Madalena, o "espada"

MADALENA, "O ESPADA"

Esta é mais uma história curiosa de nosso folclore, respigada pelo filósofo Antônio Jesus Pfeil, contada nos cafés e nas esquinas da atribulada Canoas. Antes que se perca, é melhor que se jogue fora, dizia meu pai, ou melhor, que se coloque no papel.

A cidadezinha, seria Osório, possuía um respeitável movimento, pois era ponto final da linha de um trem, talvez imaginário, que vinha de Santa Vitória, e ainda era ponto de parada (e às vezes de “baldeação”) dos ônibus que se dirigiam a Torres, pela praia, vindos da capital. A localidade, isso há sessenta anos atrás, era uma biboca formidável, no originário sentido trágico da palavra.

As únicas coisas que se poderia classificar como atrações turísticas eram a estação da Viação Férrea e uma sociedade, como que uma vanguarda dos movimentos gays, chamada “Clube Flores da Primavera”, apelidada, pelos não-alinhados de “fecha-a-rosca”.

No período de férias, o “clube” era muito freqüentado. Dizem que vinham bichas de Jaguarão, veados das charqueadas de Pelotas e até maricones del Uruguay.

Na estação do trem, um oposto: o Sr. Madalena, tido como um dos grandes machos da cidade. Um autêntico "espada". Dependendo da entonação com que seu nome fosse pronunciado, logo vinha cara feia e, não raro, alguns bofetões.

Na verdade, seu sobrenome de família era Magdaleno. Ninguém sabia seu pré-nome. De certo algum gaudério Honório, Possidônio, João Manoel, Octacílio ou quem sabe Quintiliano.

Todos os dias estava ele na estação, de terno azul marinho e chapéu vermelho enterrado na cabeça. Era esse o uniforme dos chefes de estação. Na partida do trem, ele tocava o sino com tanta força que mais de uma vez, o artefato caiu de sua armação chumbada na parede.

Pois o Madalena não gostava de duas coisas: de bêbado que mijasse em vagão de trem, e dos alegres rapazes que vinham fazer festa no “fecha-a-rosca”. Um dia, Madalena estava exasperado: um bêbado havia vomitado na plataforma; uma mulher dera à luz num vagão de primeira, o telefone (à manivela) não funcionava. E chega o trem. Com uma hora de atraso, como sempre.

A resfolegante locomotiva pára, e do primeiro vagão desce uma pessoa. Vestia terno rosa, camisa de renda com babados, sapato branco de verniz, uma maleta colorida, e protegido contra o sol por uma sombrinha floreada.

O rapaz, recém chegado, olha para Madalena e pergunta: “O senhor sabe onde fica...”. Não teve tempo de terminar. Levou um soco na cara que o fez perder a direção. Dizem que voltou a pé, pela linha do trem até sua cidade de origem. Folclore? Ficção? Nunca se soube...