Tudo passa! (Panta Réi)
TUDO PASSA!
Os bregas consagraram uma música, em que o baixinho Nelson Ned abria o peito, cantando “mas tudo passa, tudo passará, e nada fica, nada ficará...”. Depois veio Lulu Santos, mais eclético e com um toque refinado de filosofia estóica que encantou a minha geração com o “nada do que for será, de novo do jeito que já foi um dia, tudo passa, tudo sempre passará...”.
Toda essa filosofia da mudança se baseia na frase grega Panta Réi, onde panta é tudo, e réi, corre, passa, se esvai. Os filósofos estóicos, a partir de Heráclito de Éfeso (séc. V a.C.), foram os primeiros a afirmar que tudo passa. A expressão Panta Rei surge da noção de que no contexto da natureza e da vida humana tudo é transitório, passageiro. Para ilustrar essa afirmação, Heráclito usava a metáfora do rio: Não é possível banhar-se no mesmo rio duas vezes. Afinal, as águas que correm no rio nunca são as mesmas, afinal, tudo passa; nada permanece (oudén méne). No dia seguinte, embora o mesmo local geográfico, pela passagem das águas, o rio já é outro. Trata-se de um “vir-a-ser”.
Quanto às mudanças e transformações físicas, o vir-a-ser, que a todo instante vemos ocorrer no mundo, a filosofia explicava como sendo uma mistura participativa de ser e não-ser. Ao vir-a-ser é necessário tanto o ser quanto o não-ser. Se eles agem conjuntamente, então resulta um vir-a-ser, onde este se torna uma ilusão sensível. Isto quer dizer que todas as percepções de nossos sentidos apenas criam ilusões, nas quais temos a tendência de pensar que o não-ser é, e que o ser é um vir-a-ser.
Pois o vir-a-ser tem o nome de devir, que é o conceito filosófico que se traduz-se de forma mais literal na eterna mudança do ontem ser diferente do hoje, nas palavras de Heráclito “O mesmo homem não pode atravessar o mesmo rio, porque o homem de ontem não é o mesmo homem, nem o rio de ontem é o mesmo do hoje”.
Fazer filosofia é aprender a pensar. O filósofo, mais do que alguém que ama (philo) a sabedoria (sophia) é alguém que pensa e transmite idéias... Nossas vidas estão impregnadas de Panta Rei. Nossos corpos mudam, nossas idéias mudam, nossos empregos mudam… enfim, nunca atravessamos o mesmo rio da existência duas vezes: “a vida vem em ondas, como o mar, num indo-e-vindo infinito...”.
Por vezes nos sentimos tentados a “congelar” o rio, para que suas águas sejam sempre as mesmas. Entretanto, um belo dia o rio, que tem vontade própria, descongela e a força de suas águas traz toda a força das mudanças reprimidas… e ai surtamos! Ou não! Cabe a cada um lidar com o seu rio. “tudo o que se vê não é, igual ao que a gente viu a um segundo, tudo muda o tempo todo, no mundo...”
Na natureza, rios, mares e florestas... tudo passa. A devastação causada pelo homem, o plantio inadequado, o desmatamento, os crimes contra a natureza, tudo acelera a “passagem” das coisas da vida. Além disto, vale lembrar que Deus perdoa. a natureza não!
Tudo passa? Eu acho que sim! Aliás, segundo São Paulo, só tem uma coisa que não passa? O amor.
(Filósofo e escritor)