Que Tipo de Democracia vige em Israel?

O historiador militar americano, Caleb Carr, elaborou uma definição de terrorismo para caracterizar as ações de grupos terroristas, notadamente os islâmicos. Segundo ele, “o terrorismo é, simplesmente, a denominação contemporânea e a configuração moderna da guerra deliberadamente travada contra civis, com o propósito de demolir a disposição de apoiar líderes ou políticas que os agentes dessa violência consideram inaceitáveis. Não é outra, senão essa, a caracterização da ação que o Estado de Israel vem perpetrando na faixa de Gaza.
 
O Estado de Israel vem utilizando sistematicamente a violência contra civis palestinos com uma força avassaladoramente desproporcional aos ataques com que vinha sendo alvo por meio de foguetes lançados, supostamente pelo Hamas, de dentro da faixa de Gaza. Assim, as autoridades israelenses justificam sua ação, pela urgência em destruir a capacidade do Grupo Hamas de lançar foguetes contra seu território e proteger o seu povo. No entanto, ninguém se pergunta, insistentemente, o que levou o Hamas a adotar atitudes extremas.
 
O povo palestino está confinado na faixa de Gaza, quase sem acesso a água, alimentos, medicamentos, combustível, entre outras necessidades. Completamente sitiados na faixa de Gaza, uma população de um milhão e quinhentas mil pessoas se desespera com condições de vida degradantes. São, na verdade, prisioneiros em sua própria terra.
 
Como podemos aceitar que um regime democrático tenha atitudes tão autoritárias e violentas? Temos que questionar que tipo de democracia é esta que sujeita todo um povo a uma situação de marginalização, de quase escravidão? Será que o povo de Israel quer uma democracia construída sobre os cadáveres do povo palestino? Democracia é o regime segundo o qual os fins justificam os meios e aí vale o uso da violência extrema e desproporcional contra o povo palestino?
 
Não podemos, por outro lado, elaborar comparações simplistas entre a realidade do conflito árabe-israelense com a realidade brasileira, que enfrenta a ação do crime organizado que sujeita o Estado e parte da população civil. Não podemos, por desinformação ou por preferências ideológicas, caracterizar a resistência palestina como a ação de grupos de bandidos, assaltantes, estupradores e traficantes. No Brasil enfrentamos essa situação, na qual vemos o Estado e parte da população reféns de grupos de marginais, pelas condições historicamente construídas, originadas de uma profunda diferença de renda e condições de vida, entre os diversos segmentos sociais da nossa população. As diferenças são gritantes e violentas, tanto quanto a reação, algumas vezes organizada e despolitizada de grupos que fazem as suas próprias leis. No entanto, uma democracia é feita com regras transparentes conhecidas por todos e que valem igualmente para todos. A democracia não pode ser feita para uma parte da sociedade em detrimento de outros segmentos sociais. A democracia não pode ser construída a partir do genocídio ou da submissão de um povo para que outro se sinta seguro e livre. A democracia tem a obrigação de cultivar a tolerância e seguir regras bem definidas, de forma ética e responsável, no sentido de encontrar formas justas e pacíficas de solução de conflitos.
 
Há que se respeitar os organismos internacionais para a mediação de conflitos entre países e povos. No entanto, Israel, como uma democracia ocidental incrustada no oriente médio, devia ser um exemplo a ser seguido pelos demais países da região. Desgraçadamente, Israel tem sido o exemplo a ser rejeitado pelos países árabes por sua incapacidade histórica de respeitar outros povos e, até mesmo, por sua persistente incapacidade de respeitar as determinações da ONU.
 
Não podemos e não devemos legitimar os ataques do Hamas ao território israelense. Devemos entendê-los, no entanto, dentro do contexto dos conflitos entre israelitas e palestinos, que é milenar, e acreditar que a mediação da ONU é possível e necessária para que a matança de lado a lado não se perpetue até o fim dos tempos. Mediação pressupõe considerar as posições das partes envolvidas no conflito sem julgá-las a priori, sendo firme ao condenar atitudes extremas de ambos os lados e encontrar um caminho que seja justo e aceitável para ambos. Não haverá paz duradoura na submissão pela força de uma parte, no caso de Israel, sobre a outra parte, no caso os palestinos.