OUTONO
Procurei um tema dentro de mim e eis que me deparei com a idéia de escrever sobre a Terceira Idade. E num lampejo de associações de idéias estabeleci a relação entre a Terceira Idade e o Outono. Sem qualquer pieguice eu acho essa estação do ano encantadora. Traduz a intensa luminosidade do verão e nos prepara para a escuridão das noites frias do inverno. O outono me seduz pelas cores e incongruências dos climas: ora ameno, ora frio e ora quente; não é inverno, mas tem suas noites frias, não é verão e tem seus dias quentes; é a estação das brisas mornas, da aurora boreal, do céu avermelhado ao fim da tarde, das folhas secas, mas também da colheita de alguns frutos, dos frutos no tempo certo.
Com a terceira idade faço essas mesmas comparações: um período da vida sucedendo o outro, um período preparando a chegada do outro. Aí me pergunto por que de tanto barulho em torno desta fase da vida? Como se chegar aí, na terceira idade, fosse um evento e tanto e não apenas uma condição natural da nossa existência, da fase de quem cuidou para chegar dentro dos seus possíveis, uma fase, como tantas outras, que requer atenção e cuidados. Por que não podemos simplesmente viver nosso Outono, colhendo da sabedoria e da indulgência que plantamos ao longo dos anos? Ou não.
Ao invés disto criamos expressões eufóricas como “melhor idade”, “envelhescência” para contrapor a fase da aborrecência na adolescência e outras. Fugimos da realidade dos fatos que projetam algumas dificuldades tão pertinentes ao funcionamento das máquinas em uso aos desígnios do tempo. Criamos uma parafernália de coisas que possam retardar nossa velhice e conseqüente entrada nesta fase da vida. Se no passado nossos idosos exibiam na face às marcas do tempo, sofrido para muitos, hoje nos surpreendemos com a capacidade do rejuvenescimento facial e físico que alguns deles, idosos, exibem. Méritos tecnológicos e sociais, porque tiramos nossos velhos dos sofás e das cadeiras de balanço e os incentivamos para as ruas: bailes, viagens e academias.
Não esqueçamos os romances, a infidelidade conjugal, os divórcios, os nascimentos de filhos e as doenças venéreas como partes deste conjunto neoliberal do agora nesta fase da vida. São resultados que traduzem os contra-censos entre o sim e o não, entre o real e o imaginário, entre a maturidade e as inconseqüências pueris, entre a saúde e as doenças. Se por um lado estamos cuidando mais dos nossos idosos, incentivando-os à alegria e ao bem-estar psico - social, por outro estamos deixando – os a revelia destas exigências que chamam de melhor idade. Pais e filhos competem entre si à força do tempo, mas de um tempo dissociado entre eles: pais e filhos.
O tempo de cada um chega quer queiramos ou não. A força da vida é única, mas o uso que fazemos dela será especial para cada um de nós. Assim seja o outono como vinculo que possa permear nossos verões e invernos. Porque envelhecer seja este período da vida que trazemos as experiências boas ou não do passado, é a oportunidade de aprender mais e juntas, as experiências do ontem e do agora, somar o conjunto que reflita a Sabedoria e a Indulgência pertinentes a esse momento vital. Na velhice temos condições de apreciar o que plantamos e colher os frutos sem cairmos nas teias da depressão, até porque a depressão já não escolhe mais apenas os idosos para se instalar feito posseira.
Olho para essa fase da vida com muito carinho e gratidão. Agradeço aos meus idosos, aos idosos amigos, aos idosos dos meus amigos e também aos desconhecidos, pois só ao lado deles, lendo e ouvindo suas historias que posso lançar um verdadeiro olhar para o Futuro. Um futuro em cuja estação pode ser o Outono.
Por Graça Costa.
Amparo, 29 de agosto de 2008.