Atendimento Hospitalar
Desde o tempo da escola, aprendemos que saúde, educação e segurança são deveres do Estado. Entretanto, apesar dos pesados impostos que pagamos, ainda temos de despender outros encargos com a rede privada para um atendimento mais digno. Na área da saúde, o paciente desprovido de recursos passa por constrangimentos, quando procura atendimento médico, enfrentando filas quilométricas para um direito que lhe é negado sistematicamente, sob a alegação de um quadro reduzido para a grande demanda. Casos de emergência são barrados em hospitais, salvo para os beneficiários de plano de saúde ou mediante caução de depósitos para os não detentores de planos conveniados. Muito embora haja lei proibindo a exigência de caução, não é o que ocorre na prática.
Testemunhei alguns casos de pessoas da família, moradoras no interior, que, por não possuírem planos de saúde, só foram atendidas mediante a prévia caução. Num dos casos, fui o intermediário financeiro, utilizando o meu próprio cheque, para cuja conta era transferido o valor do débito correspondente, pela família do paciente. Fiz a caução para o atendimento emergencial e, em seguida, teria de fazer outra para o internamento. Dirigi-me ao setor competente que, sob a alegação de falta de vaga em apartamento, o paciente teria de ficar na UTI, necessitando uma caução de seis cheques que representavam o exato valor correspondente a seis vezes ao do apartamento. Pelo valor exorbitante, confesso que tremi ao pegar o talão de cheques. Fiz algumas indagações sobre o tempo para o desconto dos cheques, tendo a resposta de que já a partir do dia seguinte e que poderia pedir outra caução se o paciente tivesse de ali permanecer mais de seis dias. Diante da insensibilidade da pessoa que me atendeu, demonstrando toda frieza, ponderei um pouco e desisti de emitir os cheques, pensando em buscar outra alternativa, uma vez que o paciente já estava sendo atendido na emergência. A essa altura, vindo do interior, chega o filho do paciente que vislumbra a possibilidade de transformar o atendimento particular em SUS, para o que só seria possível com a intervenção do Diretor do Hospital. Pelo seu conhecimento com ele ainda na fase escolar, tudo foi resolvido a contento, apesar da proibição burocrática para esse procedimento, sob a alegação de que não pode haver a dupla modalidade. Ao entrar no hospital na condição de particular ou segurado de convênio não pode ser alterado para SUS. Felizmente prevaleceu o bom senso graças ao conhecimento com quem detinha o poder da decisão. Ficou, entretanto, o nosso questionamento quanto aos que, por algum motivo, não tiveram o privilégio de construir uma boa rede de relacionamento. O direito deveria ser igual para todos, como preceitua a nossa Constituição. “Não é só quem sabe laçar o boi que tem o direito de comer de sua carne".