HOSANA, OBAMA ! HOSANA !

Acompanhei as prévias e a disputa de John McCain e Barack Obama pela presidência dos EEUU com o mesmo interesse de sempre. Gosto de alguns americanos, da música que fazem – e ai entram cantores e cantoras, músicos, compositores - daquela dança que ninguém dança igual, de muitos escritores de alguns pintores, de alguns filmes – e ai entram atores e atrizes, diretores – e acho que é só, do que me lembro. Não gosto da política que fazem e da arrogância com que olham para o mundo a qual George Bush elevou ainda mais. Há quem seja verdadeiramente alucinado pelos Estados Unidos da América, porém, acredito que a maioria pensa como eu, ou simplesmente os odeia. Penso assim há muitos anos, desde que lá pelo início dos aos 60 do século passado, visitava meu colega do jornal Correio do Povo, o Motinha, tradutor dos telegramas da Associated Press, no Consulado Americano, em Porto Alegre. Ele também trabalhava no USIS – United States Informacion Service cuja missão é “entender, informar e influenciar o publico estrangeiro na promoção do interesse nacional.” Nada a ver com espionagem, eu acho, eu acho. Pois meu colega me presenteava com livros e revistas americanas, que eu pensava ser uma gentileza. Não era. Era uma missão. Foi graças a essa propaganda, coisa que eles sabem fazer como ninguém, li Scott Fitzgerald, Hernest Hemingway,Sinclair Lewis, John Steinbeck, e outros tantos mais, inclusive Dale Carnegie, sim senhor. Alguns livros eram traduzidos para o português de Portugal e outros, como todas as revistas, eram na língua original deles, o inglês. Assim, com certa dificuldade, fui também aprendendo o idioma e tomando conhecimento do "american way of life”. Por essas mídias e por esses meios aprendi tudo o que sei sem ter ido lá, do mesmo modo que sei sobre a Mesopotâmia sem tê-la visitado. Conto essa historinha para justificar - e nem precisava – meus interesses por esse País.

Sempre achei que John McCain seria eleito Presidente. Que os Democratas não voltariam à Casa Branca nem com Barack Obama, por ser negro, e muito menos com Hilary Clinton, por ser mulher. Simples assim, e talvez equivocado e ingênuo. Como não sou especialista no assunto posso errar sem o peso do mico que pagam os que erram e são especialistas. Pois Barack Obama foi eleito e assumiu ao contrario do que diziam os ultras direitistas como disse Carlos Lacerda de Juscelino Kubitschek: “se for candidato não se elege, se for eleito não toma posse, se tomar posse não governa.” Errou feio, como erraram todos os que disseram o mesmo de Barack Obama até a posse, pelo menos. Pois o que resta agora saber é se governará.

Fiquei, como todo mundo ficou, impressionado com a multidão eufórica pelas ruas do mundo. Era coisa de sul americano, aquilo; de brasileiros não fosse a ausência de passistas e ritmistas, de oferendas a Iemanjá e de torcidas organizadas com a camisa de seus clubes, do calor e do sol – ou da chuva – de janeiro. Todos eufóricos com a promessa de mudanças e acreditando na utopia de que “we can”. Mas que mudanças são essas e o que realmente podemos – pode o povo americano – fazer?

Os Estados Unidos diferem de muitos países quanto ao que por aqui se chama de “fazer política”. Não naquilo que é a essência da política: acordos, trocas de favores e de vantagens, traições, mentiras, disputas pessoais em favor próprio ou de grupos e corporações, lóbis e muito dinheiro. Lá também é assim. É assim nas repúblicas como foi nos reinados de nações em todo o mundo. Pois os Estados Unidos diferem de muitos países em três ou quatro questões, que advogados gostam de chamar “pétreas”. Uma delas, a que interessa aqui, é que eles têm e adotam uma Política de Estado e não uma política do Presidente de plantão.

Os EEUU jamais deixarão de apoiar Israel, por exemplo. Os judeus americanos, foram os principais financiadores da compra de terras entre 1937 e 1948 em toda a Palestina, antes da criação do Estado de Israel. Apoiar Israel é Política de Estado.

Liderar os países do planeta e ser o guardião da democracia espalhando seus hábitos, usos e costumes pelo mundo, é Política de Estado. E essa liderança, por suposição, dá a eles o direito de impor seus próprios valores e princípios, como sendo os únicos legítimos, éticos e moralmente aceitos, mesmo que sejam contrários aos preceitos, conceitos e valores e a outros princípios dos outros povos e de outras Nações. Impor seus valores é Política de Estado, desde George Washington, até outro George, Bush, que destruiu as sociedades afegã e iraquiana. Os motivos são muitos e se não fossem valeria qualquer um. Fechar a prisão de Guantánamo, sem fechar a Base Militar e saírem de lá, não muda nada; “no change” e é só o que Barack Obama pode fazer. Como serão julgados os mais de 200 prisioneiros de diversas nacionalidades sem nenhuma acusação formal? Que juiz os julgarão? Onde serão feitos os julgamentos e quem os defenderão? John McCain afirma que “deveríamos discutir a questão de forma completa porque nós não sabemos onde colocar aqueles prisioneiros que estão sob nossa custódia e nenhum país vai recebê-los de volta.”

Retirar as tropas do Iraque é mais complicado do que pode parecer. Não somente pelos compromissos assumidos por George Bush com o cartel do petróleo, com os fabricantes de armas e equipamentos; que vai desde um fabricante de avião ao fornecedor de comida enlatada para as tropas, mas principalmente porque quem está no poder no Iraque não quer que eles saiam de lá. Com a presença dos americanos os antigos opositores de Sadam Hussein agora no poder, estão garantidos com a presença norte americana. Os Curdos, que talvez sejam os únicos muçulmanos que dizem “adorar” os americanos, não querem que eles saiam de lá, pois significam a garantia de paz e de segurança naquela região, a mais rica do Iraque. E ainda também: não sairão de lá porque nenhuma outra Nação é contra a presença deles e obviamente não apóiam e não socorrem iraquianos e afegãos sob o domínio americano, já que não se opuseram quando aqueles países foram invadidos. Ao contrário do Vietnam, que tinha efetivo apoio da China Comunista e de outros paises visinhos. Sair do Iraque não é a mesma coisa que sair do Vietnam. Não só por causa dessa diferença, mas, principalmente porque o mundo não corria nenhum risco de se meter numa hecatombe quando era dividido em leste e oeste, direita e esquerda, comunistas e capitalistas. A guerra fria, na verdade, era a segurança que tínhamos de que os dois lados jamais se enfrentariam porque dividiam o poder. Agora, depois que Mikhail Gorbatchev dissolveu e destruiu a União Soviética, desequilibrou as forças internacionais e deu aos EEUU a liderança do mundo, sem nenhum concorrente, Barack Obama confirma o jugo americano sobre os demais povos e nações em seu discurso, reafirmando uma Política de Estado. “We can!” - ele diz. Podem sim, com a ajuda de vários outros paises que tem histórica tradição de subjugar povos e nações. Os EEUU podem tudo quando querem e em nome da democracia cometem atrocidades. O documentário “Um Táxi para a Escuridão”, que ganhou um Oscar ano passado, mostra as manobras políticas dos americanos para permitir a pratica da tortura no Afeganistão aos prisioneiros daquela estúpida guerra. É de gelar o sangue. No Afeganistão estão os portugueses, os franceses – Sarkozy declarou que não retira as tropas - entre outros, assim como no Iraque. Desde 2004 cerca de 50 países reúnem-se no que chamam de Conferência de Doadores. Madri, Tóquio, Paris, Abu Dhabi e Doha já foram sedes dessas reuniões da “comunidade internacional” dispostas a reconstruir o Afeganistão e o Iraque apoiando os “governos constituídos depois da devolução da soberania”. Os maiores doadores são o Japão e os EEUU. Bilhões de dólares já foram arrecadados e estão em dois Fundos; um Multilateral e outro de Desenvolvimento. Todos administrados pelo Banco Mundial. Porém, no Afeganistão mais de dois terços da população vive com menos de dois dólares por dia. Certos Bancos e seus países parceiros ganham trilhões de dólares com a pobreza da maioria dos países do mundo desde a Segunda Guerra Mundial.

Não olhar para a América latina com o mesmo olhar que a imprensa latino-americana especula com ansiedade inconcebível, é Política de Estado. Hugo Chaves xingou George Bush com palavrões próprios dos covis de marginais, e inadmissíveis a um chefe de estado, e ele simplesmente se fez de mouco. Fosse outro, um Mahmoud Ahmadinejad, por exemplo, e o Irã teria sido invadido.

As mudanças alardeadas por Barack Obama, até agora, foram feitas com tiradas de retórica, com apelo aos brios nacional; qualquer coisa vazia e um tropo lingüístico como “a esperança vencer o medo”, por exemplo. Tanto que até alemães, reunidos aos milhares em praça pública, - desfazendo assim a tola idéia de serem frios, gente sem emoção e entusiasmo latino, ficaram deslumbrados com o discurso que não tratou de nenhum interesse daquele país. Bobagem, Hitler reunia mais gente e por muito mais tempo, com seus discursos histéricos para delírio de uma platéia, digamos, caliente.

Por enquanto fala-se mais do vestido de Michele Obama, e mais ainda dos por quês dela ter escolhido gente desconhecida, fora do que chamam de circuito da moda, para costurar suas roupas. Bem, já é uma “mudança”. Na falta do que fazer, comentaristas políticos e consultores traçam o perfil da personalidade da Primeira Dama e destacam aspectos de seu caráter a partir do vestido amarelo periquito que usava na posse do marido. A propósito, chamar a mulher do Presidente de Primeira Dama é invenção americana, não encontrada em nenhum outro país, exceto em nossa latina América. Aqui temos primeiras damas até em Clubes Sociais; basta ser mulher do presidente. Assim também é chamar de “posse” aquela cerimônia. Isso é uma herança portuguesa, com certeza. Lá como aqui toma-se posse; que significa alguma coisa como adonar-se do cargo. Esse termo não é usado em nenhum outro país para significar ato tão solene. Os americanos, como se viu, chamam isso de “inauguration”; que significa solenidade inaugural de um novo período, investidura, nesse caso do 44º Presidente dos Estados Unidos da América.

Durante a longa e desafiante campanha política de Barack Obama para ser o indicado do Partido Democrata e concorrer à Presidência da República, os adversários jogaram duro contra ele. E às vezes até fizeram o jogo sujo da desmoralização. Barack Obama foi eleito com 53% dos votos, o que lhe deu maioria, mas não significa que esse mesmo percentual de indivíduos da Nação o apóia. Não se sabe ao certo, mas quase a metade dos americanos não quer Barack Obama como Presidente dos EEUU. Alguns preferiam John McCain, outros, nenhum dos dois. A sociedade americana é complexa, pois sua formação multinacional tem uma característica particular. Lá negros, árabes, judeus, ingleses, escoceses, poloneses, italianos, e tantos outros assumiram a condição de serem americanos, mas não se afastaram de suas raízes. Mantém seus hábitos e seus costumes. Aqui, portugueses, tupi-guaranis, africanos, italianos, alemães, japonês, árabes, judeus fundiram-se ao povo brasileiro. Assimilaram as características, guardando apenas pequenos aspectos de suas culturas ancestrais, e nacionalizaram o restante num caldeirão cultural. Nós, os brasileiros, somos um povo mestiço que não nota ou não se importa, com as diferenças porque assimilamos tudo e nos adaptamos. Lembrem que os portugueses, desde quando chegaram aqui, falaram tupi-guarani por muitas décadas. Com o extermínio dos nativos a língua portuguesa ganhou seu lugar entre nós incorporando palavras, termos e expressões de outras línguas e de muitos dialetos. Nos EEUU não foi assim.

Penso que grandes conquistas não são feitas com as ações e as atitudes simplistas com as quais nos impressionamos e entusiasmam multidões. Para chegar ao topo as barreiras são removidas usando-se métodos e meios nem sempre baseados em princípios éticos e morais que significam ser aquilo que é bom para todos os indivíduos de uma sociedade. O que atrapalhar a escalada deve ser removido com meios que justifiquem os fins. Barack Obama é colocado ao lado de mártires e de heróis do passado. Alguns nunca chegaram ao poder pelo que pregavam. Foram eliminados antes. Outros, depois de terem chegado a Presidência da República.

Durante a campanha os oposicionistas contrários a sua candidatura esparramaram cacos de vidro pelo caminho de Barack Obama e jogaram pedras nele e na mulher Michelle. Questionaram sua origem, sua religião,sua trajetória até o Senado, suas ações como advogado, as escolas que estudou e seu registro na “Bar Association” uma espécie de Ordem dos Advogados de Illinois. Na ficha de inscrição declarou que nunca havia usado nenhum outro nome além de Barack Hussein Obama. Em um vídeo que circula pela internet aparecem formulários que mostram que ele usou outros nomes antes de entrar para aquela entidade. E outros vídeos tentam provar que ele é mulçumano. Como na internet tudo pode ser falso e verdadeiro, esse não é, sem dúvida, o meio para se acreditar em todas as difamações e acusações que fizeram contra ele. Setores da imprensa americana vasculharam documentos a procura de pistas que levassem as provas de que ele não havia nascido no território americano; e sendo estrangeiro não poderia ser Presidente da República. As provas concretas sobre Barack Obama estão no Quênia; e o mundo conheceu sua família e a casa onde morou na adolescência. E, além de que foi uma espécie de advogado dos pobres em Chicago, nada mais se sabe, a não ser que ele não é branco, milionário – do comércio, da indústria ou fazendeiro – e não vem da elite tradicional de políticos como seus antecessores.

Acho Barack Obama um mistério; um personagem muito bem construído e pronto para ser consumido em todo o mundo, como demonstra os cerca de 65 milhões de dólares que recebeu de cidadãos espalhados principalmente em país muçulmanos, para o caixa de campanha. E talvez por seu porte elegante, esbelto, com olhar mais ou menos vago, mas sempre mirando um ponto fixo em algum lugar e virando a cabeça para a esquerda e para a direita quando fazia seus pronunciamentos - graças aos dois teleprompters invisíveis colocados em cada lado do palanque – e tocando naquilo que é comum a todos, “change” – e quem não deseja mudar alguma coisa – sem fazer nenhuma promessa, tenha tocado os corações e atingido as mentes dos mais sensíveis; milhões de mais sensíveis. Até Saramago empolgou-se.

Afinal quem é Barack Hussein Obama, se ninguém tem acesso a sua certidão de nascimento, a seu histórico escolar, a seus registros médicos, a lista de contribuintes de sua campanha, de seus clientes no escritório de advocacia, e ao seu passaporte, entre tantos outros documentos que tornam um homem público visível? A avó dele disse à imprensa que ele nasceu no Quênia numa entrevista e nunca mais pode falou com alguém.

Não creio em mudanças significativas a ponto de mudar paradigmas e alterar parâmetros com a relevância que a empolgação plantou mundo a fora fazendo parecer que Barack Obama é capaz de tudo e somente fará aquilo quer for bom para a humanidade. Como se fosse um messias mouro que ninguém sabia onde estava e que de repente apareceu para nos salvar mudando as coisas porque nós somos capazes. Como se fosse possível chegar ao poder da maior Nação do mundo, que tem um sistema econômico capaz de afetar outros planetas, é dona da única moeda válida, e tem a maior maquina militar, sem fazer concessões, sem machucar ninguém.

Mesmo quem não é otimista incorrigível porque guarda traços pessimistas sobre muitas questões, deseja sinceramente que seja possível mudar para melhorar. Que Barack Obama, pelo menos, consiga livrar o mundo dessa crise financeira e econômica que eles começaram. Isso sim diz respeito a todos nós diretamente em qualquer parte do planeta.

* Hosana - sm (lat hosanna e este, pelo gr do hebr hôshî´ânnâ, salva-nos)

CESAR CABRAL
Enviado por CESAR CABRAL em 26/01/2009
Código do texto: T1405562
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