A felicidade que a televisão nos dá

A FELICIDADE QUE A TELEVISÃO NOS DÁ

Quem quiser ser feliz, compre uma televisão com controle remoto para seu entretenimento. Ou, se desejar uma programação mais diversificada contrate um plano de tevê a cabo. E já que está nesta, que tal comprar outro aparelho de televisão? Mas não esqueça: 42 polegadas, tela plana e sistema digital, HD, etc.

Se quiser evoluir mesmo, basta pagar só mais um pouquinho e você terá acesso a canais especiais (pay per view - pague para ver) e assim poderá assistir lutas e jogos. Você irá sentir-se um cidadão diferenciado. Imagine que sensação de poder você sentirá ao assistir os jogos do Brasileirão, enquanto os seus vizinhos ficam assistindo o Faustão, o intragável Raul Gil ou o Gugu!

Afinal, como saberíamos o quanto o Governo nos ama e o bem que faz por nós, se não aparecesse no “pronunciamento do excelentíssimo senhor Presidente...”. Coisa fantástica e de elevado conteúdo ético e cultural é o Big Brother. É uma coisa tão construtiva que tem uns babacas voyeurs que assinam para vê-lo 24 horas por dia.

Toda essa programação de nítido projeto cultural serve para que você sobranceiramente passe por cima de probleminhas banais, como fome, violência, desemprego, marginalidade, corrupção, alta do custo de vida, taxas bancárias elevadas ao absurdo e outras besteirinhas.

Para despertar seu senso de crítica social, à noite, depois dos noticiários do governo, você poderá se deleitar com o “tome-chifre” das instrutivas novelas da rede oficial. Que preciosidade! Nesta hora o brasileiro se anestesia de todos os dramas, para buscar subsídios morais e circunstanciais para sua vida.

O telespectador, aquele que tem a ventura de ter um aparelho de televisão na sala, com um anjinho ou um pingüim em cima, vai ver mulheres boas, rapazes musculosos e barangas de toda a ordem, fazendo coisas incríveis, viajando por lugares descolados, onde você jamais iria, se não tivesse uma tevê. Viu só que coisa importante? Além disto, os diálogos das novelas e mini-séries é capaz de lhe dar uma visão ampliada da língua portuguesa.

Por fim, como você é tão especial, principalmente se tiver grana, terá a chance de participar do instrutivo programa “Criança Esperança”, animado pelo Renato “Didi” Aragão. Com uma contribuição

“espontânea” de modestos 10 ou 50 reais, você terá a oportunidade de sentir-se ainda mais humano e patriota, participando de mais uma campanha social (já é a milésima) que agora sim, pelo montante do dinheiro que já foi arrecadado, vai erradicar o problema da miséria lá do nordeste. Se não for assim, pelo menos você ajuda a emissora oficial a descarregar seu Imposto de Renda.

O caso é que, se um dia a financeira (por causa de cinco prestações atrasadas) tomar de volta a nossa televisão, veremos que éramos felizes e não sabíamos. Mesmo que a gente sofra não importa. Só ficar em casa no domingo, deitado no sofá assistindo o Faustão, já compensou todos os percalços. Sinceramente, se não fosse a televisão, eu não sei o que seria do Brasil!

Doutor em Teologia Moral