Consciência Negra?
Em meio a uma aula de dança afro, contemplando a beleza, a força e o significado de cada movimento, me pus a pensar na hipocrisia inerente às decisões politicamente corretas de uma sociedade falsamente igualitária.
Ontem, comemoramos o dia da consciência negra e neste único dia somos autorizados, por força de lei, a manifestar nosso pensamento e consciência. É, o patrão branco nos autoriza a abrir a boca ou a fazer alguma graça, algo em estilo bem foclórico de preferência, que possa animar e divertir a platéia de outros tantos brancos, que boquiabertos, admiram o requebrar dos quadris da mulata, os panos coloridos, os ornamentos forjados em couro e palha. E somos assim a atração do dia.
Pela cidade espalham-se eventos, numa mega oferta de cultura africana. Exposições, dança e teatro, comida e religião. Famílias brancas circulam em volta e até levam um souvenir para casa. Enfim, se não dá para fazer um safari na África, dá para levar um pedacinho de uma pseudo-africa para as crianças brincarem.
Mas, como em um conto de fadas eurocêntrico, no dia seguinte as coisas voltam ao seu estado "normal" e cada qual assume seu lugar na sociedade. Despidas as vestes, ou melhor, o figurino, voltamos a assumir nossos papéis subalternos na subalternidade em que vivemos. Faxineiros, domésticas, seguranças, pedreiros, ambulantes...voltamos a enfrentar uma ou mais conduções para servir a mesa e limpar o chão dos luso-ítalo- franco-nipo-brasileiros que moram nos mais sofisticados bairros e trabalham nos mais bem remunerados empregos.
Eu me pergunto até quando representaremos esse papel exótico. Até quando faremos o jogo do contente, tal qual a personagem daquele livro infanto-juvenil, fingindo que somos felizes levando uma vidinha medíocre e sem perspectivas.
Mais que consciência, precisamos de atitude; a atitude que Zumbi dos Palmares nos inspirou e que parece esquecida por nós. Temos que fugir da senzala, não mais aquela perto da casa grande, mas a senzala travestida de paliativos e recíprocas de simpatia. Não podemos mais ser o folclore dos outros e nos tornarmos o outro, o diferente, o curioso e o exótico.
Precisamos lutar pelos espaços sociais e políticos que realmente significam. Precisamos transpor os palcos artísticos e assumir a protagonia de novos enredos onde os novos papéis possam transformar a sociedade brasileira em uma sociedade justa.
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