BRASIL: NUNCA MAIS – “UM RELATO PARA TODOS”

Quando eu trabalhava na Escola Técnica Federal de Pernambuco, a minha amiga e colega de trabalho, Socorro Barreto Campelo, Socorrinho, me presenteou o livro “Brasil: Nunca Mais – um relato para a história”, em fevereiro de l986.

Enquanto eu lia esse livro, me veio à lembrança o tempo em que eu escrevia o jornal “O BRAZINHA”, do qual eu era vice-diretor, pois diversas vezes eu contava algumas piadas a respeito dos ex-presidentes do Brasil. Certa vez, o prefeito do Condado, o Sr. Honorato Cabral, pediu ao diretor do Jornal, meu amigo Roberto Vieira: “tenham mais cuidado com essas brincadeiras a respeito dos ex-presidentes, porque isso pode dar cadeia”.

Na minha ingenuidade, dos quatorze anos, eu achava que isso não era nada demais. Acontece que nós estávamos em l975 e quando eu li o livro, dei graças a Deus por ter nascido em 1961 e ainda está num interior atrasado. Pois, se eu fosse cinco ou seis anos mais velho, com certeza, seria mais um entre as centenas de presos, torturados, mortos ou desaparecidos deste país.

Isso não aconteceria por eu ter escrito o jornal “O BRAZINHA”, que era simplesmente uma “brincadeira” de adolescentes, mas pela minha formação de não aceitar injustiças e não baixar a cabeça ou silenciar diante das coisas erradas que se faz com a gente brasileira. Por tudo que escrevi no jornal “A ENXADA”, a partir de l984, e principalmente, pela minha carreira política, como vereador de oposição aos políticos tradicionais, que eram aliados dos governos militares. Se eu fosse mais velho eu teria feito tudo isso em pleno regime totalitário, e aí, o pau ia comer.

“Brasil: Nunca Mais”, realmente é um relato que deve ficar para a história e todo brasileiro deveria lê-lo, pois não podemos esquecer o que os Governos Militares fizeram com o povo, apenas para se manter no poder sem que ninguém os contestasse.

Por esse motivo, fiz questão de transcrever aqui alguns trechos de um dos Prefácios, desse livro, para registrar a minha indignação com aqueles anos do Sistema Repressivo, que existiu no Brasil, disfarçado de desenvolvimento econômico, fazendo parte do povo de idiota, acreditando na expressão: “Ame-o ou deixe-o”, que inclusive, era ensinado assim nas escolas.

Eis os principais trechos do Prefácio do livro, assinado por Dom Paulo Evaristo Arns, em 3 de maio de l985:

Não há ninguém na Terra que consiga descrever a dor de quem viu um ente querido desaparecer atrás das grades da cadeia, sem mesmo poder adivinhar o que lhe aconteceu. O “desaparecido” transforma-se numa sombra que ao escurecer-se vai encobrindo a última luminosidade da existência terrena.

Para a esposa e a mãe, a Terra se enche de trevas, como por ocasião da morte de Jesus.

Durante a longa espera, nos corredores da cadeia, pude entreter-me com delegados que presidiam a inquéritos, semelhantes aos que virão descritos nesta obra. Cinco deles me contaram de seus estudos em colégios católicos e um deles na Universidade Católica de São Paulo. Cada qual com seus problemas sérios na família e na vida particular, que eles próprios atribuíam à mão vingadora de Deus. Instalados a abandonar esta terrível ocupação, respondiam: Não dá. O Senhor sabe por quê!

Um deles, meses após, me esperava, ao final da missa, sozinho, na igreja da Aclimação. Abordou-me, num grito de desespero: - Tem perdão para mim?

Lembrei-me então da advertência de um general, aliás, contrário a toda tortura: - quem uma vez pratica a ação, se transtorna, diante do efeito da desmoralização infligida.

Quem repete a tortura quatro ou mais vezes se bestializa, sente prazer físico e psíquico tamanho, que é capaz de torturar até as pessoas mais delicadas da própria família!

A imagem de Deus, estampada na pessoa humana, é sempre única. Só ela pode salvar e preservar a imagem do Brasil e do mundo.

Daí, o nosso apelo ao governo brasileiro, para que assine e ratifique a Convenção Contra a Tortura proposta pela ONU e estampada no final deste livro, todo ele escrito com sangue e com muito amor à Pátria.