UM POUCO DE FÉ

A UNIDADE DA TRINDADE

Os teólogos (a quem, por estudos acadêmicos, foi conferido um diploma por Curso de Teologia vinculado a uma instituição religiosa) jamais antropomorfizaram Deus. Para eles, Deus sempre foi Espírito, o único incontingente que sempre existiu, é incriado, nunca teve princípio nem terá fim, criador de todos os seres existentes, visíveis e invisíveis (a síntese máxima do poder, contra o qual nada poderá), portanto todos os seres fazem parte dos seus desígnios, ainda que não saibam ou, até mesmo, que não queiram. As leis que regem a ordem com que Deus criou o universo é que prevalecem. Esta conclusão leva em conta a premissa do monoteísmo, que também estende-se aos teósofos (os que, mesmo sem uma formação acadêmica no assunto, além da crença, tornam-se autodidatas isolados ou pertencentes a grupos independentes em busca do saber a respeito de Deus) e, de uma forma mais ampla, a todos o que crêem.

Entre os teósofos, os teólogos, os líderes religiosos - católicos, protestantes, kardecistas e judaicos - alguns tentam explicar, outros discordar do princípio da Trindade Divina, dogma de fé cristã (das religiões que têm Jesus como o Messias). Ninguém duvida: Deus é único e indivisível. A trindade, ou seja, o dogma da unidade espiritual do Pai, Filho e Espírito Santo, torna-se muito polêmica, pois há uma separação nominal de pessoa. O Espírito Santo é o espírito de amor que une o Pai ao Filho, ilumina quanto à Verdade Divina, ou seja, concede esclarecimento das dúvidas e dos dramas humanos, ou seja, a inspiração divina. Jesus Cristo é o seu Filho, muito amado, feito homem, que, com sua, inicialmente, aparente e humilde derrota de morte na cruz, obteve a maior vitória, sem precedentes, já acontecida na história da humanidade: a gloriosa ressurreição, signo de uma nova aliança entre os homens e Deus.

Ora, até mesmo um homem quando gera seu filho não se divide ao faze-lo, este nasce da mesma substância de seu pai e o filho do homem é homem. Por que o filho de Deus não seria Deus? E, mais, por que teria Deus que se dividir para gerar seu filho? Qual o motivo que, para ser aceita, a concepção de Cristo tem que ser, obrigatoriamente, tão simples quanto a humana? Não entendo qual o motivo do cristianismo ser desmerecido e suas religiões serem tidas como politeístas por pessoas de outros credos, por causa do dogma da Santíssima Trindade. Alguns, até mesmo dentro das igrejas cristãs, questionam os dogmas porque acham que a fé tem que ser racional (compreensível e aceita pela razão humana). Tudo isto leva-nos a outros questionamentos, não a respeito de Deus (não nos atrevemos), mas a respeito daqueles que O questionam. Nós devemos dizer a Deus como deve ser sua substância para acreditarmos nela? Alguma fé é racional? Pode-se constatar que os sentimentos que nutrimos a respeito de fatos, instituições e pessoas nem sempre são racionais. A pessoa a quem se ama, representa um modelo racional da pessoa que se quis ou escolheu amar? Será que, até mesmo, essa escolha aparentemente tão humana nos cabe? Qual o motivo racional de alguém ser do Cruzeiro ou do Atlético ou do América, ou até mesmo, de alguém optar por não torcer por nenhum desses times?

A palavra proferida por um homem pode mudar sua vida, a vida de quem o escuta. A palavra (verbo) proferida por Deus pode destruir e recriar o mundo num piscar de olhos se Este assim o quisesse. Deus não tem que ser questionado. Ele é bom e misericordioso. Qualquer coisa de ruim vem do erro dos seres criados. Caso sofram é porque precisam aprender alguma coisa com os fatos a que são expostos e que vêm dos erros de outros ou deles mesmos, mas seu sofrimento não é da vontade do Pai que os criou. Se há arrependimento, Deus perdoa seus filhos, pois muito os ama e não lhe agrada que seus filhos sofram necessidades, fome, doença, tristeza de qualquer espécie. Deus não gosta de ver seus filhos sofrerem. Quando falta muito em algum lugar é porque em outro lugar, alguém tem demais, cometendo o pecado da ganância desmedida que causa a fome no mundo, já que o que tem no mundo é suficiente para todos, dada a perfeição do universo criado por Deus.

Como humanos, nós somos espíritos imortais em matéria mortal. O corpo é uma casa com que o espírito se reveste e vem à terra para aprender a ser humilde e adquirir sabedoria vivendo com os limites que a densidade do corpo lhe oferece. Quando o ser humano morre, caso atinja o merecimento resultado da sua caminhada existencial, e seu espírito esclarecido alcance os dons superiores, liberados por resultado, saiba ser agradecido, e, ao se aproximar da luz divina, louve ao Criador, pela graça de sua criação; somente a Este agrade e obedeça sem questionamento.

Nós humanos (a própria ciência confirma) usamos menos de 5% de nossa capacidade mental e psíquica. Ora, Deus que é perfeito, certamente, não nos liberou os 100% de imediato à toa, precisamos caminhar e aprender para sermos merecedores deles quando o espírito da criatura se encontrar com o seu Criador. “Somos feitos à imagem e semelhança de Deus”, uma vez que Deus não mente e é o único ser total e inquestionavelmente verdadeiro, puro e santo. A imagem e semelhança que temos com Deus, portanto, se pudesse ser analisada racionalmente, poderia ser a totalidade das nossas capacidades, já que grande parte delas possuímos adormecidas enquanto espíritos encarnados. Questionar Deus? Parece que Ele foi muito sábio, houve de nos ensinar a merecê-la, para depois disponibilizá-la em todo seu esplendor, à sua imagem e semelhança, pois, se com apenas 5% muitas pessoas já questionam Deus e outros se julgam os próprios deuses, cometendo o pecado do orgulho, que foi o que separou o universo espiritual em duas legiões de anjos e outos entes ou seres espirituais: uns felizes, próximos e amantes a Deus (que dão alegria ao Pai), e outros longe, aflitos e revoltosos com Ele (que dão tristeza ao Pai, mas ainda assim, muitas vezes, obedecem e estão a serviço de leis universais sem o perceberem, por terem seu entendimento diminuído devido ao pecado do orgulho ao insurgir-se contra o seu Criador).

Deus pode tudo, como ser Criador do universo. Sei que muitos não comungam da crença em um Deus que criou tudo, mas ainda há outros, como eu que assim acreditam. Ora, no mundo animal, todo aquele que dá início a uma nova espécie é hermafrodita, mas Deus não tem corpo. É Espírito Puro e Cheio de Vontade, o princípio e a essência de todos os seres, o único incriado. A matéria se criou a partir da Sua vontade. Ele não precisa ser compreendido dentro de um critério humano para ser verdade, pois sua constituição não é assim, tão simples. Já dizia o ditado: “a sabedoria humana é a loucura de Deus”, afinal, temos uma visão muito limitada dos acontecimentos para podermos julgá-los sem erros.

Apenas Deus é o juiz perfeito de nós e de Si mesmo, pois que é o único verdadeiro sabedor de todas as coisas e sentimentos (onisciente) em toda parte (onipresente), sendo o único espírito com tais características. Aos seres criados, espirituais ou materializados, cabe apenas a interpretação (muitas vezes falha) do que conseguem perceber, viver ou presenciar.

Ao homem, portanto, caberia a humildade de reconhecer isto e tentar ser o melhor que um ser humano pode ser como tal e aprender o máximo que puder, na oportunidade que a caminhada nesta forma de vida lhe permite, uma vez que a alma é imortal, o que pressupõe uma outra forma de vida posterior. Questionar Deus, além de suma pretensão, pecado capital de orgulho, é burrice. Não se questiona a resposta de todas as coisas. Não se questiona Deus, Eli, Eloi, Adonai que foram nomes pelos quais o Senhor Deus, Pai de todas as coisas e seres visíveis e invisíveis foi chamado nas mais diversas línguas. Jesus Cristo, Seu Filho materializado, não ousou fazê-lo e Lúcifer, ao fazê-lo, foi banido. Se, nem ao Filho de Deus e nem aos seus anjos é permitido, é muito atrevimento nosso questionar Deus.

O cristianismo é monoteísta. O Espírito Santo e Jesus Cristo e Deus são da mesma matéria, única, indivisível e inimitável, princípio da Santíssima Trindade, tão polemizado. Quando os cristãos chamam pelo Espírito Santo, clamam por um esclarecimento divino, naquilo que não compreendem já que Deus tudo sabe, quando chamam por Jesus Cristo, clamam pela única Imagem de Deus, que é espírito e teve sua natureza materializada, sendo um elo entre os dois mundos: o celestial e o material. Jesus nos ensina: “Ninguém vai ao Pai senão por mim” (João: 14,6).

A confusão, portanto, não é de Deus, a confusão vem do não entendimento humano a respeito de Deus, muito além da nossa compreensão, portanto, ela sempre existirá ao se falar de Deus sendo interpretado por humanos, quem quer que seja. Afinal, vemos Deus “escrevendo certo por linhas tortas” enquanto as linhas Divinas são certas e diretas.

Ao invés de querermos compreender e questionar Deus, coisa muito fora do nosso alcance, deve-se levar em consideração que, com o Livre Arbítrio, com que Deus dotou todas as suas criaturas, vem também a responsabilidade por nossos atos, pois uma lei que não se pode ignorar é a Lei do Retorno, ou seja, como um bumerang ou uma colheita, traz-nos de volta retornos dos nossos movimentos, dentro do chamado Princípio da Causa e Efeito. Assim, devemos praticar o bem para que este possa cercar nossa vida. Dessa forma, pode-se inferir que Deus, em sua infinita sabedoria e bondade, não quer o mal de nenhum ser criado por Ele, pois Dele só vem o bem, mas os deixa livres para escolherem seus caminhos, uma escolha que tem conseqüências, como todo movimento no universo criado.

A qualquer tempo, vale a reflexão. A mudança para um mundo melhor e o que acontece conosco depende de nossas próprias ações, então, é imprudente esperar que tudo melhore a partir das ações alheias, o que deixa sem efeito nosso julgamento sobre elas, que também é imprudente. Cristo mesmo disse “Quem nunca errou que atire a primeira pedra” (Jo: 8, 7) e a Bíblia também nos ensina “Não julgueis para não serdes julgados, porque com a mesma medida que julgares, serás julgado” (Mateus: 7,1-2). Assim, mais vale julgar e apreciar nossas próprias ações na busca por um ser humano e um mundo melhor. Como o filho de peixe, peixe é, somos criaturas de um criador que é só bondade. Faz parte da essência humana ser bom. Pode-se notar que quem foge dessa natureza é infeliz. A coisa que mais nos faz feliz é fazer bem a alguém, alimentar e acariciar nem que seja a um animal - também ser vivo, melhorar um lugar em que moramos, ver nascer uma semente plantada. Dá um sentimento de utilidade, de prazer, de encontro conosco mesmos. Normalmente, quem experimenta essa receita tem uma mudança significativa em sua vida.

* Este texto vem dos estudos autodidatas, portanto teosóficos, que vêm sendo desenvolvidos há mais de 7 (sete) anos por mim a respeito das religiões. A bem da verdade, nada que venha do homem pode ser considerado uma verdade universal, nem mesmo sua escolha religiosa, já que vem de um ponto de vista pessoal, mas pode-se dizer que é a verdade dos muitos que nela acreditam. Em breve, estarei lançando um livro que fala da busca humana de entender e se aproximar de Deus. Considero uma ousadia minha, que não sou teóloga, mas há algo, intimamente, me cobrando. Aguardem para fazer a sua crítica!

* Parte deste texto foi publicada no Jornal O TEMPO, em 2006, como resposta ao texto "Sem Substância", da coluna do escritor José Reis Chaves, que também é teósofo, mas de uma linha de pensamento diferente da minha.

CRUZ, Ana da. Um Pouco de Fé: A Unidade da Trindade. Recanto das Letras, 2008. Disponível em URL: [http://www.recantodasletras.com.br/autores/anadacruz]

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Ana da Cruz
Enviado por Ana da Cruz em 30/10/2008
Reeditado em 11/11/2008
Código do texto: T1255665
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