O CAMINHO DAS ARTES DE UM MAESTRO VAI MUITO ALÉM DOS TÚMULOS!

No continente europeu a visitação de obras de arte nos cemitérios desperta um grande interesse aos turistas que visitam as suas cidades. A arte dos túmulos, também se tornou tradição nas famílias aristocráticas parisienses, e para isso escolhiam escultores renomados para que a sua obra viesse a perpetuar o nome do morto e da sua família. No Cemitério do Père Lachaise, repousam nomes como Edith Piaf, Allan Kardec, Oscar Wilde, Jim Morrisson, Frédéric Chopin, Marcel Proust e tantos outros.

Marcel Proust não deixou epitáfio, mas escreveu versos que primam em beleza pela visão da morte, tal como os do início de "Em busca do tempo perdido: Um homem que dorme sustenta em círculo, em torno de si, o fio das horas, a ordem dos anos e dos mundos”.

Já o escultor norte-americano Jacob Epstein, retratou Oscar Wilde em uma obra de arte magnífica, onde ele está nu, o jazigo do escritor de "O Retrato de Dorian Gray" é todo marcado por baton deixado por seus fãs mais calorosos, e, sem dúvida, é um dos mais instigantes em sua linguagem artística, no marcante itinerário das obras de arte, situado no Cemitério do Père Lachaise.

Mas, considerações históricas a parte, podemos perceber que toda essa visão de enterrar os seus mortos, é reflexo da adoção dos modelos europeus, e veio com os novos tempos do final do século XIX e entrada do século XX, até mesmo na hora do enterro, da despedida, a sociedade emergente de algumas capitais brasileiras, desejava ser reconhecida pela modernidade cosmopolita, e, todo esse contexto, seria refletido muito claramente na construção e ornamentação dos túmulos e mausoléus, muitas vezes monumentais.

Os piracicabanos comemoraram o centenário do portão de ferro artístico (1906-2006) do Cemitério da Saudade, um projeto do arquiteto Serafino Corso e do engenheiro Carlos Zanotta. O “Portal” se constitui com uma fachada frontal formada por quatro pilares, entablamento, cornijas e tríglifos, e platibanda decorada com figuras em relevo. Nas extremidades, há vasos cobertos com pedaços de panos esculpidos. O conjunto é todo coberto por uma cúpula arrematada com uma tocha, essa mesma, também pode ser vista nos arremates dos muros. Já na sua entrada há quatro figuras em relevo, que são as representações de querubins e serafins, e não há igualdade nas figuras. O portão de ferro veio da Alemanha pelas mãos do próprio arquiteto Serafino Corso e a epígrafe: “Omnes Similes Sumus” foi então pintada em 1941 pelo artista Joca Adâmoli, que recebeu e prontamente atendeu ao pedido do prefeito José Vizioli.

Foi muita oportuna a definição “museu a céu aberto” colocada no Cemitério da Saudade pelo sociólogo Eduardo Gabriel, e os túmulos incluídos no guia elaborado por ele para a visitação também tem como destaques nomes célebres de políticos, pintores, médicos, advogados, escritores, religiosos, e tantos outros vultos da nossa sociedade. Desejo fazer aqui, caro leitor deste "Recanto", uma homenagem a Marconi Campos da Silva, cantor, violonista, arranjador, maestro, pintor e escultor, falecido em 2003, e enterrado no Cemitério da Saudade de Piracicaba, em jazigo da família Costa-Giubbina, na cidade que ele adotou desde a década de 60, para passar os seus finais de semana, escrevendo, criando e nas horas vagas pescando no Rio Piracicaba, o maestro, então, casado, com a cantora de rádio e de televisão, a piracicabana, Vera Lúcia Costa da Silva.

Embora desconhecido das novas gerações - algo bastante comum quando se trata da memória cultural-, Marconi Campos da Silva foi um dos integrantes do Trio Marayá (com o primo Behring Leiros e Hilton Acioli), e realizou um trabalho importante no campo da composição, arranjo e regência, colaborando com artistas de relevo nacional como Geraldo Vandré, Jair Rodrigues, Luis Vieira, Carlos Lyra, Luis Gonzaga, Anselmo Duarte.

Conquistou com o Trio Marayá, seis vezes o prêmio mais cobiçado da televisão brasileira, o Troféu Roquete Pinto, três discos de ouro no programa Astros do Disco (TV Record), troféu Campeões da Popularidade (TV Tupi), e melhor conjunto vocal do Festival Internacional da Música.

Várias das suas composições foram apresentadas em festivas, e em 1967 participou, como integrante do Trio Marayá, da histórica apresentação de Jair Rodrigues no "Festival da Canção "em São Paulo com a música "Disparada", de Geraldo Vandré e Théo Barros.

Marconi Campos da Silva fez parte da “História da Música Brasileira”, contudo, devido a suas idéias e ideais foi perseguido durante o Governo Militar, aquele que viria depois do malfadado “Golpe dos militares em 1964”, e tudo isso aconteceu, após ter feito em parceria com Geraldo Vandré, a canção “Che” (referência ao líder revolucionário Che Guevara), e essa canção, caro leitor, defendida pelo Trio Marayá e, ovacionada pelo público presente foi premiada com a Medalha de Ouro no Festival Internacional de Música da Bulgária.

O maestro e arranjador também compôs cerca de 1500 jingles e, sem dúvida alguma, caro leitor, diversas marcas de produtos ainda fazem seu “merchandising”, com jingles concebidos por ele, os quais sem saber. você os canta baixinhos.

"Saudades de um gênio da MPB e de uma alma acima do Bem e do Mal."