Quem anda a pé é pobre, respondeu um aluno na prova da escola.

A noite de natal de 2008 não poderia ser mais traumática para os familiares e amigos de Aline da Silva Ferreira (14 anos) e Adnailson Sousa Brasão (17 anos). O casal de adolescentes foi fatalmente atropelado pela viatura da polícia civil na principal via de acesso entre os bairros e o centro comercial de Laranjal do Jari, a conhecidíssima Avenida Tancredo Neves.

Os acidentes de trânsito e especialmente os atropelamentos na Tancredo Neves tem sido o assunto mais destacado por este modesto colunista na última década. Os artigos sobre o tema sempre tem sido muito cortejado pelos leitores e por um grupo de meia dúzia de pessoas sensíveis ao problema do qual provavelmente não faz parte as autoridades responsáveis por reduzir tal problema.

As circunstâncias em que os dois adolescentes foram colhidos pela L 200 da polícia civil ainda não são conhecidas oficialmente. A falta de informações tem gerado muitas especulações pela cidade, aumentando ainda mais a angústia e o sofrimento dos familiares que depois de perderem os entes-queridos de forma tão trágica, temem que ocorra uma parcialidade ou ausência de empenho das autoridades em produzir um correto desfecho para a situação.

O delegado de Polícia Civil de Laranjal do Jari garantiu que o acidente será apurado com a mais absoluta rigorosidade e havendo constatação da culpabilidade dos envolvidos, o inquérito será encaminhado a Corregedoria da Polícia do Estado e ao Ministério Público para as devidas providências. Disse ainda que usará com os seus agentes policiais a mesma rigidez que utiliza com os condutores de veículos particulares deste município, entretanto, não revelou o nome do profissional que guiava a viatura no momento do acidente.

Segundo o delegado, o veículo retornava de uma diligência contendo em seu interior uma pessoa detida por cometer um crime contra a lei “Maria da Penha” e o condutor estava a uma velocidade de aproximadamente 60 km/h. É oportuno ressaltar que a velocidade máxima permitida naquela via é de 30 e 40 km/h.

As últimas interrogações sobre a fatalidade da Tancredo Neves somam-se a extensa lista de dúvidas e indagações da população local. Em recente programa o radialista Serginho Abreu questionou: “Quantas pessoas ainda terão que perder suas vidas no trânsito para que se tomem alguma providência?” Em resposta ao nobre formador de opinião, gostaria de acrescentar que enquanto as vítimas forem pessoas de pouco poder aquisitivo é pouco provável que as autoridades tomem alguma iniciativa, sendo necessária que a mobilização parta das camadas atingidas e daqueles que como eu, o radialista supracitado e outros avaliam que o problema é grave e existe solução.

A resposta de um aluno das séries iniciais de uma escola pública laranjalense ilustra perfeitamente o problema do atropelamento em Laranjal. Perguntado o que significava a palavra pedestre, o pequeno estudante respondeu que eram as pessoas pobres, pois quem era rico andava em automóveis ou noutros tipos de transportes. É claro que a afirmativa contrariou a professora que a essa altura já tinha uma resposta pronta: “pedestre são as pessoas que andam ou estão a pé”, diria, entretanto, a justificativa do garotinho é mais profunda do que se parece. O problema não ganha visibilidade porque, para os nossos políticos, o “pedestre” se restringe apenas ao conceito inicial do garotinho, ou seja, são apenas os pobres.

*IVAN LOPES é professor, pedagogo, acadêmico de Letras e membro da Academia Laranjalense de Letras. E-mail: f.lopes.vj@bol.com.br

IVAN LOPES
Enviado por IVAN LOPES em 30/12/2008
Código do texto: T1359412
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2008. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.