Dispensa e Inexigibilidade de Licitação e a Moralidade Administrativa: O ordenamento jurídico brasileiro consagrou a licitação como regra para contratação, por parte da Administração direta ou indireta, de particulares. Assim, é de se concluir que, em se tratando de contrato administrativo, a dispensa deve ser a exceção, ocorrendo apenas nos restritos casos autorizados pela lei. A supremacia do interesse público fundamenta a exigência, como regra geral, de licitação para contratações da Administração Pública. No entanto, existem hipóteses em que a licitação formal seria impossível ou frustraria a própria consecução dos interesses públicos. (...). Por isso, autoriza-se a Administração a adotar outro procedimento, em que formalidades são suprimidas ou substituídas por outras.
O presente texto tem como escopo analisar a contratação direta pela Administração Pública à luz dos princípios norteadores do Direito Administrativo, principalmente nos casos da contratação direta. Para tanto, foi feita pesquisa bibliográfica, analisando-se as principais obras a respeito do tema, chegando-se a conclusão de que, a administração deve sempre ter em mente a proteção dos interesses da coletividade em detrimento de interesse escusos e particulares.
Princípios da Licitação - Gerais e Específicos: O Direito Administrativo é um ramo particularmente repleto de princípios, pois a proteção dos interesses da coletividade deve estar sempre norteando as atitudes da administração, em geral, e do administrador, em particular. Segundo o dicionário, princípio é o momento em que alguma coisa tem origem; causa primária; teoria; preceito. O vocábulo princípio, na linguagem corrente, tem o sentido de aquilo que vem antes de outro, origem, começo, momento em que se faz uma coisa pela primeira vez. Princípio contrapõe-se a fim, assinalando marco inicial, no tempo e no espaço estudar os princípios de uma ciência é conhecer a fundo a base da própria ciência, sua formação e sua evolução. Os princípios aplicados às licitações são reflexos dos princípios do Direito Administrativo, essencialmente normatizado em sua estrutura. Ao selecionar particulares para prestação de serviços, a administração não pode nunca se escusar da observação desses princípios, seja por questão de moralidade, seja por questão de legalidade, pois os princípios das licitações, mais que uma questão moral é uma questão legal. A Constituição Brasileira consagrou alguns princípios norteadores da administração pública quando, em seu art. 37, caput, assim dispõe: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:” Além disso, o art. 3o da Lei 8.666/93, que regula as licitações e contratos administrativos, traz uma gama de princípios a serem seguidos pela Administração na consecução da probidade administrativa, sendo considerado o dispositivo de maior destaque na Lei. “Art. 3o. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos.”
A própria licitação constitui um princípio a que se vincula a Administração Pública. Ela é decorrência do princípio da indisponibilidade do interesse público e que se constitui em uma restrição à liberdade administrativa na escolha do contratante; a Administração terá que escolher aquele cuja proposta melhor atenda ao interesse público.
Princípio da Supremacia e Indisponibilidade do Interesse Público: Embora não esteja expressamente disposto na Lei de Licitações, o princípio da supremacia do interesse público sobre os interesses particulares está implícito nas próprias regras do Direito Administrativo configura-se, como um dos princípios de observância obrigatória pela Administração Pública. Ao deixar de tutelar apenas os direitos individuais e passar a se preocupar com interesses da sociedade, a Administração deve sempre ser norteada por aquele princípio. Intimamente ligado ao princípio da supremacia encontra-se o da indisponibilidade do interesse público. Ao administrador é dada a tarefa de zelar pelos interesses da coletividade. Assim, esse gerenciador não pode dispor daqueles interesses em detrimento da proteção aos dos particulares.
A indisponibilidade dos interesses públicos significa que sendo interesses qualificados como próprios da coletividade internos ao setor público não se encontram à disposição de quem quer que seja, no sentido de que lhe incumbe apenas curá-los o que é também um dever na estrita conformidade do que predispuser a intentio legis.
Princípio da Legalidade: À Administração só é dado o direito de agir de acordo com o determinado pela lei. Este é o principal corolário do princípio da legalidade e constitui um das principais garantias de respeito aos direitos individuais. Dessa forma, por mais simples que seja o ato que venha praticar a Administração, este deve está baseado e protegido por uma norma (lato sensu), caso contrário não terá eficácia.
Princípio da Moralidade: Esse princípio, expressamente representado tanto na Constituição Federal quanto na lei no 8.666/93, é alvo de crítica por parte da doutrina. Alguns doutrinadores não o reconhecem, por ser um princípio vago e impreciso, ou que acaba por ser absorvido pelo próprio conceito de legalidade. O princípio da moralidade se constitui em importante norte para o Administrador Público, pois a administração não pode tomar postura que desabone a boa conduta de seus atos. A boa-fé deve consubstanciar os atos praticados pelo Administrador. O princípio deve ser observado não apenas pelo administrador, mas também pelo particular que se relaciona com a Administração Pública. Aliais, é tão clara essa separação entre legalidade e moralidade que, sendo o ato atentatório aos princípios da moralidade, mesmo que esteja revestido de legalidade, este não deve ser tomado pela Administração, pois a moralidade seria pressuposto de validade do ato. Nesse diapasão, é a lição dos grandes doutrinadores do Direito Administrativo.
Princípios da Impessoalidade e da Igualdade: A impessoalidade dos atos administrativos é pressuposto da supremacia do interesse público. Quebrada a isonomia no tratamento com os particulares, o administrador deixa de observar o interesse da coletividade, bem maior e objeto principal do Direito Administrativo.
O princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37, caput), nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal. Intimamente ligado ao princípio da impessoalidade encontra-se o da igualdade. Tal preceito, insculpido no preâmbulo da Carta Política de 1988, determina a competição entre os licitantes de forma igualitária. Sendo que à Administração Pública cabe tratar todos os administrados de forma a impedir favoritismos. Considerando as licitações, esse princípio obriga à Administração tratar todos os licitantes de forma isonômica, preservando as diferenças existentes em cada um deles.
Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade: Pelo princípio da razoabilidade, a Administração, no uso da discricionariedade, deverá obedecer a critérios aceitáveis na prática de seus atos. A respeito dessa liberalidade do administrador público, não significa, como é evidente, que lhe seja outorgado o poder de agir ao saber exclusivo de seu líbito, de seus humores, paixões pessoais, excentricidade ou critérios personalíssimos e muito menos significa que liberou a Administração para manipular a regra de direito de maneira a sacar dela efeitos não pretendidos nem assumidos pela lei aplicada. Ou seja, se um ato for praticado sem a devida prudência e sensatez necessárias ao administrador, aquele será perfeitamente invalidável, visto ser eivado de nulidade. Quanto ao segundo princípio, preceitua que as competências administrativas somente poderão tornar-se válidas quando exercidas na extensão e intensidade proporcionais ao que seja realmente demandado para cumprimento da finalidade de interesse público a que estão atreladas. O princípio da proporcionalidade constitui um dos aspectos contidos no da razoabilidade. Este preceito entre outras coisas exige proporcionalidade entre os meios de que se utiliza a Administração e os fins que ela tem que alcançar. Assim, o princípio da proporcionalidade não é senão uma faceta do princípio da proporcionalidade.
Princípios da Motivação e da Publicidade: O princípio da motivação determina que a Administração Pública exponha os fundamentos de fato e de direito de suas decisões. Somente através dos atos motivados é que se pode verificar se as condutas administrativas estão atendendo aos princípios informadores da legalidade, finalidade, razoabilidade e proporcionalidade. Apesar de não estar expressamente contido no artigo 37 da Constituição Federal, foi abarcado pela lei 8.666/93. Com relação à publicidade, seu fim é permitir, além da participação de todos os interessados, que se fiscalizem os atos de licitação. Qualquer cidadão pode denunciar irregularidades e pedir instauração de investigações administrativas no sentido de apurar se a atividade licitatória está de acordo com a Lei. Ela é obrigatória como meio conferido de eficácia da atividade administrativa. O artigo 7º, § 8º, da Lei de Licitações, garante a qualquer cidadão ter acesso ao procedimento licitatório para tomar conhecimento dos quantitativos das compras e/ou serviços bem como de seus preços. Assim, não há licitação sigilosa (Lei 8.666/93, artigos 3º, § 3º, e 43, § 1º).
Princípios da Economicidade e Eficiência: Sendo o fim da licitação a escolha da proposta mais vantajosa, deve o administrador estar incumbido de honestidade ao cuidar coisa pública, não despendendo, ao seu talante, recursos desnecessários. Relaciona-se com o princípio da moralidade bem como com o da eficiência, este inserido no texto constitucional pela Emenda n.º 19/98. No tocante ao princípio da economicidade não basta honestidade e boas intenções para validação de atos administrativos. A economicidade impõe adoção da solução mais conveniente e eficiente sob o ponto de vista da gestão dos recursos públicos.
Como exposto, o princípio da eficiência foi recentemente introduzido em nosso texto constitucional, tendo influência direta sobre os casos de contratação direta, objeto do estudo. Assim resumindo o entendimento: O dever de eficiência é o que se impõe a todo o agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com a legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.
Princípios da Probidade Administrativa, da Vinculação ao Instrumento Convocatório e do Julgamento Objetivo: Sendo o primeiro dos princípios expressos na Lei n.º 8.666/93, a probidade administrativa consiste na honestidade de proceder ou na maneira criteriosa de cumprir todos os deveres que são atribuídos ou acometidos ao administrador por força de lei. É diretamente derivado do princípio da moralidade. A moralidade e a probidade administrativa são princípios de conteúdo inespecífico, que não podem ser explicados de modo exaustivo. A explicitação, nesse ponto, será sempre aproximativa. Extrai-se a intenção legislativa de que a licitação seja norteada pela honestidade e seriedade. Exige-se a preservação do interesse público acima do egoístico interesse dos participantes da licitação ou da mera obtenção de vantagens econômicas para a própria administração. Quanto à vinculação ao edital (ou convite), este constitui a lei interna da licitação e, por isso, vincula aos seus termos tanto a Administração como os particulares. Trata-se de princípio essencial cuja inobservância enseja nulidade do procedimento. Nem se compreenderia que a Administração fixasse no edital a forma e o modo de participação dos licitantes e no decorrer do procedimento ou na realização do julgamento se afastasse do estabelecido, ou admitisse documentação e propostas em desacordo com o solicitado.
Serão apenas admitidas as diferenciações já estabelecidas no edital, que são aquelas necessárias à seleção das qualidades subjetivas e objetivas consideradas ao atendimento do interesse público. O princípio do julgamento objetivo é decorrência lógica do anterior. Impõe-se que a análise das propostas se faça com base no critério indicado no ato convocatório e nos termos específicos das mesmas. Por esse princípio, obriga-se a Administração a se ater ao critério fixado no ato de convocação, evitando o subjetivismo no julgamento. Está substancialmente reafirmado nos arts. 44 e 45 do Estatuto Federal Licitatório, que assim determinam:
Art. 44. No julgamento das propostas, a Comissão levará em consideração os critérios objetivos definidos no edital ou no convite, os quais não devem contrariar as normas e princípios estabelecidos por esta Lei. Art. 45. O julgamento das propostas será objetivo, devendo a Comissão de licitação ou o responsável pelo convite realizá-lo em conformidade com os tipos de licitação, os critérios previamente estabelecidos no ato convocatório e de acordo com os fatores exclusivamente nele referidos, de maneira a possibilitar sua aferição pelos licitantes e pelo órgão de controle. O que se almeja é impedir que a licitação seja decidida sob o influxo do subjetivismo, de sentimentos, impressões ou propósitos pessoais dos membros da comissão julgadora.
Dispensa de Licitação: Dispensa, juntamente com inexigibilidade, são formas anômalas de contratação por parte da Administração. Por isso, devem ser tidas como exceções a serem utilizadas somente nos casos imprescindíveis.
Sem entrar no mérito das discussões quantas licitações dispensadas e dispensáveis, pois não é objeto do estudo em comento, a lei no 8.666/93 aumentou de forma considerável o leque de possibilidades de se dispensar o procedimento licitatório. A dispensa de licitação verifica-se em situações em que, embora viável competição entre particulares, a licitação afigura-se inconveniente ao interesse público. Muitas vezes, sabe-se de antemão que a relação custo-benefício será desequilibrada. Os custos necessários à licitação ultrapassarão benefícios que dela poderão advir. A dispensa é figura que isenta a Administração do regular procedimento licitatório, apesar de no campo fático ser viável a competição, pela exigência de vários particulares que poderiam oferta o bem ou serviço. É de se inferir das transcrições acima que a dispensa de licitação, prevista tanto no art. 17 quanto no art.24 da Lei 8.666/93, só devemos ocorrer por razões de interesse público. Obviamente, nesses casos, a realização da licitação viria tão somente sacrificar o interesse público, motivo pelo qual o legislador concedeu ao administrador a faculdade de dispensar o certame nos casos expressamente previstos.
A grande crítica que se faz ao instituto da dispensa de licitação é o fato da lei ter dado grande poder discricionário aos Administradores. Essa discricionariedade, muitas vezes, pode criar um poder usado por aqueles para prejudicar o interesse da administração, preterindo certas empresas apadrinhadas, em detrimento das demais. Agindo dessa forma, o Administrador vai de encontro aos princípios básicos das Licitações e do próprio Direito Administrativo, tornando todos os seus atos nulos de pleno direito. Por isso, a dispensa de licitação só deve acontecer em estrita observância aos casos nomeados nos vinte e quatro incisos do art. 24 do Estatuto Licitatório. Mesmo quando houver dúvida a respeito da exigência ou não da licitação, deve-se realizar o certame.
Inexigibilidade de licitação: Como exposto anteriormente, a Lei de Licitações permite, como ressalva à obrigação de licitar, a contratação direta através de processos de dispensa e inexigibilidade de licitação, desde que preenchidos os requisitos previstos na lei. A inexigibilidade difere da dispensa, visto que nesta a licitação é possível, viável, e apenas não se realiza por conveniência administrativa; naquela o certame queda-se impossível por impedimento relativo ao bem que se deseja adquirir, à pessoa que se quer contratar ou com quem se quer contratar. Torna-se inviável a contenda, tendo em vista que um dos competidores reúne qualidades exclusivas, tolhendo os demais pretensos participante. Outra distinção reside no fato de, no caso de dispensa, o legislador estabeleceu um rol taxativo de situações em que seria possível contratar, enquanto que, na inexigibilidade, o rol é meramente exemplificativo, bastando que reste configurada a inviabilidade de competição, verificada no caso concreto, mas sempre com o amparo na lei. Não caracteriza um ato de mera discricionariedade, mas vinculado e motivado, o que torna o poder do administrador por demais limitado. Entretanto, não é isto que vemos na prática! Dentre o rol exemplificativo do art. 25 do Estatuto das Licitações, o caso mais utilizado pela Administração está inserto no seu inciso I, in verbis: Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: Para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência por marca devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes.
Entretanto, o dispositivo em estudo relaciona alguns requisitos que devem ser necessariamente obedecidos a fim de que se alcance a inviabilidade de competição. O primeiro a ser obedecido é a comprovação da exclusividade. O segundo é a vedação à preferência de marca, proibindo a indicação injustificada de uma específica, nos casos em que houver pluralidade de marcas que atendam plenamente aos interesses da Administração.
Não sabemos por que, se por displicência ou de propósito, em alguns certames, os produtos a serem cotados pelos licitantes são expostos de modo detalhado e minucioso, o que restringe a concorrência, ficando claramente direcionado a uma empresa ou indústria. Muitas vezes, a Administração se utiliza erroneamente desta norma legal, posto que a contratação direta para enquadrar-se neste dispositivo deve se referir a uma compra e não uma prestação de serviços, e necessita ter a comprovação da exclusividade através de uma declaração emitida pelos órgãos competentes.
É por demais importantes salientar que existem hipóteses que não se enquadram em nenhum dos incisos do mencionado art. 25, mas que estão perfeitamente incluídas em seu caput, em face de comprovada inviabilidade de competição. Alguns exemplos de situações não exemplificadas, quais sejam: Aquisição de vale transporte para servidores públicos, posto que há legislação concedendo o benefício; cursos de treinamento/aperfeiçoamento, considerando serem eventos realizados em datas pré-determinadas, o que inviabiliza a competição; atividades em regime de monopólio, como correios; entre outros.
Afora a hipótese expressa no inciso I, art. 25, teceremos algumas explanações a respeito dos incisos II e III do mesmo artigo. O primeiro deles trata das contratações de serviços técnicos enumerados no art. 13 da Lei 8.666/93, de natureza singular, como profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação. Já o segundo, diz respeito às contratações de profissionais do setor artístico.
Sobre a singularidade do objeto, requisito presente em todas as situações de inexigibilidade de licitação, embora a expressão esteja presente apenas no inciso II, o que o torna peculiar são as necessidades da Administração no momento da contratação. A natureza singular do serviço é entendida como aquele que é portador de tal complexidade que o individualiza, tornando-o diferente dos da mesma espécie, e que exige, para a sua execução, um profissional ou empresa de especial qualificação.
No referente aos trabalhos artísticos, a Lei de Licitações, em seu art. 25, inciso III, equipara-os a serviços técnicos especializados, prescrevendo-os como inexigíveis de licitação, desde que o mesmo seja consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. Assim o valor do contrato sofre variação de acordo com a crítica: se local, o limite de carta convite; se regional, tomada de preços; se nacional, será o da concorrência. Essa é uma construção doutrinária, tendo em vista a falta de clareza no texto do referente inciso.
Contratação Direta e a Moralidade Administrativa: A nossa Carta Política de 1988 incluiu, dentre os princípios básicos e orientadores da Administração Pública, o princípio da moralidade, que tem como significado a necessidade do administrador observar os preceitos éticos em sua atuação dentro da Administração. O cumprimento da moralidade, além de constituir um dever do dirigente, apresenta-se como um direito subjetivo de cada administrado. O agente público, ao exercitar a atividade administrativa, está fazendo uso de uma parcela das atribuições que lhe fora outorgada pelo Estado. Desempenha, assim, de modo legítimo, uma capacidade de administração que tem na lei seus limites definidos.
Lamentavelmente, algumas formas de desvio de finalidade, no que se refere às contratações diretas, seja por dispensa ou inexigibilidade de licitação, desenham materialmente uma aparência de legalidade, de modo que, mesmo sendo pressentidas, sentidas, ou até mesmo conhecidas, afigura-se difícil exibir a contraprova da legalidade aparente. É realmente difícil ultrapassar essa penumbra. A dificuldade maior encontra-se na prova, quase impossível em algumas situações relevante na constatação do desvio de finalidade, principalmente: Quando se sabe quão difícil é encontrar prova, absolutamente irrefutável, que comprometa o editor do ato, autoridade administrativa, regra geral, esclarecida, astuta para incriminar-se, deixando vestígios, mesmo leves, de sua intenção distorcida.
Essa é a razão por que, sem a efetiva prova do desvio praticado, a esperança deve alojar-se na mudança de mentalidade e na convicção sobre o que seja realmente bem comum e interesse público. Como bem expressa o doutrinador italiano, Jean Rivero, violar a moralidade e a finalidade administrativas, é violar o próprio fim legal.
Verifica-se que em muitos casos nos quais o administrador vê configurada a inexigibilidade de licitação, deixa-se de observar o que dispõe o art. 25, § 2º da lei 8.666/93, no que se refere ao superfaturamento. Nestas situações, tanto o agente público quanto o fornecedor poderão ser responsabilizados pelos danos à Fazenda Pública. É por esse motivo que o art. 26 exige, de forma expressa, em seu inciso III, que haja justificativa em relação ao valor do contrato.
Infelizmente, alguns administradores ainda não tomaram consciência da necessidade de bem dispor do erário, sendo o superfaturamento uma prática constante, conforme se observa em denúncias diárias veiculadas na imprensa. Superfaturamento também pode ser interpretado como elevação arbitrária do valor do contrato, tendo em vista os valores praticados pelo próprio contratado em negociações com terceiros. No entanto, nem sempre contratação direta é sinônimo de superfaturamento. Somente se caracteriza a reprovabilidade quando ocorrer uma elevação arbitrária de preços, retratando o aproveitamento da oportunidade propiciada pela contratação direta. Tendo como exemplo dessa prática por demais utilizadas nas Administrações Públicas, em especial a Municipal, é comum a decretação de estado de calamidade com o fito de contratação direta de empresas, muitas delas de fachada, aproveitando-se da lacuna deixada pela legislação.
Por fim, o dirigente público deve sempre atentar para o que dispõe a lei, que tem como regra geral a obrigação de licitar. Nesse diapasão, havendo a necessidade de dispensa ou inexigibilidade, se faz necessário que sua conduta siga as diretrizes legais e morais que regulam a atividade pública, pois, a ética no âmbito da administração não pode permitir que pessoas inescrupulosas utilizem o poder público para usufruir vantagens obtidas ilicitamente.
Considerações: Finalmente, restou evidenciada a importância do procedimento licitatório para a Administração Pública, como uma forma de controlar as atividades do Administrador na gerência dos recursos públicos, sempre tendo em mente os princípios imperiosos na atividade administrativa, quais sejam: o da legalidade, moralidade, publicidade etc.
O Administrador deve ter muita cautela ao dispensar ou tornar inexigível uma licitação, haja visto os limites impostos para tal discricionariedade, podendo o mesmo ser punido, não somente quando contratar diretamente, mas também quando deixar de observar as formalidade exigíveis para tais processos.
É de observar que no momento pelo qual uma das preocupações governamentais é a reforma do Estado e o repensar do papel a serem desempenhados na sociedade moderna, muitos dos administradores, na gerência do erário, usurpam desse poder, utilizando-se de artifícios e “brechas” na legislação, especialmente no que se refere às contratações diretas, visando interesses próprios ou de terceiros.
Por fim, não basta que o administrador se atenha ao estrito cumprimento da lei; os exercícios de seus direitos, poderes e faculdades devem ser informados por princípios éticos, devendo fazer-se, de modo regular, sem abuso.
O presente texto tem como escopo analisar a contratação direta pela Administração Pública à luz dos princípios norteadores do Direito Administrativo, principalmente nos casos da contratação direta. Para tanto, foi feita pesquisa bibliográfica, analisando-se as principais obras a respeito do tema, chegando-se a conclusão de que, a administração deve sempre ter em mente a proteção dos interesses da coletividade em detrimento de interesse escusos e particulares.
Princípios da Licitação - Gerais e Específicos: O Direito Administrativo é um ramo particularmente repleto de princípios, pois a proteção dos interesses da coletividade deve estar sempre norteando as atitudes da administração, em geral, e do administrador, em particular. Segundo o dicionário, princípio é o momento em que alguma coisa tem origem; causa primária; teoria; preceito. O vocábulo princípio, na linguagem corrente, tem o sentido de aquilo que vem antes de outro, origem, começo, momento em que se faz uma coisa pela primeira vez. Princípio contrapõe-se a fim, assinalando marco inicial, no tempo e no espaço estudar os princípios de uma ciência é conhecer a fundo a base da própria ciência, sua formação e sua evolução. Os princípios aplicados às licitações são reflexos dos princípios do Direito Administrativo, essencialmente normatizado em sua estrutura. Ao selecionar particulares para prestação de serviços, a administração não pode nunca se escusar da observação desses princípios, seja por questão de moralidade, seja por questão de legalidade, pois os princípios das licitações, mais que uma questão moral é uma questão legal. A Constituição Brasileira consagrou alguns princípios norteadores da administração pública quando, em seu art. 37, caput, assim dispõe: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:” Além disso, o art. 3o da Lei 8.666/93, que regula as licitações e contratos administrativos, traz uma gama de princípios a serem seguidos pela Administração na consecução da probidade administrativa, sendo considerado o dispositivo de maior destaque na Lei. “Art. 3o. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos.”
A própria licitação constitui um princípio a que se vincula a Administração Pública. Ela é decorrência do princípio da indisponibilidade do interesse público e que se constitui em uma restrição à liberdade administrativa na escolha do contratante; a Administração terá que escolher aquele cuja proposta melhor atenda ao interesse público.
Princípio da Supremacia e Indisponibilidade do Interesse Público: Embora não esteja expressamente disposto na Lei de Licitações, o princípio da supremacia do interesse público sobre os interesses particulares está implícito nas próprias regras do Direito Administrativo configura-se, como um dos princípios de observância obrigatória pela Administração Pública. Ao deixar de tutelar apenas os direitos individuais e passar a se preocupar com interesses da sociedade, a Administração deve sempre ser norteada por aquele princípio. Intimamente ligado ao princípio da supremacia encontra-se o da indisponibilidade do interesse público. Ao administrador é dada a tarefa de zelar pelos interesses da coletividade. Assim, esse gerenciador não pode dispor daqueles interesses em detrimento da proteção aos dos particulares.
A indisponibilidade dos interesses públicos significa que sendo interesses qualificados como próprios da coletividade internos ao setor público não se encontram à disposição de quem quer que seja, no sentido de que lhe incumbe apenas curá-los o que é também um dever na estrita conformidade do que predispuser a intentio legis.
Princípio da Legalidade: À Administração só é dado o direito de agir de acordo com o determinado pela lei. Este é o principal corolário do princípio da legalidade e constitui um das principais garantias de respeito aos direitos individuais. Dessa forma, por mais simples que seja o ato que venha praticar a Administração, este deve está baseado e protegido por uma norma (lato sensu), caso contrário não terá eficácia.
Princípio da Moralidade: Esse princípio, expressamente representado tanto na Constituição Federal quanto na lei no 8.666/93, é alvo de crítica por parte da doutrina. Alguns doutrinadores não o reconhecem, por ser um princípio vago e impreciso, ou que acaba por ser absorvido pelo próprio conceito de legalidade. O princípio da moralidade se constitui em importante norte para o Administrador Público, pois a administração não pode tomar postura que desabone a boa conduta de seus atos. A boa-fé deve consubstanciar os atos praticados pelo Administrador. O princípio deve ser observado não apenas pelo administrador, mas também pelo particular que se relaciona com a Administração Pública. Aliais, é tão clara essa separação entre legalidade e moralidade que, sendo o ato atentatório aos princípios da moralidade, mesmo que esteja revestido de legalidade, este não deve ser tomado pela Administração, pois a moralidade seria pressuposto de validade do ato. Nesse diapasão, é a lição dos grandes doutrinadores do Direito Administrativo.
Princípios da Impessoalidade e da Igualdade: A impessoalidade dos atos administrativos é pressuposto da supremacia do interesse público. Quebrada a isonomia no tratamento com os particulares, o administrador deixa de observar o interesse da coletividade, bem maior e objeto principal do Direito Administrativo.
O princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37, caput), nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal. Intimamente ligado ao princípio da impessoalidade encontra-se o da igualdade. Tal preceito, insculpido no preâmbulo da Carta Política de 1988, determina a competição entre os licitantes de forma igualitária. Sendo que à Administração Pública cabe tratar todos os administrados de forma a impedir favoritismos. Considerando as licitações, esse princípio obriga à Administração tratar todos os licitantes de forma isonômica, preservando as diferenças existentes em cada um deles.
Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade: Pelo princípio da razoabilidade, a Administração, no uso da discricionariedade, deverá obedecer a critérios aceitáveis na prática de seus atos. A respeito dessa liberalidade do administrador público, não significa, como é evidente, que lhe seja outorgado o poder de agir ao saber exclusivo de seu líbito, de seus humores, paixões pessoais, excentricidade ou critérios personalíssimos e muito menos significa que liberou a Administração para manipular a regra de direito de maneira a sacar dela efeitos não pretendidos nem assumidos pela lei aplicada. Ou seja, se um ato for praticado sem a devida prudência e sensatez necessárias ao administrador, aquele será perfeitamente invalidável, visto ser eivado de nulidade. Quanto ao segundo princípio, preceitua que as competências administrativas somente poderão tornar-se válidas quando exercidas na extensão e intensidade proporcionais ao que seja realmente demandado para cumprimento da finalidade de interesse público a que estão atreladas. O princípio da proporcionalidade constitui um dos aspectos contidos no da razoabilidade. Este preceito entre outras coisas exige proporcionalidade entre os meios de que se utiliza a Administração e os fins que ela tem que alcançar. Assim, o princípio da proporcionalidade não é senão uma faceta do princípio da proporcionalidade.
Princípios da Motivação e da Publicidade: O princípio da motivação determina que a Administração Pública exponha os fundamentos de fato e de direito de suas decisões. Somente através dos atos motivados é que se pode verificar se as condutas administrativas estão atendendo aos princípios informadores da legalidade, finalidade, razoabilidade e proporcionalidade. Apesar de não estar expressamente contido no artigo 37 da Constituição Federal, foi abarcado pela lei 8.666/93. Com relação à publicidade, seu fim é permitir, além da participação de todos os interessados, que se fiscalizem os atos de licitação. Qualquer cidadão pode denunciar irregularidades e pedir instauração de investigações administrativas no sentido de apurar se a atividade licitatória está de acordo com a Lei. Ela é obrigatória como meio conferido de eficácia da atividade administrativa. O artigo 7º, § 8º, da Lei de Licitações, garante a qualquer cidadão ter acesso ao procedimento licitatório para tomar conhecimento dos quantitativos das compras e/ou serviços bem como de seus preços. Assim, não há licitação sigilosa (Lei 8.666/93, artigos 3º, § 3º, e 43, § 1º).
Princípios da Economicidade e Eficiência: Sendo o fim da licitação a escolha da proposta mais vantajosa, deve o administrador estar incumbido de honestidade ao cuidar coisa pública, não despendendo, ao seu talante, recursos desnecessários. Relaciona-se com o princípio da moralidade bem como com o da eficiência, este inserido no texto constitucional pela Emenda n.º 19/98. No tocante ao princípio da economicidade não basta honestidade e boas intenções para validação de atos administrativos. A economicidade impõe adoção da solução mais conveniente e eficiente sob o ponto de vista da gestão dos recursos públicos.
Como exposto, o princípio da eficiência foi recentemente introduzido em nosso texto constitucional, tendo influência direta sobre os casos de contratação direta, objeto do estudo. Assim resumindo o entendimento: O dever de eficiência é o que se impõe a todo o agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com a legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.
Princípios da Probidade Administrativa, da Vinculação ao Instrumento Convocatório e do Julgamento Objetivo: Sendo o primeiro dos princípios expressos na Lei n.º 8.666/93, a probidade administrativa consiste na honestidade de proceder ou na maneira criteriosa de cumprir todos os deveres que são atribuídos ou acometidos ao administrador por força de lei. É diretamente derivado do princípio da moralidade. A moralidade e a probidade administrativa são princípios de conteúdo inespecífico, que não podem ser explicados de modo exaustivo. A explicitação, nesse ponto, será sempre aproximativa. Extrai-se a intenção legislativa de que a licitação seja norteada pela honestidade e seriedade. Exige-se a preservação do interesse público acima do egoístico interesse dos participantes da licitação ou da mera obtenção de vantagens econômicas para a própria administração. Quanto à vinculação ao edital (ou convite), este constitui a lei interna da licitação e, por isso, vincula aos seus termos tanto a Administração como os particulares. Trata-se de princípio essencial cuja inobservância enseja nulidade do procedimento. Nem se compreenderia que a Administração fixasse no edital a forma e o modo de participação dos licitantes e no decorrer do procedimento ou na realização do julgamento se afastasse do estabelecido, ou admitisse documentação e propostas em desacordo com o solicitado.
Serão apenas admitidas as diferenciações já estabelecidas no edital, que são aquelas necessárias à seleção das qualidades subjetivas e objetivas consideradas ao atendimento do interesse público. O princípio do julgamento objetivo é decorrência lógica do anterior. Impõe-se que a análise das propostas se faça com base no critério indicado no ato convocatório e nos termos específicos das mesmas. Por esse princípio, obriga-se a Administração a se ater ao critério fixado no ato de convocação, evitando o subjetivismo no julgamento. Está substancialmente reafirmado nos arts. 44 e 45 do Estatuto Federal Licitatório, que assim determinam:
Art. 44. No julgamento das propostas, a Comissão levará em consideração os critérios objetivos definidos no edital ou no convite, os quais não devem contrariar as normas e princípios estabelecidos por esta Lei. Art. 45. O julgamento das propostas será objetivo, devendo a Comissão de licitação ou o responsável pelo convite realizá-lo em conformidade com os tipos de licitação, os critérios previamente estabelecidos no ato convocatório e de acordo com os fatores exclusivamente nele referidos, de maneira a possibilitar sua aferição pelos licitantes e pelo órgão de controle. O que se almeja é impedir que a licitação seja decidida sob o influxo do subjetivismo, de sentimentos, impressões ou propósitos pessoais dos membros da comissão julgadora.
Dispensa de Licitação: Dispensa, juntamente com inexigibilidade, são formas anômalas de contratação por parte da Administração. Por isso, devem ser tidas como exceções a serem utilizadas somente nos casos imprescindíveis.
Sem entrar no mérito das discussões quantas licitações dispensadas e dispensáveis, pois não é objeto do estudo em comento, a lei no 8.666/93 aumentou de forma considerável o leque de possibilidades de se dispensar o procedimento licitatório. A dispensa de licitação verifica-se em situações em que, embora viável competição entre particulares, a licitação afigura-se inconveniente ao interesse público. Muitas vezes, sabe-se de antemão que a relação custo-benefício será desequilibrada. Os custos necessários à licitação ultrapassarão benefícios que dela poderão advir. A dispensa é figura que isenta a Administração do regular procedimento licitatório, apesar de no campo fático ser viável a competição, pela exigência de vários particulares que poderiam oferta o bem ou serviço. É de se inferir das transcrições acima que a dispensa de licitação, prevista tanto no art. 17 quanto no art.24 da Lei 8.666/93, só devemos ocorrer por razões de interesse público. Obviamente, nesses casos, a realização da licitação viria tão somente sacrificar o interesse público, motivo pelo qual o legislador concedeu ao administrador a faculdade de dispensar o certame nos casos expressamente previstos.
A grande crítica que se faz ao instituto da dispensa de licitação é o fato da lei ter dado grande poder discricionário aos Administradores. Essa discricionariedade, muitas vezes, pode criar um poder usado por aqueles para prejudicar o interesse da administração, preterindo certas empresas apadrinhadas, em detrimento das demais. Agindo dessa forma, o Administrador vai de encontro aos princípios básicos das Licitações e do próprio Direito Administrativo, tornando todos os seus atos nulos de pleno direito. Por isso, a dispensa de licitação só deve acontecer em estrita observância aos casos nomeados nos vinte e quatro incisos do art. 24 do Estatuto Licitatório. Mesmo quando houver dúvida a respeito da exigência ou não da licitação, deve-se realizar o certame.
Inexigibilidade de licitação: Como exposto anteriormente, a Lei de Licitações permite, como ressalva à obrigação de licitar, a contratação direta através de processos de dispensa e inexigibilidade de licitação, desde que preenchidos os requisitos previstos na lei. A inexigibilidade difere da dispensa, visto que nesta a licitação é possível, viável, e apenas não se realiza por conveniência administrativa; naquela o certame queda-se impossível por impedimento relativo ao bem que se deseja adquirir, à pessoa que se quer contratar ou com quem se quer contratar. Torna-se inviável a contenda, tendo em vista que um dos competidores reúne qualidades exclusivas, tolhendo os demais pretensos participante. Outra distinção reside no fato de, no caso de dispensa, o legislador estabeleceu um rol taxativo de situações em que seria possível contratar, enquanto que, na inexigibilidade, o rol é meramente exemplificativo, bastando que reste configurada a inviabilidade de competição, verificada no caso concreto, mas sempre com o amparo na lei. Não caracteriza um ato de mera discricionariedade, mas vinculado e motivado, o que torna o poder do administrador por demais limitado. Entretanto, não é isto que vemos na prática! Dentre o rol exemplificativo do art. 25 do Estatuto das Licitações, o caso mais utilizado pela Administração está inserto no seu inciso I, in verbis: Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: Para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência por marca devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes.
Entretanto, o dispositivo em estudo relaciona alguns requisitos que devem ser necessariamente obedecidos a fim de que se alcance a inviabilidade de competição. O primeiro a ser obedecido é a comprovação da exclusividade. O segundo é a vedação à preferência de marca, proibindo a indicação injustificada de uma específica, nos casos em que houver pluralidade de marcas que atendam plenamente aos interesses da Administração.
Não sabemos por que, se por displicência ou de propósito, em alguns certames, os produtos a serem cotados pelos licitantes são expostos de modo detalhado e minucioso, o que restringe a concorrência, ficando claramente direcionado a uma empresa ou indústria. Muitas vezes, a Administração se utiliza erroneamente desta norma legal, posto que a contratação direta para enquadrar-se neste dispositivo deve se referir a uma compra e não uma prestação de serviços, e necessita ter a comprovação da exclusividade através de uma declaração emitida pelos órgãos competentes.
É por demais importantes salientar que existem hipóteses que não se enquadram em nenhum dos incisos do mencionado art. 25, mas que estão perfeitamente incluídas em seu caput, em face de comprovada inviabilidade de competição. Alguns exemplos de situações não exemplificadas, quais sejam: Aquisição de vale transporte para servidores públicos, posto que há legislação concedendo o benefício; cursos de treinamento/aperfeiçoamento, considerando serem eventos realizados em datas pré-determinadas, o que inviabiliza a competição; atividades em regime de monopólio, como correios; entre outros.
Afora a hipótese expressa no inciso I, art. 25, teceremos algumas explanações a respeito dos incisos II e III do mesmo artigo. O primeiro deles trata das contratações de serviços técnicos enumerados no art. 13 da Lei 8.666/93, de natureza singular, como profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação. Já o segundo, diz respeito às contratações de profissionais do setor artístico.
Sobre a singularidade do objeto, requisito presente em todas as situações de inexigibilidade de licitação, embora a expressão esteja presente apenas no inciso II, o que o torna peculiar são as necessidades da Administração no momento da contratação. A natureza singular do serviço é entendida como aquele que é portador de tal complexidade que o individualiza, tornando-o diferente dos da mesma espécie, e que exige, para a sua execução, um profissional ou empresa de especial qualificação.
No referente aos trabalhos artísticos, a Lei de Licitações, em seu art. 25, inciso III, equipara-os a serviços técnicos especializados, prescrevendo-os como inexigíveis de licitação, desde que o mesmo seja consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. Assim o valor do contrato sofre variação de acordo com a crítica: se local, o limite de carta convite; se regional, tomada de preços; se nacional, será o da concorrência. Essa é uma construção doutrinária, tendo em vista a falta de clareza no texto do referente inciso.
Contratação Direta e a Moralidade Administrativa: A nossa Carta Política de 1988 incluiu, dentre os princípios básicos e orientadores da Administração Pública, o princípio da moralidade, que tem como significado a necessidade do administrador observar os preceitos éticos em sua atuação dentro da Administração. O cumprimento da moralidade, além de constituir um dever do dirigente, apresenta-se como um direito subjetivo de cada administrado. O agente público, ao exercitar a atividade administrativa, está fazendo uso de uma parcela das atribuições que lhe fora outorgada pelo Estado. Desempenha, assim, de modo legítimo, uma capacidade de administração que tem na lei seus limites definidos.
Lamentavelmente, algumas formas de desvio de finalidade, no que se refere às contratações diretas, seja por dispensa ou inexigibilidade de licitação, desenham materialmente uma aparência de legalidade, de modo que, mesmo sendo pressentidas, sentidas, ou até mesmo conhecidas, afigura-se difícil exibir a contraprova da legalidade aparente. É realmente difícil ultrapassar essa penumbra. A dificuldade maior encontra-se na prova, quase impossível em algumas situações relevante na constatação do desvio de finalidade, principalmente: Quando se sabe quão difícil é encontrar prova, absolutamente irrefutável, que comprometa o editor do ato, autoridade administrativa, regra geral, esclarecida, astuta para incriminar-se, deixando vestígios, mesmo leves, de sua intenção distorcida.
Essa é a razão por que, sem a efetiva prova do desvio praticado, a esperança deve alojar-se na mudança de mentalidade e na convicção sobre o que seja realmente bem comum e interesse público. Como bem expressa o doutrinador italiano, Jean Rivero, violar a moralidade e a finalidade administrativas, é violar o próprio fim legal.
Verifica-se que em muitos casos nos quais o administrador vê configurada a inexigibilidade de licitação, deixa-se de observar o que dispõe o art. 25, § 2º da lei 8.666/93, no que se refere ao superfaturamento. Nestas situações, tanto o agente público quanto o fornecedor poderão ser responsabilizados pelos danos à Fazenda Pública. É por esse motivo que o art. 26 exige, de forma expressa, em seu inciso III, que haja justificativa em relação ao valor do contrato.
Infelizmente, alguns administradores ainda não tomaram consciência da necessidade de bem dispor do erário, sendo o superfaturamento uma prática constante, conforme se observa em denúncias diárias veiculadas na imprensa. Superfaturamento também pode ser interpretado como elevação arbitrária do valor do contrato, tendo em vista os valores praticados pelo próprio contratado em negociações com terceiros. No entanto, nem sempre contratação direta é sinônimo de superfaturamento. Somente se caracteriza a reprovabilidade quando ocorrer uma elevação arbitrária de preços, retratando o aproveitamento da oportunidade propiciada pela contratação direta. Tendo como exemplo dessa prática por demais utilizadas nas Administrações Públicas, em especial a Municipal, é comum a decretação de estado de calamidade com o fito de contratação direta de empresas, muitas delas de fachada, aproveitando-se da lacuna deixada pela legislação.
Por fim, o dirigente público deve sempre atentar para o que dispõe a lei, que tem como regra geral a obrigação de licitar. Nesse diapasão, havendo a necessidade de dispensa ou inexigibilidade, se faz necessário que sua conduta siga as diretrizes legais e morais que regulam a atividade pública, pois, a ética no âmbito da administração não pode permitir que pessoas inescrupulosas utilizem o poder público para usufruir vantagens obtidas ilicitamente.
Considerações: Finalmente, restou evidenciada a importância do procedimento licitatório para a Administração Pública, como uma forma de controlar as atividades do Administrador na gerência dos recursos públicos, sempre tendo em mente os princípios imperiosos na atividade administrativa, quais sejam: o da legalidade, moralidade, publicidade etc.
O Administrador deve ter muita cautela ao dispensar ou tornar inexigível uma licitação, haja visto os limites impostos para tal discricionariedade, podendo o mesmo ser punido, não somente quando contratar diretamente, mas também quando deixar de observar as formalidade exigíveis para tais processos.
É de observar que no momento pelo qual uma das preocupações governamentais é a reforma do Estado e o repensar do papel a serem desempenhados na sociedade moderna, muitos dos administradores, na gerência do erário, usurpam desse poder, utilizando-se de artifícios e “brechas” na legislação, especialmente no que se refere às contratações diretas, visando interesses próprios ou de terceiros.
Por fim, não basta que o administrador se atenha ao estrito cumprimento da lei; os exercícios de seus direitos, poderes e faculdades devem ser informados por princípios éticos, devendo fazer-se, de modo regular, sem abuso.