Cera de Carnaúba: conjuntura agrícola
Por decisão governamental, a atividade oriunda da extração da carnaúba, passou, a partir de 2008, a compor o grupo de produtos extrativistas incluídos na pauta da Política de Garantia de Preços Mínimos – PGPM, uma vez que a carnaúba é uma planta (espécie de palmeira) nativa da Região Nordeste do Brasil, com característica de exploração extrativista, que prescinde de adubação química, agrotóxicos e mecanização agrícola.
A atividade, que durante a década de 1970 teve o auge da produção, continua, fundamentalmente, sendo desenvolvida por agricultores (arrendadores de áreas com carnaubais) de baixa renda, cuja cadeia produtiva está basicamente concentrada nos Estados do Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte. A partir da década de 80, grande parte dos carnaubais foi substituída pelas seguintes atividades, dentre outras: cerâmica, fruticultura e, carcinicultura.
Em função disso, nos últimos 10 (dez) anos, a produção nacional de cera de carnaúba não teve alterações significativas, situando-se na faixa de 18.000 a 20.000 toneladas por safra, com maior participação do Estado do Ceará, que responde por quase 50% da produção. Essa produção é estimada com base na demanda externa, que absorve mais de 80% da safra. Enquanto que para o consumo interno são demandadas entre 3.000 e 4.000 toneladas/ano.
O Estado do Ceará se destaca como o maior produtor e exportador brasileiro de cera de carnaúba. Isto é devido à concentração de um maior número de exportadores, e ainda, em face das favoráveis condições portuárias, já que a maioria das exportações do produto de origem de outros Estados sai de seus portos, o que contabiliza grandes números para o Ceará.
O pó cerífero, principal matéria-prima para o beneficiamento da cera, quando é extraído da parte central das folhas novas da carnaubeira, é denominado de “pó de olho” ou “pó tipo A”, que produz a cera clara, de cor amarelo ouro, com valores comerciais elevados. Já o “pó de palha” ou “pó tipo B”, a extração é feita de toda a extensão das folhas, produzindo a cera gorda, com coloração amarelo alaranjado ou preto.
O Estado do Piauí é o maior produtor nacional de pó cerífero. Entretanto, a maior parte da produção dessa matéria-prima é escoada para o Estado do Ceará, onde é feito o beneficiamento da cera. O Rio Grande do Norte fica como intermediário, cuja produção de pó e da cera tem sua importância econômica, já que são estimadas, para este ano/safra, exportações superiores a sete milhões de dólares, representando valores econômicos acima da média dos últimos anos.
As folhas (fibras ou palhas) da carnaúba, cujo corte é realizado durante o período da safra, que vai de julho até dezembro de cada ano, produzem o pó cerífero que, industrializado, é transformado em cera, com inúmeras aplicações econômicas. Além disso, a fibra vem se constituindo como uma importante matéria-prima para a consolidação do mercado de produtos artesanais e outros fins, inclusive com eficiência na confecção de material isolante utilizado pela Petrobras no revestimento dos dutos condutores de vapor, protegendo-os dos agentes naturais (sol, chuva e vento) e minimizando a perda de calor.
Já a cera de carnaúba participa na formulação dos seguintes produtos: limpeza, ceras polidoras, graxas, tintas e vernizes, filmes plásticos e fotográficos, alimentícios, carbono, escrita, medicamentos, cosméticos, no acabamento de couro e madeira, em adesivos, cera dental, fios elétricos, goma de mascar, impermeabilizantes, papel carbono, componentes da indústria da informática e automotiva, dentre outros empregos industriais.
ESTIMATIVA DE PRODUÇÃO DE CERA DE CARNAÚBA – BRASIL - 2008
ESTADO QUANTIDADE (t) PARTICIPAÇÃO (%)
Ceará 10.189 50,2
Piauí 7.878 39,2
RN 2.133 10,6
TOTAL 20.200 100
Fonte: Indústrias processadoras de cera de carnaúba
Embora a cadeia econômica da produção de cera de carnaúba venha se mantendo em processo de decadência desde a década de 80, acentuando-se a partir de 1995, justamente quando o produto alcançou maiores preços, a atividade oriunda da extração da carnaúba ainda continua tendo relevante importância social para a economia dos Estados da Região Nordeste, gerando a ocupação, em toda cadeia produtiva, para mais de 200.000 famílias de baixa renda. Essa mão-de-obra permanece no setor nos meses de julho a dezembro, justamente no período em que há grande carência de ocupação produtiva na agricultura familiar do Nordeste. Entretanto, observa-se que a produção de cera dos últimos três anos vem obtendo ligeira recuperação. A seguir, dados de suprimento de cera de carnaúba em 2008, em toneladas - Brasil:
Estoque Inicial: 600
Produção: 20.200
Exportação: 16.000
Consumo interno: 4.100
No Rio Grande do Norte, Estado que responde por mais de 10% da produção nacional de cera de carnaúba, nos últimos anos, a produção vem se mantendo entre 2.000 e 2.200 toneladas/ano. Essa estimativa é feita, além da influência climática, com base na demanda externa, que absorve mais de 80% da safra. O consumo interno absorve em torno de 500 toneladas/ano. Como os dados de produção são historicamente estimados, e visando obter as informações mais próximas da realidade, torna-se necessário o emprego de ações no sentido de quantificar, através do levantamento de safra, a produção de pó cerífero e de cera de carnaúba, identificando, inclusive, as áreas (hectares) dos carnaubais.
COMPARATIVO DE PRODUÇÃO DE CERA DE CARNAÚBA - RN
ANO BRASIL (t) RIO G. NORTE (t) PART. (%)
2007 20.100 2.133 10,6
2008* 20.200 2.200 10,9
(*) Estimativa
Fonte: Usinas de beneficiamento
Tem-se observado que a cada ano/safra o segmento produtivo dos derivados da carnaúba vem encontrando dificuldades para a sua manutenção, já que ainda não foi encontrado mecanismo que proporcione a revitalização da carnaúba no Rio Grande do Norte. A baixa remuneração ao produtor, nos diferentes períodos (safra e entressafra), vem desestimulando a extração do pó cerífero, desequilibrando o mercado, conseqüentemente, elevando a cotação da cera. Esse processo vem contribuindo para a baixa sustentabilidade do setor, já que existem produtos substitutos.
Nos últimos 24 meses, o mercado tem se comportado firme, já que os preços mantiveram-se em alta em função da elevada procura do produto pelos países importadores, cuja situação evitou colocar em risco a continuidade da atividade. Entretanto, os produtores reclamam que os preços mínimos oficiais fixados para as últimas safras, não tem suprido os custos de produção.
Não obstante, os atuais preços remuneradores obtidos pelos produtores, ainda encontra-se delicada a situação que passa a cadeia produtiva da carnaúba. Por isso, e com o objetivo de identificar as principais limitações e oportunidades para o desenvolvimento do setor, estão sendo mantidas ações visando identificar:
a) o desenho do mapa da cadeia de valor da cera de carnaúba;
b) os atores envolvidos e suas respectivas ações;
c) a visão de futuro do conjunto dos operadores e agentes da cadeia;
d) as oportunidades e gargalos para melhoria da cadeia produtiva;
e) os riscos da ação de fomento formulada para as comunidades tradicionais e agricultores familiares;
f) o plano de ação preliminar, incluindo estratégias para a consolidação de mercados sustentáveis para a cera, o pó cerífero e o artesanato de palha, que venham valorizar a sua origem, a forma de produção (agroecológica, orgânicas e afins), aspectos socioculturais relevantes, sua importância para a geração de emprego e renda, a conservação e uso sustentável da biodiversidade e seus benefícios e;
g) a formulação do grupo territorial para continuar a discussão, articulação e implementação de ações e estratégias visando agregar valor à cera, ao pó e ao artesanato de palha; fortalecer o APL no território potiguar-cearense que vai do Vale do Assu – RN até Aracati/Itaiçaba – CE e, consolidar mercados.
É notório que toda atividade agrícola somente será economicamente sustentável em longo prazo se o agente produtivo conseguir gerar receita suficiente para honrar seus compromissos de curto prazo, principalmente quanto ao pagamento das despesas que antecedem a colheita da safra, mão-de-obra e ainda manter uma reserva de capital suficiente para atender as demais necessidades. Tudo isso, somente será possível se o produtor dispuser do imprescindível custo de produção, já que esse cálculo permite avaliar quais são os principais itens de dispêndios com o produto.
Como a produção de cera de carnaúba é uma atividade com mais de uma centena de anos de existência, e tendo a sua importância econômica por empregar um contingente considerável de mão-de-obra, sobretudo no Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte, caracterizando-se, ainda, como importante fonte geradora de renda para os trabalhadores rurais desses Estados, e ainda, em função das bruscas oscilações de preços que são inerentes do mercado, torna-se necessário que os preços mínimos fixados pelo Governo Federal, passem a suprir os custos de produção, proporcionando rentabilidade ao produtor e que sejam instrumentos que possibilitem a regularização do mercado. A cera de carnaúba continua presente na pauta de exportações do Rio Grande do Norte, ocupando a 16ª posição entre os produtos exportados. Por se tratar de produto essencialmente voltado para a exportação, o preço da cera de carnaúba recebido pelo produtor está fortemente vinculado ao preço de venda para o mercado externo. .
Assim, concluímos que além das questões anteriormente elencadas, pode-se, ainda, identificar a necessidade de implementar as seguintes ações: a) evitar que as áreas de carnaubais sejam dizimadas, sobretudo nas regiões dos vales onde há maior concentração da planta; b) viabilizar ao produtor de cera, alternativas de mercados; c) intensificar as políticas de mercado para a ampliação do consumo interno; d) melhoria das políticas públicas (Federal e Estadual) para dar sustentabilidade econômico-social à cadeia; e) capacitar os produtores desde o corte da palha até a fabricação da cera de carnaúba; f) disponibilizar recursos financeiros compatíveis com a necessidade da manutenção dos carnaubais; g) intensificar a integração entre os elos da cadeia produtiva – desde o proprietário dos carnaubais até o produto final comercializado junto aos mercados interno e externo e; h) melhorar o emprego tecnológico visando o aumento da produtividade e da qualidade do produto, de forma rentável para os componentes da cadeia.