O Jogo de Memórias na América Hispânica
A construção da memória na América Hispânica apresenta mudanças de perspectivas que são fundamentais no desenrolar dos fatos, como demonstra Frâncio Xavier-Guerra na Obra Memórias em Transformação.
No primeiro momento, o da colonização, ocorre a negação do passado indígena, uma tentativa de desconstrução de sua memória, porém não era possível que não houvesse tal influência na construção memorial que se pretendia. É nesse momento de instabilidade do passado que aparece ocupando espaço como fator de abrangência do povo o cristianismo.Octavio Paz no Livro Labirinto da Solidão apresenta uma situação análoga do cristianismo na história do povo mexicano, enquanto Serge Gruzinsk na obra Guerra de Imagens argumenta sobre a impossibilidade de se soterrar a memória indígena e que com o passar do tempo haveria inevitavelmente uma mistura das culturas, em torno disso se desenvolve o caso da Virgem de Guadalupe para os mexicanos.
O segundo momento que transforma as construções memoriais perpassa pela questão independentista. Nesta fase tem-se como princípio a negação do período colonial, ou seja, enterrar os elementos que se identificam com o Antigo Regime. É também nesse momento que se pensa nas identificações do passado oriundas de uma antiguidade clássica. Entretanto, era meramente impossível se desvincular da tradição espanhola, já que os articuladores da elite eram os crioullos e havia ainda o poderoso elemento do cristianismo.
Após a independência identifica-se outro momento em torno das discussões memoriais, é posteriormente a emancipação que se promove a construção da nação. Em cada fase a memória se transforma seguindo interesses bem definidos pela conjuntura e desta vez tem inicio a partir das influências do pensamento liberal, mas que não seriam bem sucedidos e buscar-se-ia ajuda na memória indígena e colonial.
A afirmativa de Xavier Guerra de que o século XIX é o tempo das políticas de memória é verdadeira, como corrobora o poeta mexicano Octavio Paz tratando da questão da identidade do povo mexicano no mesmo século e que se entenderia até o século XX com a Revolução Mexicana e seus desenrolares.
A negação da tradição e da cultura espanhola é extremamente dificultada devido a afirmação das memórias privadas representadas pelas elites na América Hispânica, a qual era representada pelos crioullous. Por mais que se tentasse negar era impossível se desvincular da cultura já estabelecida com os espanhóis, é onde se dá o choque de memórias privadas de atores coletivos do Antigo Regime. As influencias das variadas partes que compunham a sociedade não podiam ser descartadas na construção da memória pública. A intervenção do cristianismo não era algo fácil de se superar, assim como a já consolidada cultura crioulla, ou seja, embora as raízes hispânicas fossem criticadas ou negadas durante muito tempo elas estavam realmente presentes.
Referência Bibliográfica:
GRUZINSK, Serge. Guerra de Imagens.
GUERRA, François Xavier. Memórias em Transformação.
PAZ, Octavio. O Labirinto da Solidão.