A LINGUAGEM ANCESTRAL
Deus não escreve livros, escreve homens, naturezas, o Universo. Este é o Verbo Divino. Homens escrevem livros, e a linguagem humana provem daquela – a ancestral - pois visa nomear uma escritura maior.
E de onde provêm as diversas línguas criadas pelos homens?
A linguagem - as palavras que deveriam ser utilizadas para nomear O Verbo e para que os homens se unissem neste trabalho - passou a ser instrumento de dissensão. Então surgiram as línguas, os afastamentos, a linguagem decaída, a babélica.
Se a palavra escrita é o corpo físico do pensamento, para se chegar a ele – que é invisível, incorpóreo –, poderemos fazê-lo através dela.
Se o corpo físico do homem, o visível, o palpável, guarda em suas profundezas uma inteligência, uma sensibilidade, uma essência invisível e intocada, ele também - o espírito humano - assemelha-se ao pensamento, à essência invisível da palavra.
“O essencial é invisível aos olhos”, escreveu o inspirado piloto francês.
Assim, o espírito, como o pensamento – invisíveis e essenciais que são –, como os sentimentos, os sonhos e as recordações, deveria merecer de nós uma atenção maior.
E como ocupar-se mais de si mesmo? Como conhecer-se melhor?
A tarefa não é fácil, mas também não é impossível; começando por deixar de ocupar-se tanto dos outros e do que nos cerca, cultivando um olhar reflexivo e auto-observador. Somos especialistas na observação do que acontece ao nosso redor, mas ausentes de nós mesmos. Não chegamos a aproveitar as lições do que nos cerca para aperfeiçoar nossa própria pessoa, que é o que mais deveria nos interessar.
Não somos muito diferentes de um pensamento que pode ser bom ou mau; que necessita reproduzir-se para sobreviver como espécie; que pode evoluir nos curtos anos de vida física.
Deus quer que o ser humano use a sua inteligência e o seu coração para aproximar-se da Verdade que se confunde com o aperfeiçoamento humano. Ele não é o pai vingativo que atemoriza seus filhos e se regozija com guerras fratricidas que os insensatos dizem fazer em Seu nome.
Lutar pela liberdade própria e social, procurando respirar as verdades imanentes à natureza, e as que brotam da própria inteligência e do próprio coração, é a sensata e eloqüente postura do aprendiz que, apesar de reconhecer as suas limitações, não se conforma com a imobilidade e a submissão.
Assim, para que não sejamos letra morta num livro inútil e sem vida, deveremos aprender a escrever a própria história com letras visíveis e invisíveis, como autores e atores, ao invés de espectadores passivos a assistir aos dramas vividos por tantos que sofrem por não pensar, por falar línguas diversas, por estar sempre a se desentender. E talvez possamos recuperar a linguagem perdida que na infância da humanidade sabíamos tão bem pronunciar.
Nagib Anderáos Neto
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