Oh! Deus perdoe este pobre coitado, que de joelhos rezou um bocado, pedindo pra chuva cair sem parar. Oh! Deus será que o senhor se zangou? E só por isso o sol se arretirou, fazendo cair toda chuva que há! Senhor, eu pedi para o sol se esconder um tiquinho; pedi pra chover, mas chover de mansinho, pra ver se nascia uma planta no chão. Meu Deus, se eu não rezei direito o Senhor me perdoe, eu acho que a culpa foi desse pobre que nem sabe fazer oração. Meu Deus! Perdoe eu encher os meus olhos de água, e ter-lhe pedido cheinho de mágoa, pro sol inclemente se arretirar. Desculpe eu pedir a toda hora pra chegar o inverno, desculpe eu pedir para acabar com o inferno que sempre queimou o meu Ceará.
 
Os versos de Gordurinha e Nelinho ganharam fama nas vozes de gente como Fagner e Luis Gonzaga e como a própria letra traduz, uma “Súplica Cearense” de alguém que tão acostumado com a seca medonha que sempre desertificou aquela região, pediu com fortes orações para que a chuva viesse forte, mas quando finalmente ela chegou, acabou matando também, da mesma forma que a seca, pessoas e bichos; várias cidades ficaram debaixo d’água, como se fosse um dilúvio, uma catástrofe inversa que aterroriza do mesmo jeito que a outra.
 
Eu não consigo esquecer (e não quero) que sou filho do Nordeste, filho de sertanejos do semi-árido da Bahia, região que da mesma forma que o Ceará sempre se acostumou a viver as intempéries da seca devastadora. Na minha terra, o povo já é doutrinado a sobreviver com muito pouco, principalmente água; o meu povo é acostumado a ver pouco verde nos campos, a ver os animais abaixo do peso natural porque não há muito que comer. As pessoas são dotadas da mais cristalina humildade porque jamais souberam o que é a fartura e o desperdício que existe no restante do Brasil; esta é a bula principal para cada vida encravada no Sertão do Nordeste.
 
Agora, o que está acontecendo por lá, em alguns cantos daquela terra acostumada ao sol escaldante que mata é justamente o inverso; onde havia a morte pela falta d’água, hoje há morte por excesso dela; onde havia solo rachado pelo sol, hoje há lama e corpos de animais boiando em estado de putrefação. A chuva que pouco aparece naqueles recantos remotos do Brasil que todos se opõem a conhecer, vingou-se catastroficamente do sol e insiste em não parar de cair. Quem sempre rezou para ver a chuva, como Gordurinha e Nelinho, hoje clama de joelhos para ela dar uma trégua, se “arretirar”.
 
Centenas de cidades do Piauí, Maranhão, Ceará e Rio Grande do Norte já decretaram “Estado de Calamidade”, que eu chamaria de Estado de Sítio. Milhares de família que até pouco tempo não tinham sequer o necessário para beberem, hoje se encontram ilhadas, ainda sem ter o que comer e com tanta água ao redor sem poder ao menos bebê-la com dignidade e segurança. O atual clima destes Estados já é comparado com outras catástrofes de 50 anos atrás, ou seja: não se vê nada igual em meio século naquela região, muito antes dos versos “Súplica Cearense” ter sido escrito e musicado.
 
Está saturado qualquer tipo de comentário ou alusão ao tema, mas o que jamais cansarei de repetir é que todo o Brasil necessita ajudar os necessitados, da mesma forma que houve a comoção e mobilização nacional em favor de Santa Catarina, que se deixe registrado, com a maior das justiças; os sertanejos do Nordeste, mais uma vez estão necessitando de todo tipo de ajuda neste momento; roupas, móveis, colchões, remédios e água potável são os itens que mais faltam neste exato momento em algumas regiões nordestinas assoladas pelas enchentes.
 
Muito embora tenhamos visto recente um esquema criminoso de desvio de donativos no Estado de Santa Catarina, envolvendo todo tipo de pessoas, inclusive prefeituras, não podemos nos abater com fatos monstruosos como este; é bem verdade que chega a dar certo desânimo; de minha casa, como mero exemplo, foram enviados para Santa Catarina: água, alimentos, roupas, brinquedos e uma quantia em dinheiro e nesta hora, a hora do Nordeste, faremos o mesmo e é o que esperamos de todos aqueles que puderem.
 
Ninguém imagina a alegria desta gente, que hoje chora seus mortos e contabiliza suas perdas, na hora em que chega algum tipo de donativo vindo de fora! O povo nordestino que eu muito conheço, sempre foi eternamente grato ao restante do Brasil, mesmo sendo eu também um sabedor de que o resto do Brasil sempre os tratou com esmolas e desprezo, mas tudo que eventualmente chega, sempre chega em boa hora.
 
O sertanejo, acostumado com a seca mortífera seja na estiagem ou como agora, na fartura das águas, aprenderam a conviver com muito pouco; pouco dinheiro, pouca roupa, pouca comida, pouca água, pouca ou nenhuma educação (didática); então, em qualquer fenômeno natural que se assemelhe com uma tragédia, tudo que lhes chegam; mesmo os restos, já lhes bastam e os põem a agradecer a Deus; portanto, se você tem algo que não lhe sirva mais, se sabe de alguém que também possa ajudar, procure a Ação da Cidadania mais próxima de você e contribua. O site
www.acaodacidadania.com.br lhe dará todas as instruções de como ajudar esta gente sempre sofrida.
 
Escrever, falar, sobrevoar de helicóptero ou simplesmente orar, até de contribui, mas não ajuda efetivamente; sem a ação direta da doação, sem o gesto de caridade traduzido em ação, estes nordestinos serão ainda mais humilhados, serão ainda mais sacrificados do que já vem sendo há séculos; precisamos jamais esquecer que esta gente, da mesma forma que as demais espalhadas neste solo, são nossos irmãos, são brasileiros e são os mais sofredores dentre todos os povos daqui.
 
Ajudamos tanto à Bolívia, o Equador, a Venezuela; temos tanta grana para financiar projetos de outros países sem ao menos conseguirmos tirar o mínimo investido; se podemos tanto ajudar outros povos, direta e indiretamente, por que não ajudar e nos mobilizar para conseguir mais doações para estes nordestinos que estão tão próximos de nós?
 
Procure também por informação na Caritas e na CNBB

O que mais temos a falar ou a escrever? Nada!
 
 
Carlos Henrique Mascarenhas Pires
www.irregular.com.br
 

CHaMP Brasil
Enviado por CHaMP Brasil em 29/05/2009
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