LÍNGUA INFORMAL E NORMA CULTA

Queria poder discorrer com precisão acerca de como se deve lidar com a língua cotidiana, informal, nas escolas. Entretanto, tudo o que posso fazer é alertar sobre a estreita ligação entre a cultura local, e atual, e as mudanças informais da língua erudita.

Quando há, a política de ensino da língua, nas escolas brasileiras, parece opor à linguagem coloquial a língua “culta”, como se esta fosse o bem a libertar os estudantes daquela – o “pecado original”. Não há erro maior.

A raiz do problema é a concepção deturpada de cultura, mas especificamente, na confusão entre cultura e erudição. Não há dúvida de que a língua portuguesa, em sua forma oficial, é um relicário cultural. Mas, até sua legitimação, foi alvo da modificação por seus falantes ao longo da história.

É bem verdade que o produto das modificações também é cultura, mas, a exemplo do caso da língua formal, notamos que, por ser resultados de transformações que a cada segundos nos são mais distantes, se tendermos a considerá-la somente, conceberemos, erradamente, como cultura, algo estático. Enquanto a erudição é a parte cristalizada da cultura, esta mesma é sobretudo um processo.

O processo negou, nega e irá negar vários elementos da língua, como é inevitável, o que não significa que se perderão. Não faltam elementos para gravar as obras literárias dos séculos passados, às quais podemos recorrer e recordar, mas que, além das adaptações, via de regra não sobrevivem atual e cotidianamente de modo tão natural.

O tempo presente é o coração da cultura, pois não é nem potência nem produto da atividade cultural, mas a própria produção.

Mas, tão inversamente ao que quero propor, o tom usado até agora parece delegar à língua “culta” uma posição tal que poderia supor localizá-la numa disciplina histórica. Não é isso. A "norma culta" tem suma importância para a comunicação geral, no sentido de que é um padrão de comunicação, principalmente entre categorias do conhecimento; no entanto, não vivemos em constante atividade acadêmica, burocrática etc.