômito – (mercúrio,cobre)
diarréia – (mercúrio, cobre)
bile – (cobre, arsênico, mercúrio)
B) Urina (cobra, arsênico, antimônio, fósforo)
C) Pulmões – (arsênico, cobre, substâncias voláteis-álcool, éter, gasolina, querosene, clorofórmio, ácido cianídrico, gás sulfídrico).
D) Suor – (chumbo, antimônio, arsênico)
E) Saliva – (mercúrio, morfina, cocaína)
F) Leite – (bismuto, mercúrio)
G) Cabelos – (arsênico)
H) Unhas – (arsênico)
I) Placenta – (sabina)
O tempo de eliminação do veneno varia conforme sua natureza, dose, via de absorção, estado de saúde da vítima, etc.
Quanto à forma de eliminação, existem também variações conforme as substâncias. Assim, muitas substâncias são eliminadas in natura (éter). Outras são oxidadas ou reduzidas e eliminadas após sua transformação (barbitúricos, cocaína); isto é muito importante em uma perícia.
9.2.3.2 Modificação da ação dos venenos
A ação ou efeito das substâncias sobre os indivíduos variam não só pela natureza da substância como também com outros fatores que podem modificar esta aça. Temos fatores que são ligados à própria substância, outros referentes ao individuo.
9.2.3.2.1 Condições modificadoras da ação referente ao veneno:
1) Dose – As substâncias só agem a partir de uma determinada quantidade que é calculada por quilo de peso. Dependendo da dose, uma substância poderá ser alimento, medicamento ou veneno. Potássio, por exemplo, é alimento, medicamento, porém se injetado na veia rapidamente e em quantidade grande causará a morte. A própria água quando ingerida em grande quantidade como acontece com alguns doentes mentais, causará distúrbios eletrolíticos; será veneno.
2) Forma de administração – Quanto mais solúvel, mais eficaz sua ação. Para ser absorvida e ser eficaz, a substância deve ser solúvel ou tornar-se solúvel.
3) Associação com outras substâncias ou veículos – Esta associação poderá diminuir ou aumentar a ação do veneno. Associação de cianeto de potássio com ácido, fósforo com gordura aumentam a ação dos venenos. Cianeto com açúcar tem sua ação diminuída.
4) Via de penetração – Tem grande importância a via de penetração do veneno. Curare, veneno de cobra, por via oral são inativos. Estricnina, tártaro hemético têm sua ação aumentada por via oral.
9.2.3.2.2 Com relação ao indivíduo
1) Idade – De um modo geral, as idades extremas são mais sensíveis aos venenos (criança e velhos). As crianças são mais sensíveis aos opiáceos, porém são mais resistentes à atorpina.
2) Estado de saúde – Doenças hepáticas, renais, pulmonares que prejudicarão a metabolização ou a eliminação ou a eliminação do veneno aumentará a ação do veneno.
3) Tolerância – Algumas pessoas têm resistência a determinadas por uso repetido da substância. Viciados em morfinas fazem uso de dose muitas vezes maior que a dose letal para as pessoas não habituadas ao seu uso.
4) Idiossincrasia – Do mesmo modo que uma pessoa pode ter sua resistência aumentada, poderá tê-la diminuída.
5) Alergia
6) Sexo - Não há muita diferença entre os sexos.
7) Estado do estômago – O estado de repleção ou vacuidade do estômago tem importância. De um modo geral, a absorção é aumentada quando o estômago está vazio. O conteúdo do estômago pode acelerar ou retardar a absorção da substância. Álcool tem sua absorção retardada se o estômago está cheio de alimento gorduroso, já o fósforo tem aumentada.
9.2.3.2.3 Diagnóstico do envenenamento
É baseado em vários critérios:
1) - Critério clínico – É baseado nos sinais e sintomas apresentados pela vítima. De um modo geral, sintomatologia de aparecimento brusco, náuseas, vômitos, cólicas, diarréia, coma, convulsões, em uma pessoa que se achava bem de saúde.
2) - Critério anatomo patológico.Exame externo. Frequentemente dá subsídios úteis, não só no diagnóstico do envelhecimento mas também pode orientar na identificação da substância. A icterícia no envelhecimento pelo fósforo. Os livores de hipóstase, vermelhas nas asfixias por monóxido de carbono, que alguns consideram envenenamento. De coloração acinzentada nos envenenamentos por clorato de potássio. Podemos perceber cheiro característico em determinados casos, fenol, amêndoas amargas. Dilatação pupilar nos casos de envenenamento por atropina. Lesões dos lábios e da boca quando o veneno é cáustico. Venenos convulsivantes como estricninas produzem rigidez intensa e precoce.
Exame interno. Deve-se tomar medidas especiais na necropsia para se conservar e colher adequadamente material. Merecem estudo especial o estômago, o intestino e seu conteúdo, que deve ser analisado quando ao cheiro, cor, pelo seu aspecto. Não devemos esquecer de examinar as paredes do estômago e do intestino, que podem apresentar mudanças em sua coloração, podem estar ulceradas, hiperemiadas, etc. O sangue costuma estar fluido, apresentar hemólise, ter sua coloração alterada. Podemos encontrar ainda congestão visceral, hemorragias subserosas
3) – Critério histológico – Pode contribuir para o diagnóstico. Determinados venenos provocam alterações histológicas que são sugestivas de sua ação (necrose tubular do rim, esteatose hepática, etc).
4) – Critério químico ou toxicológico – É a pesquisa química da substância. Usam-se frascos limpos com técnica especial para que não permaneçam substâncias que possam prejudicar a pesquisa. São usados frascos de vidro, com rolha esmerilhada, que deve ser lacrado. O material deve ser conservado em geladeira, à temperatura de -10 a -15ºC. Não se deve usar desinfetantes. O álcool impede a pesquisa de formol, fósforo. O formol impede a pesquisa de ácido cianídrico, monóxido de carbono.
O material deve ser colhido em frascos separados.
Deve-se colher fígado (cerca de 500g), vesícula biliar e seu conteúdo, cérebro (200g), rim, um rim é suficiente (intoxicações agudas por metais), pulmão, no caso de inalação de gases ou vapores químicos. Corta-se o pulmão e coloca-se imediatamente no frasco apropriado e a maioria dos gases difundirão do pulmão para o frasco.
Estômago e conteúdo. O sangue deve set colhido em frascos com fluoreto de sódio que é anticoagulante e conserva o sangue. Cabelos, em casos de envenenamento por arsênico. Também se faz pesquisas no humor vítreo e humor aquoso.
O exame toxicológico deverá ser feito em vísceras separadas.
O exame toxicológico não é infalível. Pode ser encontrado veneno no cadáver e não ter ocorrido a morte por envenenamento, ou porque o veneno não foi absorvido ou a morte ocorreu por outra causa antes que o veneno pudesse atuar.
Pode a morte ter causa no envenenamento e não se encontrar veneno no cadáver porque:
a) A substância empregada escapa à pesquisa química (veneno de cobra).
b) A substância foi eliminada ainda em vida.
c) A substância se decompôs no organismo.
d) Doses pequenas e mortais que são difíceis de reconhecer no cadáver (aconitina).
e) Quando a decomposição do cadáver desintegra o veneno (digitalais, atropina, aconitina).
5) – Critério experimental ou farmacológico ou biológico – Consiste em experimentar a substância em animal de laboratório e observar a sua ação.
6) – Critério histórico ou circunstancial – Baseia-se em testemunhas. Informações de que uma pessoa que se achava em dificuldades compra veneno e depois é achada morta.