AGIOTAGEM

Inácio Strieder

Nestes tempos de crise os noticiários internacionais nos informam que os países desenvolvidos reduzem os juros para evitar intoleráveis prejuízos econômicos para toda a população. E boquiabertos ouvimos que estes juros foram reduzidos para 2%, 6% ao ano para empréstimos, dívidas, etc. Tais notícias, sem dúvida, são prejudiciais ao coração de todo brasileiro endividado, que paga 8% a 10% de juros ao mês, no cheque especial; que paga de 12% a 15% de juros ao mês no cartão de crédito, que paga perto de 10% de juros ao mês em outros financiamentos. Como explicar esta diferença de juros nos países desenvolvidos em relação ao nosso Brasil? E o curioso é que a maioria dos cartões de crédito e de nossos bancos tem a sua sede no estrangeiro. Justamente naqueles países onde são apenas permitidos juros que seriam para nós baixíssimos. Como qualificar esta situação em nosso país? Nada mais correto do que qualificar esta realidade de agiotagem generalizada de nossos agentes financeiros. E por que ninguém se indigna e se revolta contra esta usura e agiotagem eticamente intolerável? Até parece um mistério. Pois, se temos hoje um Governo popular, "do povo, pelo povo e para o povo", penso que já passou da hora de uma medida definitiva (não apenas provisória!), para enfrentar tamanha defasagem entre nossa política popular e a prática econômica de nosso sistema financeiro. Pois agiotagem é uma prática condenada pelo bom senso desde a Antiguidade. Os textos religiosos judaicos, cristãos e islâmicos condenam veementemente a agiotagem; o poeta Horácio, um século antes de Cristo, na antiga Roma, colocou na boca do agiota Álfio, arrependido, a seguinte exclamação: "Feliz aquele que... trabalha... livre de toda usura". Na Idade Média, mesmo depois de se liberar a cobrança de certos juros para empréstimos, continuou-se a condenar sem remissão a cobrança extorsiva de juros. E até hoje os agiotas são pessoas detestáveis, que cobram juros extorsivos sobre empréstimso em dinheiro. Equivalem a predadores da economia, sugando e inviabilizando o crescimento dos setores produtivos, colocando em perigo os patrimônios pessoais, a estabilidade econômica e a sobrevivência de muitos cidadãos.

Diante da agiotagem em nosso país, que ninguém minimamente informado e ilustrado pode negar, será que não existe saída? Tanto se fala em política orientada para os pobres. Tudo bem, a agiotagem parece somente existir entre quem possui conta bancária, cartão de crédito, cheque especial. Mas, hoje no Brasil, também a classe C tem acesso a estes serviços. Por isto, também uma política voltada para o povão, deve-se preocupar em proteger esta população da praga dos agiotas. Mas como sensibilizar nos políticos e juristas para criarem leis que punam a agiotagem em nosso país? E assim não continuemos a mercê de agiotas que vêm bordar e desbordar em nosso país, gozando da impunidade e da corrupção de quem tira proveito desta vergonhosa exploração abusiva dos especuladores.

Uma grande esperança havia iluminado nossas mentes com a promulgação da Constituição de 1988. Nela acenava-se para juros de 12% ao ano. Mas, isto ficou sem efeito, pois nunca foi regulamentado, e emendas constitucionais posteriores inutilizaram esta esperança na redução dos ágios abusivos (juros). E na realidade, hoje, bancos, cartões de crédito e outras movimentações financeiras agem praticamente sem lei, angustiando milhões de cidadãos com dívidas insolúveis. Alguém poderia contra-argumentar de que continua valendo a Lei da Usura, temos também o Código de Defesa do Consumidor, que já se progrediu pela Lei da Reforma Bancária, que temos leis que se preocupam com a economia popular. Não nego que tudo isto existe, mas quem faz cumprir estas belas intenções ali expressas? O Congresso Nacional, o Judiciário, o Ministério Público, a Polícia, o Procon? Sem dúvida, existem pessoas bem intencionadas, que também estão indignadas com a agiotagem generalizada e institucionalizada no Brasil. Mas, como acionar os poderes da república para extirpar esta pústula social? Sinto-me, junto com muitos outros companheiros, impotente.

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