ESTA FALSA HIGIENE - MEDICINA PREVENTIVA DIVERTIDA II
Um farmacêutico desesperado encaminhou-me uma cliente. Ele cria que as infecções urinárias que ela exibia com freqüência, podiam ser causadas pelo fato dela não gostar de fazer sexo com o esposo.
Minha primeira reação foi a de ficar contente com o grau de integração da psiquiatria com a população. Afinal, estamos nos esforçando muito para fazer isto com outras especialidades, inclusive com os vendedores de aspirina.
Durante a consulta ela me contou que jamais tivera orgasmo com o marido, pois ele gostava de corridas de curta distância, sempre chegando em primeiro lugar, isto é: tinha ejaculação precoce persistente. Como? Você nunca teve uma sequer? Vai ser bom assim no inferno, pois lá é que vivem os mentirosos.
Consegui obter a confiança dela e depois de muitas perguntas, perguntei-lhe esta: “Como você costuma fazer sua higiene após evacuar?” A resposta veio em duas etapas: “Quando estou em casa uso a duchinha manual; quando saio para outros locais sem ducha uso o papel higiênico”. “Como você passa o papel higiênico no ânus?” A resposta veio sem medo: “Como fui ensinada desde pequena e ensinei minhas filhas: coloco a mão com o papel entre as pernas e após pressioná-lo contra o ânus, puxo-o para a frente”.
Pobres filhas, como a mãe terão infecção urinária com freqüência, pois a ducha, se mal manuseada, além de contaminar a mão de quem a usa, pode, com o jato, inundar a vagina com micróbios fecais. Pessoalmente, se eu tivesse poder, proibiria tal instalação.
Mas vamos à segunda parte. Ao passar o papel higiênico sujo pela região da vagina, a probabilidade de contaminá-la é muito grande, explicando o porquê do insucesso de nosso farmacêutico falhar nos diversos tratamentos que fizera, sem nunca a cliente ter feito uma simples urocultura com antibiograma, coisa que um clínico de plantão solicitaria, penso eu.
Solicitei estes exames e ao constatar uma infecção, solicitei instintivamente ao urologista uma cistoscopia - exame da vias urinárias até chegar à bexiga - por um aparelho chamado cistoscópio, que permite ver o interior da bexiga e todo o percurso, por meio de um sistema de lentes, espelho e luz que torna fácil o exame.
Ao fazer isto, o urologista descobriu no teto da vagina um abscesso (bolsa cheia de pus), onde provavelmente os antibióticos nunca conseguiam atingir.
Aproveitando o exame, o urologista fez uma curetagem (de cureta = colherinha raspadora, seu bobo), eliminando o cisto, fez uma lavagem com preparados especiais, além de antibiótico local e via oral (pela boca pra quem não sabe).
Não mais precisou de fazer tratamento para infecções urinárias até esta data, por três motivos: instalou um bidê no local da ducha, onde lhe ensinamos tapar a bexiga com a mão enquanto se lavava,; passou a limpar-se da frente para trás, na horizontal, de forma a não sujar as nádegas e separou-se do marido, que se recusou admitir que tinha ejaculação precoce, alegando que ela era muito fedida, por isto era “rápido no gatilho”.
Hoje ela vive bem. Cuida das filhas e vigia o novo marido, o tal vendedor de aspirinas, para que não receite para ninguém, pois isto pode dar cadeia e eles se amam muito.
A propósito, para quem está se perguntando: sou clínico, com especialidade em psiquiatria, como me ensinaram a ser. Tomara que as Faculdades preparem médicos com este mesmo espírito.
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