E o Caso da D. Lourdes?
Como muitos já acontecidos, e que ninguém ficou sabendo, e muitos que ainda acontecem, sem que ninguém saiba?
Lourdes Maria Viveiros Inácio casou-se aos 16 anos com uma pessoa de 45. Tendo que ajudar nas tarefas de casa – era filha de lavradores que trabalhavam em fazendas na Zona da Mata mineira – só pode frequentar a escola durante 3 meses. Não chegou a aprender a ler e escrever.
O homem com quem casou revelou-se extremamente violento, sobretudo quando bebia. Aos 25 anos Lourdes recebeu do marido um golpe na nuca com um cabo de enxada. A partir daí ficou “abobada”, com “o olhar longe”, não se lembrando de nada e pouco conversando.
Foi internada em 19/01/1995, em quadro de anorexia, vômitos e diarréia, no CHPB – Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena, pertencente à FHEMIG – Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais. Uma unidade pública, portanto. Em alguma constituição por aí deve estar escrito que “a saúde é um direito do cidadão e um dever do estado”.
Em 26/01/1995 Lourdes foi submetida a uma ECT (eletroconvulsoterapia), sem qualquer uso de anestesia ou sedação, como é normal nesses casos, sem que houvesse qualquer indicação para esse tipo de tratamento. Foi submetida ao chamado "choque a seco". Em decorrência Lourdes teve graves fraturas ósseas e, sendo levada à cirurgia, adquiriu uma trombose venosa. Em função da trombose foram-lhe ministrados anticoagulantes que, sem o devido monitoramento, ocasionaram na paciente um AVC (acidente vascular cerebral) hemorrágico, mais conhecido como “derrame”, do que veio a falecer aos 47 anos em 14/04/1995.
A gente leva um tempão estudando. Cursos pesados de Medicina, Engenharia, Advocacia, Economia, Letras, História, Desenho, etc. Durante o tempo de estudantes jamais podemos imaginar que poderíamos cometer, no exercício de nossas funções, pelos motivos mais absurdos, torpes ou mais irrelevantes, ações que pudessem redundar em algum dano a quem quer que fosse. Não passa isso pela nossa cabeça quando estamos nos bancos universitários.
Sobretudo os médicos, como também outros profissionais, que chegam a fazer juramentos comprometendo-se ao exercício da profissão nos mais altos padrões da ética e da moralidade.
O que leva uma pessoa a agir, depois de formada, em dissonância com aquilo que aprendeu na escola? Será que foi alguma coisa que deixou de aprender em casa? Sim, porque a impressão que se tem é a de que valores éticos e morais não são ministrados nas universidades. Mas deveriam ser trazidos de casa para os bancos escolares pelos alunos.
Então, como é que vai ficar o futuro, quando a família começa a dar sinais de uma instituição destinada à falência? Talvez venhamos a depender mais ainda da Internet ou dos livros, se eles continuarem a existir.
De qualquer modo a injustiça é algo que, mesmo de longe, sempre estará ao alcance da nossa vista. Dependerá da nossa atuação a sua permanência entre nós ou a sua erradicação.
Rio, 30/05/2009