A vasectomia
A VASECTOMIA
Pois a Cassiopéia, conforme o nome indica, era de uma família grega radicada no Brasil, mais precisamente em São Paulo. Jovem, de pele clara, magra, alta sem ser bonita, ela desde muito cedo descobriu os prazeres da carne. Não, não se trata do churrasco, mas do sexo mesmo! Aliás, seguiu os passos da mãe, que mesmo na meia-idade era uma inveterada fubana, daquelas que se oferecia a quem olhasse para ela por mais de trinta segundos.
Uso todos os verbos no passado, pois são pessoas que conheci há mais de vinte anos, e de quem não tenho mais notícias. Dizem as más línguas – disto eu não tenho certeza, pois apenas ouvi falar – que a velha, para facilitar as coisas e favorecer sua demanda pessoal, abriu na paulicéia desvairada, um lupanar, em um bairro elegante. Pelo jeito, a magrona Cassiopéia não era apenas filha da dona, mas levando a coisa a sério, tornou-se também “atleta” daquela atividade tida como a mais antiga do mundo.
Numa reviravolta da vida, dentro do bordel materno, Cassiopéia conheceu um mancebo. Apaixonaram-se, decidiram casar e, para fugir do atavismo, ele a carregou para longe, levando-a para morar em um distante estado do norte, onde a dupla passou a ter uma vida normal, com filhos, casa-própria e todos os quejandos normais de um grupo familiar.
Ele era funcionário de uma grande empresa, e desfiava sua bazófia contando histórias fantásticas de um gabarola que parece ignorar certos dados de um passado recente, dos quais ele tinha amplos conhecimentos. Tanto tinha ciência da vida pregressa da cocote que volta-e-meia dava umas “incertas”, vigiando os passos da percanta, aqui e ali. Nunca se ouviu falar nada dela, depois de casada, mas como diz o título do filme, “o passado condena”.
Numa dessas, já que tinham três filhos, ele resolveu fazer uma vasectomia. Fez e quatro meses depois, ela apareceu grávida. O cara virou um desabotinado, faltando pouco para se matar, tamanho o desespero que o assolou. Os amigos tentaram consolá-lo, aventando uma eventual falha no procedimento cirúrgico, o que pode ser comum em alguns casos. Ele não quis dirimir a dúvida. Não fez o exame de fertilidade e acolheu, mesmo de pé-atrás, o rebento como filho seu.
Não é assim que acontece na vida política no Brasil? O eleitor sabe que o político em geral é safado, por isso acredita desconfiando. São inúmeras as circunstâncias em que a fidúcia sofre rompimentos. Ora é o político ou homem público que, dando vazão ao atavismo de sua natureza, pratica um sem-número de falsetas, como corrupção, superfaturamentos, recepção de propinas ou “agrados”, agindo como a mulher que se vende a quem pagar mais.
De outro lado, o eleitor que sabe dos deslizes de seu eleito, mas, para não dar o braço a torcer, diz que ele é muito bom, encostando-se nele para obter um emprego para o filho, uma carga de tijolos para um “puxadinho” em sua casa, etc. O eleitor traído nunca tira a limpo a safadeza do “doutor”, preferindo venerá-lo e acreditar nas desculpas de “armação política”.
Filósofo e escritor