Fuja das preocupações (Sermo 13)

Portanto, não se preocupem com o dia de amanhã, pois o dia

de amanhã terá suas preocupações. Basta a cada dia a própria

dificuldade! (Mt 6,34)

Eu recordo que, quando era criança, minha mãe tinha um livro que apreciava muito, cujo nome era “Como evitar preocupações e começar a viver”, do escritor norte-americano Dale Carnegie († 1955). Ela leu o livro muitas vezes, recomendando-o às pessoas da família e ao seu círculo de amizades. Embora eu fosse um adolescente meio avesso às leituras, me lembro que li o volumoso trabalho em cerca de dez dias, tal a riqueza de seu conteúdo. Depois, já saído da adolescência li, do mesmo autor “Como fazer amigos e influenciar pessoas” e “Administrando através das pessoas”.

Até hoje, decorridos mais de cinqüenta anos de sua morte, o pensamento de Carnegie ainda ensina as pessoas a viver melhor. O tempo da pós-modernidade imprimiu nas pessoas uma angústia fora do comum, de onde brotam as preocupações e o desgaste emocional. Para começar a organizar nossa reflexão, dou abaixo algumas frases respigadas no livro citado:

1. A melhor maneira de nos prepararmos para o futuro é

concentrar toda a imaginação e entusiasmo na execução

perfeita do trabalho de hoje.

2. A felicidade não depende do que você é ou do que tem, mas

exclusivamente do que você deseja para si.

3. Tente a sua sorte! A vida é feita de oportunidades. O homem

que vai mais longe é quase sempre aquele que tem coragem

de arriscar.

4. Não nos deixemos perturbar por ninharias, que devemos

desprezar e esquecer. Lembre-se “A vida é muito curta para

sermos mesquinhos”.

5. Dois homens olharam através das grades da prisão; um viu a

lama, o outro, as estrelas.

6. Muitas das coisas mais importantes do mundo foram

conseguidas por pessoas que continuaram tentando quando

parecia não haver mais nenhuma esperança de sucesso.

Uma meditação sobre o sentido de nossa vida serve, entre outras coisas, para a formação da consciência. É interessante notar a dose maciça de otimismo que o escritor dá a seus escritos, a ponto de entusiasmar os leitores, influenciando-os à busca daquele nível de serenidade que é o oposto da preocupação e do pessimismo.

Nosso tempo está carcomido por aquela preocupação, muitas vezes sem sentido, incapaz de resolver problemas, e mesmo assim prejudicial à saúde física e mental das pessoas. Tem gente que parece adorar uma preocupação. Mesmo não querendo, dão a impressão que estão sempre a espreita de alguma coisa com que se preocupar e se envenenar. Esse tipo de comportamento pessimista, do tipo “chama chuva” é capaz de gerar infelicidade. Tem gente que adora estar triste, preocupado. São os “infelizes de carteirinha”.

Estas pessoas, embora tenham motivos para uma vida calma e tranqüila, estão sempre em busca de fatos novos, em geral problemas dos outros, amigos, vizinhos, parentes, para terem com o que se preocupar. O ansioso se preocupa com tudo e transmite sua insegurança aos demais, transformando tudo em uma tortura, nas atitudes, no jeito de falar, na agitação e no rigor com os horários.

A preocupação gera um estado de malignidade em nossa vida, capaz de multiplicar o tédio, a angústia, as doenças, atrair energias negativas, bloquear boas iniciativas e levar ao desespero.

A pessoa preocupada em excesso, qual um viciado, não consegue se livrar sozinho desse pesado fardo. Se você encontra um otimista, e pergunta-lhe: como vai? Ele responde bem, tudo bem... Se fizer a mesma pergunta a um pessimista, a um patologicamente preocupado, duas coisas acontecem. Ou ele pergunta: Por quê? Você notou alguma coisa? Ou vai logo desfiando um imenso rosário de queixas, doenças ou amarguras existenciais.

De outro lado, vocês já notaram como existem pessoas idosas, da terceira (ou melhor) idade, que são felizes e saudáveis? Muitos desses são cheios de sonhos e planos para o futuro, curtindo cada fase de suas vidas como a melhor e a mais rica em experiências. Ao contrário dos pessimistas, estão sempre alegres e encarando a vida como uma aventura digna de ser vivida. Qual será o segredo deles? Vocês têm algum palpite?

Eu vou dividir esta reflexão, como não poderia ser diferente, em dois blocos: o físico-mental e o espiritual. Nós sabemos que o ser humano é composto, a partir de seu dualismo criacional em duas realidades: corpo e espírito, ou soma-sarx e pneuma-psyké. Vamos estudar os dois, cada um ao seu tempo. O soma (corpo) embora seja físico, é regido não só pelos aspectos biológicos da vida animal, mas também pela mente, cujos comandos infletem diretamente no comportamento de cada um. Para enunciar estas realidades, estabelecemos uma divisão, como um alfabeto.

Cada pensamento humano gera uma emoção e cada emoção mobiliza um circuito hormonal que é capaz de provocar um impacto nos trilhões de células que formam o nosso corpo. Esse impacto, dependendo da forma como é deflagrado, pode ser positivo ou negativo. Benéfico ou prejudicial. O impacto referido provoca o que chamamos de “atitudes”, em dois tipos de atividade. As condutas “S” e as condutas “R”, como veremos em seguida.

As condutas “S” nos levam a praticar a serenidade, o silêncio, a sabedoria, o sabor, o sexo, o sorriso, o som e provocam a secreção de serotonina, um hormônio que tranqüiliza e dá alegria, cria euforia e enseja introspecção.

De outro lado, as condutas “R” induzem práticas negativas, como raiva, ressentimento, rancor, remorso, resistências e repressão. Tais condutas facilitam a secreção do cortisol, um hormônio corrosivo para as nossas células. Ele acelera o envelhecimento, faz emergir o estresse e facilita o surgimento do câncer. A pessoa tanto projeta em si mesma a infelicidade, que o organismo acaba somatizando essa carga negativa, e entra em colapso. O indivíduo que se preocupa com tudo não consegue dar a volta por cima, e acaba doente. A úlcera, a gastrite e a perda dos desejos são o menos grave que lhe acontece.

As condutas “S” por sua vez geram atitudes “A”, que são ânimo, amor, apreço, acolhida, admiração, aproximação e amizade. De outro lado, as condutas “R”, ao contrário da anterior, geram atitudes “D”, como desanimo, depressão, derrota, desolação e desespero.

Se aprendermos o valor dessas letras, e a forma como manejá-las, conseguiremos viver mais tempo e melhor, porque o “sangue ruim” (muito cortisol e pouca serotonina) oportuniza as doenças, potencializando o pessimismo e as preocupações. O “bom humor”, pelo contrário, torna-se a chave para o otimismo, a felicidade e a longevidade alegre e saudável.

No terreno espiritual, regido pela mística, no nosso caso cristã e religiosa, temos a questão levantada por Jesus, que para nós é crucial, na qual ele rejeita todo o tipo de preocupação, como veremos nos textos a seguir, colhidos no evangelho de Mateus (cap. 6).

Não fiquem preocupados com a vida, com o que comer; nem

com o corpo nem com o que vestir. Afinal, a vida não vale mais

que a comida? E o corpo não vale mais que a roupa? (v. 25).

Olhem os pássaros do céu: eles não semeiam, não colhem nem

ajuntam em armazéns. No entanto, o Pai que está nos céus os

alimenta. Será que vocês não valem mais que os pássaros?

(v. 26).

Quem de vocês pode crescer um só centímetro à custa de se

preocupar com isso? (v.27).

E por que vocês se preocupam com a roupa? Olhem como

crescem os lírios do campo: eles não trabalham nem fiam. Porém

eu lhes digo: nem o rei Salomão, em toda a sua glória, jamais se

vestiu como um deles (vv. 28-29).

Ora, se Deus assim veste a erva do campo, que hoje existe e

amanhã é queimada no forno, muito mais fará por vocês, homens

de pouca fé! (v. 31).

Portanto, não fiquem preocupados, dizendo: O que vamos

comer? O que vamos beber? O que vamos vestir? Os pagãos é

que ficam preocupados com essas coisas (vv. 31-32).

Pelo contrário, em primeiro lugar busquem o Reino de Deus e a

sua justiça, e Deus dará a vocês, em acréscimo, todas essas

coisas (v. 33).

Portanto, não se preocupem com o dia de amanhã, pois o dia de

amanhã terá suas preocupações. Basta a cada dia a própria

dificuldade (v. 34).

Rejeite o estresse, afaste as preocupações e viva melhor. Deus quer que você viva bem, viva em paz. Em sua “carta despedida”, o escritor argentino Jorge Luis Borges († 1986) afirma, no alto de seus oitenta anos, que se pudesse viver mais, cuidaria de ter poucos problemas reais, e jamais os imaginários.

Não entregues tua alma à tristeza e não te aflijas com tuas preocupações. A alegria do coração é a vida da pessoa, tesouro inesgotável de santidade, a alegria da pessoa prolonga-lhe a vida. Tem compreensão contigo mesmo e consola teu coração; afugenta para longe de ti a tristeza. A tristeza matou a muitos e não traz proveito algum, o ciúme e a raiva abreviam os dias, como a preocupação traz a velhice antes do tempo. Um coração luminoso e bom está num continuo festim; seus manjares são preparados com capricho (Eclo 30,23).

Na visita de Jesus à casa de Lázaro, em Betânia, suas duas irmãs apresentaram comportamentos diferentes. Maria sentou-se aos pés do Mestre para escutar a sabedoria de sua palavra. A outra (Marta), preocupada com as coisas materiais e agitada com seus afazeres (limpeza de casa, cozinha, contas para pagar, horários a cumprir, etc.) ficou indignada ao ver a calma da irmã. A reprimenda de Jesus é endereçada a todos quanto se deixam envolver pela agitação. Se fosse nos dias de hoje, o Mestre talvez dissesse, repetindo Dale Carnegie: “Evite preocupações e comece a viver”

Marta, Marta! Você se preocupa e anda agitada com muitas

coisas; porém uma só é necessária. Maria escolheu a melhor

parte, e esta não lhe será tirada (Lc 10,41s).

A preocupação causa mau-humor, tristeza, pessimismo e medo. Tememos as doenças, a falência, a inveja, a violência urbana e tantas ameaças metafísicas que se vê por aí. A pós-modernidade gera a angústia e cria a ansiedade que, por sua vez, atraem doenças, indisposições, coisas negativas. É sabido que nós, seres humanos temos nossas fragilidades e carências. Somos limitados em tempo, espaço e circunstâncias.

O ato de se preocupar pode ser benéfico e positivo se for racional, moderada e sinal de previdência. O indivíduo zeloso, responsável, econômico, previdente, sabe se defender e é capaz de promover as suas idéias.

De outro lado, a preocupação é negativa, maléfica na medida em que ela é pessimista, um sentimento que parece que quer antecipar as desgraças, talvez como mecanismo de defesa psicológica ou como meio de imposição de uma auto-piedade. Tais atitudes trazem a ansiedade, envenenam, criam impactos cerebrais, chegando a inibir a capacidade de ação, reação e percepção. Uma preocupação exagerada nesse teor, gera enfermidades, provoca apetite exagerado (e conseqüente aumento de peso) ou, no inverso, alguns ansiosos emagrecem, perdem o apetite e se tornam abulimicos, anoréxicos.

O indivíduo preocupado, impotente para encarar seus problemas, acaba gerando para si um dimensão patológica de baixa-estima: “Não vai dar, nada dá certo, não pode...”; e acaba não dando certo mesmo. Um corpo e um espírito de alguém que não se preserva e não luta contra o pessimismo, vai se abrindo a tudo o que é negativo e prejudicial. Há pessoas, dessas terrivelmente preocupadas, acabam sucumbindo às doenças, e vão passando de uma enfermidade para a outra. Curam uma e já surge outra, mais grave e de mais difícil tratamento. É tudo gerada na cabeça sem orientação e no espírito sem Deus.

Conheci uma pessoa que ficava decepcionada quando seus exames não acusavam nenhuma doença grave. Ela morreu de uma doença não especificada, apenas definhou, perdeu a vontade de lutar, foi para a cadeira de rodas, depois para a cama e acabou morrendo.

A preocupação é inimiga do sono. A pessoa tensa, preocupada, tem dificuldades com o sono; dorme pouco. É preciso – literalmente – cabeça fria na hora de dormir. A recomendação serve em todos os sentidos da frase: preocupações e ansiedades não devem ser levadas para cama. O cérebro precisa perder calor para o resto do corpo para iniciar o sono, dizem os especialistas. É preciso “esfriar a cabeça”.

Há quem recomende aos tensos e preocupados, um sorvete antes de dormir. O sorvete tem leite, que é rico em um aminoácido chamado triptofano, de onde vem a serotonina. Com a falta de luz, enzimas transformam a serotonina em melatonina, substância que interfere na regulação do sono.

E vejam: dormir não é apenas uma necessidade de descanso mental e físico. Durante o sono, ocorrem vários processos metabólicos que, se alterados, podem afetar o equilíbrio de todo o organismo.

Estudos provam que quem dorme menos do que o necessário tem menos vigor físico, envelhece mais precocemente e está mais propenso a infecções, obesidade, hipertensão e diabetes. E porque as pessoas dormem pouco? Entre os vilões está a preocupação. A falta de sono inibe a produção de insulina, hormônio que retira o açúcar do sangue, e eleva a quantidade de cortisol, o hormônio do estresse.

A esta altura espero que tenhamos adquirido consciência de que a preocupação faz mal ao ser humano. Ela é rejeitada por médicos, especialistas, profissionais do comportamento, e também criticada por Jesus Cristo. Quais seriam, então, os passos necessários para fugirmos das preocupações? Vamos fazer um roteirinho de felicidade?

1. analise as causas das suas preocupações; só essa análise

pode solucionar ou diminuir o grau de intensidade; o fato que

me preocupa depende de mim? minha preocupação vai

contribuir para a solução do problema?

Por que devo andar pesaroso sob a opressão do inimigo (Sl 42,10).

2. não exagere; mesmo sendo previdente, não se preocupe hoje

com as questões de amanhã: quem se preocupa na véspera

sofre o dobro;

3. saiba corretamente o valor das coisas:

3.1. o Reino vale mais que minhas provações;

3.2. a vida mais que a comida;

3.3. o corpo mais que a roupa;

3.4. a pessoa mais que as coisas.

4. transfira sua preocupação para Jesus; lance seus males para

ele:

Coloquem nas mãos de Deus qualquer preocupação, pois é ele

quem cuida de vocês (1Pd 5,7).

5. aprenda a pedir a Deus; fale tudo a ele! Deixe de xurumelas,

seja objetivo, não fale “abobrinhas”; veja se suas “angústias”

não atrapalham ou inquietam a vida de seus familiares; jamais

peça coisas fúteis ou questões imaginárias; dê graças pelas

vitórias futuras!

Não se inquietem com nada! Apresentem a Deus todas as

necessidades de vocês através da oração e da súplica, em

ação de graças (Fl 4,6).

6. não ambicione coisas além da sua capacidade; o dinheiro traz

conforto mas não compra a felicidade;

Vivam em harmonia com os outros. Não se deixem levar pela

mania de grandeza, mas se afeiçoem às coisas modestas

(Rm 12,15).

7. aprenda/descubra o sentido da sua vida; diga todos os

dias: “sou feliz porque tenho a bênção de Deus!”. É Deus que

abre portas; quando ele abre, ninguém fecha.

Aprendi a viver na necessidade e aprendi a viver na

abundância; estou acostumado a toda e qualquer situação;

viver saciado e passar fome; ter abundância e passar

necessidade. Tudo posso naquele que me fortalece! (Fl 4,12s).

Uma meditação sobre o sentido da vida, da nossa vida, serve, entre outras coisas, para a formação da consciência. Se a reflexão for orientada pelo Espírito Santo, serve para a construção de uma reta consciência cristã. Essa consciência, uma vez adquirida e desenvolvida, vai nos dar o rumo certo para vivermos atentos aos fatos da vida, sem aquelas preocupações que não levam a nada, exceto à fadiga e à ansiedade. Muitas vezes, no vazio da angústia a pessoa se esquece de Deus e perde a paz;

Não tenham medo daqueles que matam o corpo, mas não

podem matar a alma. Pelo contrário, tenham medo daquele

que pode arruinar a alma e o corpo no inferno! Não se vendem

dois pardais por alguns trocados? No entanto, nenhum deles

cai no chão sem o consentimento do Pai de vocês. Quanto a

vocês, até os cabelos da cabeça estão todos contados. Não

tenham medo! Vocês valem mais do que muitos pardais

(Mt 10, 28-31).

A esperança cristã nos revela a presença de Cristo ao nosso lado. Ora, se o Senhor está a nosso favor, quem se atreverá ser contra nós? (cf. Rm 8,31). Deste modo, quem nos separará do amor de Cristo? (v. 35). Na Antiguidade, o rei-salmista cantou que o Senhor é pastor dos que crêem, por isso nada há de faltar (cf. Sl 23). Dentro do mesmo espírito, visando erradicar as preocupações de seus amigos, Jesus prometeu ser uma presença constante no meio deles:

Eu estarei com vocês todos os dias, até o fim dos tempos (Mt 28,20).

Seria uma irresponsabilidade o fato de o cristão não se preocupar com dados essenciais à vida humana e à salvação futura. O homem precisa comer, vestir, ter uma casa, viver fraternalmente em sociedade, trabalhar, divertir-se, assim como construir uma vida concreta para a eternidade. Mesmo assim, estas preocupações, legítimas e necessárias não podem nem devem exceder a forma de pensar o dia de amanhã. Afinal, a cada dia bastam as suas preocupações. Tem pessoas que são como que “fábricas de preocupações”. Estão sempre procurando um problema que lhes vá tirar a paz. Essa atitude pode ser deliberada ou automática. É preciso cuidar para não cair nessa armadilha.

Veja bem: você precisa aprender a se relacionar com os problemas e transtornos enfrentados no dia-a-dia de outra maneira. Não “brigue” com as suas preocupações. Canalize-as para o seu benefício. Marque um horário para se dedicar a elas sem restrições, mas não deixe que elas ocupem mais do que o tempo previsto. Identifique os seus problemas de acordo com a área da sua vida que cada um deles afeta. Mantenha controlada cada situação no seu âmbito, sem deixar que um afete o outro.

As preocupações da vida são o maior tirano que existe, e ele lidera um exército de algozes e verdugos que nos comandam e escravizam. A seu serviço encontramos a desconfiança, o medo, a consciência pesada, o desalento, a murmuração, a crítica, a irritação, a amargura, a teimosia, a tristeza, a depressão, o desespero e a frieza para com Deus. “Não te preocupes!”, é o brado contra essas inclinações diabólicas.

Teologicamente, e isso não é uma alienação, mas um forte argumento, consubstanciado nas Sagradas Escrituras, nós temos um inimigo, poderoso e ciumento, que tem inveja de nossa amizade com Deus. Ele faz de tudo para nos agredir, para nos ferir, para nos perder. Não preciso dizer o nome dele para não dar-lhe Ibope. Quando ele não consegue nos atingir e encaminhar para uma perdição mais explícita, ele ataca pelo outro lado. Inspira desejos de perfeição, quando passamos a desprezar os imperfeitos, os medíocres, os humildes. Depois, prossegue despertando em nosso espírito, preocupações sem motivo, dúvidas e temores, coisas que vão aos poucos nos corroendo e nos afastando daquele desejável equilíbrio psicológico. E lá se vai a pessoa, ladeira abaixo.

Se for verdade que a cada dia basta a sua carga de preocupação, porque então teimamos em carregar nossas dores e mágoas para o dia seguinte? E ainda há os mais infelizes que as carregam para a semana seguinte, o mês seguinte, anos afora... As preocupações teimam em nos apegar ao sofrimento, potencializando nosso estado de perda e de derrota. Isso apega-nos à dúvida e ao ressentimento. E como guardamos porcarias em nossas gavetas!

Elas são inúteis mas não as jogamos fora. Vivemos com o lixo da existência, traumas passados, de infância, das irrealizações da vida, tudo colado, aderente a nós. Seria mais salutar e psicologicamente higiênico jogar tudo fora.

Não podemos – e esse vício é mortal – carregar no dia-a-dia com teimosia a preocupação estéril e inócua, o medo, o rancor, a temor da derrota ou o trauma de alguma perda irreparável. Os tormentos da preocupação deixam marcas em nosso rosto, em nosso espírito, em nossas ações e – sobretudo – em nossos relacionamentos. Todas as iniciativas positivas de alguém que sofre a síndrome da preocupação acabam esbarrando no medo e na impotência de quem acha que não vai conseguir vencer.

Para obter uma eficaz cura interior deve o angustiado abrir a gaveta do seu coração e dizer bem alto, aos gritos: “Eu não preciso mais disso. Isso aqui não me traz nenhum benefício!”. Quando limparmos nossa vida desse estresse, haverá mais espaço para o amor, para a cura, para o convívio.

Para ser feliz, viva um dia de cada vez, procurando haurir da vida e das pessoas o que há de melhor. Esta é a vontade de Deus; este o projeto que ele fez para a sua vida! Certas pessoas simplesmente não conseguem resolver os problemas do presente, porque estão muito preocupadas com o futuro ou demasiadamente presas ao passado. Não estou dizendo para você esquecer o passado ou simplesmente não se preocupar, de maneira alguma, com o futuro. Apenas peço que concentre o máximo de suas energias no presente, pois é aí que você está.

Cada pessoa é o conjunto de opções que ela própria faz durante a vida. Ninguém é responsável pelo seu futuro, pelo simples fato de o seu futuro somente depender de suas ações agora, no presente e estas ações estão sobre o seu inteiro controle. Pense bem nisso.

A função de cada um é escolher que tipo de dia quer ter hoje. Eu posso reclamar porque está chovendo ou agradecer às águas por lavarem a rua. Posso ficar triste por não ter dinheiro ou me sentir encorajado para administrar minhas finanças, evitando o desperdício. Posso reclamar sobre minha saúde ou dar graças por estar vivo. Posso me queixar dos meus pais por não terem me dado tudo o que eu desejava ou posso ser grato por ter nascido. Posso reclamar por ter que ir trabalhar ou agradecer por ter trabalho. Posso sentir tédio com o trabalho doméstico ou agradecer a Deus por ter um teto que abrigue minha família e meus pertences. Posso lamentar decepções com amigos ou me entusiasmar com a possibilidade de fazer novas e valorosas amizades.

Lembre-se sempre do amor que Deus tem por você. Quando você disser que não pode ir, ele te dirá “eu dirijo teus passos” (Pv 3,5s). Se achas que uma empreitada é impossível, Jesus responde “as coisas impossíveis para os homens são possíveis para Deus”. Não fale em solidão; ele não te deixará nem te desamparará (Hb 13,5).

Não esqueça que alegria é vida! Não se deixe dominar pela tristeza, nem se aflija com preocupações. Alegria do coração é vida para o homem, e a satisfação lhe prolonga a vida. Anime-se, console o coração e afaste a melancolia para longe, pois ela já arruinou muita gente, e não serve para nada. Inveja e ira encurtam os anos, e a preocupação faz envelhecer antes do tempo. Nada é impossível para aquele que crê (Mt 17,20). Para quem duvida que possa fazer algo, Deus dirá “com minha força você tudo pode” (Fl 4,13). Quando achar que é difícil obter o perdão, Jesus vai te dizer “eu te perdôo” (1Jo 1,9; Rm 8,1). A quem tem medo, Deus afirma “Não temas, eu estou contigo!” (Is 41,10). Se cansas, Jesus te fará descansar (Mt 11,18ss). Por fim, se imaginas que ninguém te ama, Jesus te mostrará que ele e o Pai te amam de verdade (Jo 3,16; 13,34). O que vence as preocupações deste mundo é a nossa fé em Jesus Cristo (1Jo 5,4). E é isto que basta.

Faça um exercício de otimismo: a cada manhã, ao levantar, sorria diante do espelho. Alegre seu dia com aquele sorriso que o espelho lhe devolveu. Depois disto, reproduza sorrisos o dia inteiro, ao invés de cara-feia ou semblante sofredor. Verá que seu dia pode ser muito melhor.

Portanto, não se preocupem com o dia de amanhã, pois o dia de

amanhã terá suas preocupações. Basta a cada dia a própria

dificuldade!

Antonio é autor do livro “Mensagens de Esperança”, Ed. Ave-Maria, 1999. 2ª. edição.

Este texto é o excerto de uma pregação num retiro espiritual de casais em Belém do Pará em agosto de 2002.