A Doutrina da Prosperidade
A DOUTRINA DA PROSPERIDADE
Pr. Th. D. Serafim Isidoro.
A geração que nos antecedeu (quarenta anos atrás) não poderia vislumbrar uma época em que os evangélicos no Brasil teriam um vertiginoso crescimento de denominações pentecostais as mais variadas, quando a experiência do dom de línguas e da plenitude do Espírito se propagaria, sem fronteiras ou barreiras.
Também não vislumbraria, em todos os setores dos arraiais evangélicos, que uma época chegasse quando para alguns, ser pentecostal seria sinônimo de contrário a teologia, afirmando-se que o movimento pentecostal não depende de teologias.
Teologia, palavra originada do grego, tem como significado: “tratado (ou estudo) acerca de Deus”. Convencionar-se-ia, consequentemente, que o movimento pentecostal não dependeria, não praticaria o estudo acerca de Deus. De fato, o movimento pentecostal prescindiria sequer de igreja (ou de igrejas). Seria um movimento independente, descompromissado de qualquer peso ou responsabilidades humanas. Seria uma espécie de vôo livre, de atuação só compromissada com o Espírito de Deus. - O vento assopra onde quer...
Estudar doutrinas é uma característica de igrejas. O povo que se converte precisa ser instruído doutrinariamente, teologicamente; necessita estudar as Sagradas Escrituras; precisa da Bíblia. - Mas o movimento Pentecostal não seria igreja; seria um movimento evangelístico, avivalista em sua essência.
Sem tais compromissos não há como se estabelecerem regras. Se a própria Bíblia deixa de ser norma (já que nem é estudada) o povo se vê em uma liberdade que fascina, uma liberdade nunca antes sequer pensada pelos evangélicos. Denominam a essa liberdade “o movimento do Espírito”, onde o que fosse necessário seria trazido em revelação por Esse mesmo Espírito (o Espírito Santo).
O descompromisso com leis faz parte de nossa geração do terceiro milênio, desse ano 2001 que agora estamos iniciando: A televisão não admite censura; o aborto reivindica legalidade; o homossexualismo busca direito de casamento; a eutanásia procura espaço legal; a sociedade busca liberdade de ação, de expressão e de comunicação...
É a época, é a era, do Anticristo que há de se manifestar...
Anticristo é termo teológico, traduzido em nossas bíblias do texto da segunda carta de Paulo aos Tessalonicenses, capítulo dois e versículo oito:
“ O I N Í Q U O ”
- “HÓ ANOMOS” e que significa: “o contra a lei”.
Quem é contra a lei é anarquista.
É subversivo.
É marginal.
Aí a tendência deste século e a preparação para um sistema que abolirá tudo o que estabelecido, inaugurando-se no domínio desse Anticristo a liberdade total, não se importando se boa ou má, já que as regras serão abolidas: nada de leis, nada de restrições, nada-de-nada:
“É proibido proibir”...
É impossível a uma igreja ou movimento desvincular-se do acurado estudo das Escrituras. A teologia é uma ciência que terá sempre evolução no entendimento da revelação... Do aprimorado estudo das Sagradas Escrituras advirão novos conhecimentos à medida que o plano de Deus vá progredindo no tempo em direção a eternidade. As profecias se tornam entendidas somente na proximidade dos seus cumprimentos. Não há como interromper a busca das verdades de Deus em nome de um padrão já estabelecido:
“A vereda do justo é como a luz da aurora que vai brilhando mais e mais, até ser dia perfeito”... “Bem aventurado o varão que... tem o seu prazer na lei do Senhor e que nela medita de dia e de noite... tudo quanto fizer prosperará”. - ( Sl. 1).
“Procura apresentar-te a Deus como obreiro que não tem de que se envergonhar, e que maneja bem a palavra de Deus” - (II Tm. 2:15). - “Ensinando-as a guardar todas as coisas que vos tenho mandado (Mt. 28:20). “O que de mim recebeste,confia-o a homens fiéis que sejam também aptos para ensinar”... - (II Tm. 2:2) - “Ele mesmo deu uns para apóstolos, profetas evangelistas, pastores e MESTRES” - (Ef 4:11).
Onde não há ensino, o povo cai. Onde se despreza a instrução, o fanatismo se alastra. As práticas e os métodos hoje utilizados por alguns do chamado movimento Neo-pentecostal visam ir de encontro às necessidades temporais, humanas, do povo cuja área principal é a do dinheiro, a área da
P R O S P E R I D A D E
São anunciadas medidas e atitudes de fé que sem dúvida, dizem, sacarão do banco de Deus as soluções por demais almejadas para que - nesta vida e agora - "sejamos saciados em nossa carência e sejamos reinantes sobre todos os problemas e dificuldades" - dizem
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É a pretensão da volta espiritual de Elias, de Sansão, de Davi contra Golias, de verdadeiros super-homens espirituais com domínio sobre demônios, doenças, situações adversas ou dores.
“Tudo é possível ao que crê...” - Dizem eles.
A fé seria, então, não um dom de Deus, mas um exercício, um direito, do homem. Homens e mulheres de fé removeriam montanhas de dificuldades, trancariam demônios que submetem cidades e vidas e seria o povo triunfante - aqui e agora - diante dessa sociedade corrompida que aí está. A fragilidade crente se tornaria em uma invencibilidade sem limites... Um de seus representantes, pregador, se denomina “o dominador deste século”.
O sonho parece bom. - A prática é que não é verdadeira.
Essa moderna doutrina da prosperidade não se apercebe de que as promessas de sucesso financeiro, terrestre, humano, NUNCA são feitas na Nova Aliança ( nunca é feita no N.T).
Na realidade, as bênçãos materiais são para o judaísmo, para o Israel que fosse obediente as leis divinas (Torah), e que estão exaradas, prometidas na Velha Aliança (Velho Testamento). Ao judaísmo, a Israel, Deus promete a terra, com todos os seus benefícios e prosperidade implícita. À Igreja, a Nova Aliança não faz tais promessas. À Igreja o Senhor promete o céu, as bênçãos espirituais e as bênçãos futuras. Israel é da terra, a Igreja é do céu.
O judaísmo é a religião da opulência, da riqueza, do domínio, da fartura terrestre. O cristianismo é a religião da humilhação, da renúncia, da negação nesta vida, para que a situação se inverta na vida futura. É a transferência de bens de consumo passageiro, por bens celestes, eternos. É a troca do finito, para o infinito; do material para o espiritual; é a pérola de grande valor.
“Aconselho-te que compres de MIM ouro provado no fogo para que te enriqueças, e vestes brancas para que te vistas e não apareça a tua nudez; e que unjas os olhos com colírio para que vejas”. - (Ap. 3:18).
O Mestre foi pobre. Os Seus discípulos foram pobres e instados a vender o que tinham, se o tivessem, e a dar aos pobres. Os Seus apóstolos nunca foram homens de sucesso financeiro ou de prosperidade material. Se de fato alguns foram sócios de uma suposta “indústria de pesca”, isto culminou numa liquidação de negócios conforme o que o Senhor lhes ordenara. Viveram pobres, morreram pobres. O cristianismo (de Jesus) veio mudar toda a concepção de ostentação terrestre, que sempre foi buscada pelos judeus.
Jesus não veio para ab-rogar a Lei; veio para cumpri-la. Porém isso não implica em que Ele agora imputasse ao povo judeu uma prosperidade. Mais tarde, na devida época do plano de Deus, no Milênio, Ele terá o reino deste mundo e Israel será a cabeça das nações. “Agora - disse Ele a Pôncio Pilatos - o meu reino não é deste mundo”. Reinaremos, no futuro, com Ele. A Igreja, glorificada, estará juntamente com Israel em posição de honra, em posição de destaque. O Apocalípse revela a atuação, naquela época, de doze anciãos representativos da nação de Israel e doze apóstolos, representativos da Igreja. - Ap. 11:16.
A Doutrina da Prosperidade é incitante, conveniente, porque vai aos anseios humanos, lógicos, comuns de todos os filhos de Adão. Mas os ensinos do Senhor Jesus, o Homem de Nazaré, foram revolucionários, não só aos judeus, mas a toda a lógica humana
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A cruz de Cristo é escândalo.
A cruz de Cristo é loucura:
Aos pobres é pregado o Evangelho... (E não é para que sejam mais ricos nesta vida - tal doutrina é dos nossos dias - os apóstolos não pregaram assim). Qualquer líder incita os seus liderados ao domínio, a força, a riqueza, a toda suficiência, a vingança (justiça, na terminologia do judaísmo). Jesus, entretanto, humildemente nascido numa manjedoura e em família de carpinteiro, montado num jumentinho, é introduzido na cidade (que será santa), como Rei.
Humildade é Sua tônica.
Renúncia é Seu lema.
Submissão é Seu exemplo.
Onde a prosperidade material?
“O filho do homem não tem onde reclinar a Sua cabeça” - Mt. 8:20. - Se foi assim com o Mestre, como será com os Seus discípulos? - A herança que Ele nos legou é a vida eterna. Ninguém consegue ter riquezas, sem confiar nelas. E dificilmente entrarão no reino do céu aqueles que confiam nas riquezas.
Onde estava a prosperidade dos discípulos quando tiveram que pagar o tributo? - Nenhum deles tinha bolsa ou alforge, sequer. Foi necessário ao Senhor operar um milagre para saldar o compromisso deles. Segure-se bem, leitor amigo; respire fundo e então leia com atenção:
“A vida de um homem não consiste na abundância dos bens que ele possui” - Lc. 12:15.
Todos os apóstolos morreram martirizados (assassinados).
Renunciaram a tudo, até a própria vida!...
Onde a prosperidade material? - Onde o sucesso humano?
A ostentação religiosa teve início na história na época de Constantino, imperador romano do Oriente que propiciou, de maneira indireta, a união da Igreja com o Estado e que, nos nossos dias, essa igreja é detentora de uma das maiores fortunas do mundo em ouro, prata, relíquias, objetos de arte e até de um poderoso Banco que (supõe-se) teria financiado a Adolfo Hitler, em detrimento dos judeus, o capital para a realização da segunda guerra mundial.
Ser cristão tornou-se título de honra, já que o Estado agora era cristão e o Imperador supostamente também o era. Os templos eram construídos como verdadeiros monumentos e a nobreza tomava assento nos seus primeiros bancos. O dízimo desses nobres abarrotava ainda mais os cofres, sendo-lhes cobradas indulgências e exigida recompensa monetária pelas bênçãos que recebessem...
A história se repete: O século vinte e um, o terceiro milênio, começa a reproduzir o que escandalizou os mais sinceros servos de Deus no passado. A prática da religião começa a se confundir com prosperidade material, privilégios temporais, altas posições, carros de luxo... O joio se mistura ao trigo. Ressurge a filosofia judaica da herança de Deus em bens materiais. "Se os cristãos são filhos de Abraão (pela fé) por que então não lhe serem herdeiros do direito de riquezas e bens temporais? Não daria Deus aos Seus filhos o direito de gozar dos bens desta vida? Por que teríamos que ser pobres, fracos, necessitados? O mundo jaz no maligno; ele é seu príncipe e dominador; é o deus deste século... Mas não vencemos o maligno?..." - E aqui entra o refrão preferido: “Vamos saquear o inferno”...
Judaísmo nunca foi sinônimo de humildade. E aos líderes de grandes movimentos religiosos, de grandes igrejas, nunca interessou pobreza, abstinência, humildade. São estes os que procuram improvisar, harmonizar os ensinos do cristianismo adaptando-os a uma situação mais cômoda, mais ao gosto dos incautos, uma filosofia de prosperidade cristã, nem que para isso tenham de se reportar a Velha Aliança, ao judaísmo ou a um cristianismo que só a “Igreja da Maioria” assumiu.
Instiga-se a idéia de que ser cristão fiel seja sinônimo de ser próspero, abastado, realizado. Nomes, e mais nomes aqui citaríamos, de líderes evangélicos brasileiros do passado, pioneiros, alguns, cuja única fortuna foram os bens espirituais e o exemplo de abnegação à causa a que se entregaram. Partiram em modéstia, seguindo-lhes apenas as suas obras e deixando-nos (a nós discípulos que fomos deles) apenas o exemplo de fidelidade a chamada recebida do Senhor. Teriam então eles sido exemplo de cristãos que não tiveram fé suficiente para terem sido prósperos nos seus bens materiais e, ainda o que é pior, não ensinarem aos seus contemporâneos os segredos de uma vida farta e de prosperidade material?
A verdade choca.
Nada se pode contra a verdade, senão pela verdade.
Maior que os argumentos, é a prática.
Mais valem fatos do que argumentos.
Numa cristandade dos nossos dias, composta de milhões de fiéis, é claro que alguns testemunhos de prosperidade material podem se apresentar. É do plano de Deus tornar (até como exceção de padrões da Nova Aliança) alguns dos Seus, prósperos, ricos, abastados. Milagre se define suspensão das leis naturais.
Mas daí, ao desejarmos fazer disso um padrão, uma proposta a todos os fiéis, não nos parece sensato. É claro que nos dias apostólicos alguns foram prósperos tais como Filemon. Esses exemplos neo-testamentarios, porém, são escassos.
“Se alguém ensina alguma outra doutrina e não se conforma com as sãs palavras de nosso Senhor Jesus Cristo e com a doutrina que é segundo a piedade (eusebeia = devoção) é soberbo e nada sabe, mas delira acerca de questões e contendas de palavras, das quais nascem invejas, porfias, blasfêmias, ruins suspeitas, contendas de homens corruptos de entendimento e privados da verdade, cuidando que a piedade (devoção) seja causa de ganho. Aparta-te dos tais."
"Mas é grande ganho a piedade (devoção) com contentamento. Porque nada trouxemos para este mundo e manifesto é que nada podemos levar dele. Tendo porem sustento e com que nos cobrirmos, estejamos com isto contentes. Mas os que querem ser ricos caem em tentação, e em laço, e em muitas concupiscências (epithymias = desejos fortes) loucas e nocivas, que submergem os homens na perdição e na ruína."
"Porque o amor do dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé e se traspassaram a si mesmos com muitas dores. Mas tu, ó homem de Deus, foge destas coisas e segue a justiça, a piedade (devoção) a fé, a caridade, a paciência, a mansidão. Milita a boa milícia da fé, toma posse da vida eterna, para a qual também foste chamado, tendo já feito boa confissão diante de muitas testemunhas”. - (I Tm. 6:3-12).
Pedro e Tiago, também escreveram preceitos aos irmãos que têm bens desta vida - como uma exceção - repetimos. É comum ao ser humano, quando em apuros, recorrer ao que lhe vem à mão. Nesse estado, algumas pessoas insufladas pela Doutrina da Prosperidade têm doado propriedades, sítios, terrenos, casas, relógios e muito mais, numa espécie de barganha proposta para Deus, visando sempre levar vantagem, na esperança de que Deus lhes devolverá cem vezes tanto. Tendo trazido os seus bens à “casa do tesouro” ficam esperando que do céu lhes advenha maior abastança...
Mas estamos na Dispensação da Graça, em que recebemos todas as coisas de Deus por graça e não por recompensa, sem preço, mérito ou esforço, dependendo fundamentalmente da Sua vontade, do Seu querer o abençoar-nos. Nesta dispensação, só há um sacrifício:
C R I S T O
Porém, o caminho de Caim, filho de Adão, ser humano decaído, é o caminho do esforço próprio, da oferta própria, do sacrifício; o caminho do EU. É a oferta que Deus não pediu. A Doutrina da Prosperidade reforça essa filosofia. Leva-nos a entender que se quisermos Deus sempre quererá. Induz-nos a acreditar que as rédeas de nossas vidas, as rédeas da vontade de Deus, e nossa, estão conosco. Nós é que manobraríamos as coisas nos céus e na terra (e sabem-se lá onde mais). Seríamos super-homens, se tivéssemos fé. Seríamos soberanos, alicerçados em nosso livre arbítrio...
Não gosto muito dessa argumentação negativa, dessa tônica de usar o exemplo daquilo que não é para demonstrar o que de fato é. Mas acredito que o leitor que conseguiu me acompanhar até aqui em meu raciocínio, entende que não é lógica e nem neo-testamentária a
“Doutrina da Prosperidade Cristã”.
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(Extraído do livro "Considerações à Doutrina da Prosperidade" - Autor: Pr., Th. D. Honoris Teologia, Serafim Isidoro, que oferece seus livros, apostilas e aulas do grego koinê. E-mail:
serafimprdr@ig.com.br