* MARAVILHOSA CORRENTE HUMANA* 
 
         Levei algum tempo para me recuperar do choque causado pela placa que estava nas mãos daquela pessoa, a qual eu não conhecia e que vinha em minha direção, em plena estrada entre Rio grande e Pelotas, há uns trezentos metros, da ponte sobre o canal São Gonçalo. Agitava a placa e dizia:
       - Moço, moço!...houve um terrível acidente, com um caminhão e dois automóveis. Há risco de explosão. Não deixe sua família sair do carro, pois há corpos espalhados na estrada e o caminhão está tombado, não sendo possível a passagem.
       Meu coração acelerou, ocorreu-me um frio na espinha ,pois meu filho viera em carro que saiu antes do meu. Vinhamos de um jogo de futebol,na vila Domingos Petroline. Minha senhora ficou com os pequenos no carro e nada disse quando sai em disparada rumo ao local. Meu companheiro veio logo atrás e juntos fomos ver se podíamos ajudar e tirar a dúvida que me atormentava.
       Graças a Deus, não era com meu filho e nem com meus amigos. Mas a cena era dantesca ,simplesmente horrível e dramática. Ouvi a voz de dor,que vinha da gabine do caminhão tombado . Fui ver e perguntei a moça como ela estava e ela me respondeu que estava bem ,mas o braço estava preso ao banco. Passei ao outro lado , vi muitos curiosos parados e horrorizados ,enquanto percebia a extensão da tragédia: Uma criança já havia sido levada por um carro ao hospital, dois corpos estavam jogados no acostamento; já sem vida. E o que resto dos fuscas ,estava pendente na ribanceira ,totalmente retorcidos.
      A noite se fez presente. Foi em meio aos faróis que avistei  meu amigo Flavio (o Manchinha) e aos gritos consegui incitá-lo a me ajudar na retirada dos corpos restantes presos nas ferragens dos dois carros. Fui prontamente atendido por ele em meu apelo . Neste momento ouvimos um gemido próximo ao local. Era uma senhora que havia saltado do pára-brisa na hora do choque. Gemia e chamava pelo nome da filha, sem se importar com a dor nas pernas quebradas (lembrei mamãe).Como poderíamos subir a barranca só os dois com tanto peso e cuidados para não piorar a situação? Ai comecei aos gritos a formar uma grande corrente de mãos. Pessoas que vendo nosso esforço e coragem vieram aos poucos solidarizar-se . Uma união real da solidariedade, do amor e da vontade de participar, fazendo algo, mesmo tendo que estender e unir as mãos com desconhecidos (e que talvez nunca venham a conhecer) Retiramos a senhora , que mesmo quase inconsciente  ainda teve forças para me chamar de mentiroso quando lhe disse que a filha estava bem (a seguir desmaiou). Quis Deus que eu encontra-se a moça ,alguns metros mais abaixo, pois ouvi seu gemido embora muito fraco. E assim foi outra vez formada aquela verdadeira corrente humana, que num esforço conjunto trouxe a menina para a faixa, ainda viva. Como é gratificante numa hora dessas viver nessa terra! Como sou um cara feliz por ter podido fazer algo tão importante! Como foi fantástica a solidariedade do Flavio (Manchinha), do Cabeça, do guarda rodoviário que me emprestou a lanterna. Daquelas pessoas que estenderam as mãos, do sargento do corpo de bombeiros e tantos outros anônimos solidários .
     É isso ai gente, a fibra de  vocês, a vontade de fazer o melhor e ajudar o máximo possível, formando aquela “Corrente Humana”, enriqueceram a história da minha vida, mesmo com a terribilidade do fato.  
   A moça do caminhão saiu quase ilesa do mesmo, uma hora e meia depois da nossa intervenção. O mais abalado, era o coitado do motorista,que não teve nenhuma culpa no acidente, pois um dos fucas havia feito uma ultrapassagem proibida.
  Parabéns a Policia Rodoviária ,ao corpo de bombeiros, ao Flavio (Manchinha), ao Cabeça, à gente que eu não conheço, à Deus, por não ter deixado o caminhão explodir e a este querido Diário Popular , por me permitir escrever sobre vocês e essa “Maravilhosa Corrente Humana.” 

   
Este acidente marcou minha juventude , a data é irrelevante mas a solidariedade humana deve sempre ser destacada e valorizada.
Gildo G Oliveira
Enviado por Gildo G Oliveira em 03/04/2009
Reeditado em 03/04/2009
Código do texto: T1520974
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