A VISÃO TACANHA DA SEXUALIDADE

Não existe para onde correr. Se esta jornada material é apenas um sonho, fase transitória de aprendizado no qual nos vimos circunscritos a determinadas peculiaridades da vida corpórea que nos impõe necessidades passageiras e nos suprimem a vida a longos haustos de dentro daquele contexto mais verdadeiro e pleno, qual o que reencontraremos no nosso retorno às dimensões mais vastas da vida, há que se rever conceitos e se desvencilhar de certos chavões tacanhos no entendimento do papel da sexualidade, em voga na mentalidade humana desde a conquista das liberalidades desenfreadas das últimas décadas.

Um dos chavões diz respeito ao número ideal de relacionamentos sexuais mantidos pelos indivíduos, sem se enfatizar devidamente a qualidade dos mesmos, como se este número, única e exclusivamente, fosse o responsável pela felicidade e saúde mental, emocional e física dos casais. Esquece-se com isso de que sexo é preliminarmente sinônimo de bom entendimento e boa química entre seus participantes, de estima e de respeito mútuos, cumplicidade e camaradagem; e que disso, dessa amálgama bem-vinda, é que advirá, de fato, o desempenho de uma sexualidade saudável baseada muito mais num contexto emocional e espiritual salutar do que em paixões fugazes, obsessão doentia por número de vezes por mês e normas pré-concebidas para uma questão que absolutamente prescinde disso, em razão de não se prender a padrões e a receitas, como na confecção de um bolo.

A saúde e a felicidade humana requisitam bem mais do que um número pré-concebido de relacionamentos sexuais: requisitam leveza de consciência e de espírito, de vez que uma alma conturbada com dramas, ressentimentos, ódios e desassossego nas suas convivências diárias não encontrará ocasião para um bom desempenho, não somente na área sexual de sua vida - mas em nenhuma outra! Cobra compreensão e maturidade para a manutenção do equilíbrio familiar, no contexto do respeito e do carinho mútuos, principalmente relativos ao exemplo na conduta diária dos casais, e no enaltecimento dos valores individuais antes da preocupação em se atormentar o outro acerca de suas falhas e limitações, emprestando a esses relevância maior do que a existente nas suas qualidades.

Quantos não consideram seus vínculos amorosos, seus relacionamentos, enfatizando somente o aspecto exclusivo do bom desempenho sexual, excluindo todo o resto?! E quantos destes mesmos relacionamentos não vemos fracassar diariamente, em tempo recorde, de vez que tudo se reveste de grande transitoriedade quanto mais seja confinada ao terreno movediço e vertiginoso da pouca duração de um ato sexual que, de resto, e como tudo o mais com o passar do tempo, tende a se desgastar, modificar, e se transformar ao compasso das mudanças individuais e dos interesses envolvidos?!

Pergunta-se, não raro, que foi feito daqueles antigos relacionamentos cujos últimos representantes ainda deparamos nas pracinhas e nas ruas dos bairros das nossas cidades - casais que atingiram o inimaginável tempo de convivência de cinqüenta ou sessenta anos apesar de todos os percalços e desgaste dos fatores tanto emocionais quanto materiais presentes no histórico de toda relação mais duradoura.

Alguns argumentam da impossibilidade deste contexto em tempos atuais, nos quais a mulher, principalmente, não carrega a obrigação da manutenção de uma relação que não lhe agrade, em vista das suas conquistas no terreno psicológico, emocional, profissional e na participação da economia doméstica. A isto, todavia, há que se avaliar, do ponto de vista de sua sexualidade, quais foram as conquistas de fato. Será a liberdade maior de escolhas, e de fato, a responsável por dias mais felizes?! Então, por que em volta, e por toda parte, ainda a existência do desencanto, da solidão crônica que assola os nossos dias? Se o número de relacionamentos sexuais, ao menos teoricamente, é maior, mais liberto das amarras antigas dos tabus e preconceitos, por qual razão por toda parte os desencontros, as tragédias amorosas, o descontentamento nas relações conjugais e afetivas como nunca se fez tão crônico quanto o observado nas últimas décadas de renovação drástica de rumos, de entendimento e de atitudes no que se refere ao âmbito da sexualidade humana?!

Amigos... a realidade, mais dia menos dia, será uma só! A da vida maior, que nos aguarda talvez que num futuro nem tão distante! Temos em Allan Kardec que, do ponto de vista da vida espiritual, o ítem sexual não impõe seus imperativos tão drasticamente quanto na matéria - lá, onde os requisitos da procriação corpórea, nos mecanismos regentes da reencarnação nos mundos físicos, deixam de existir.

Há que se conviver, sim, e assim como acontece com outros vícios e necessidades arraigadas que desavisadamente nutrimos ao extremo durante nossos períodos mergulhados na vida material, com os resquícios incômodos dessas mesmas necessidades que, nada obstante, como ecos perturbadores, nos flagelam em certo grau, requerendo a atenção dos que atingem as paragens espirituais para com o seu campo vibratório saturado destes miasmas mais pesados e inadequados ao padrão vital depurado das moradas do invisível.

Assim que o que se vicia em alimentação animal haverá que se depurar gradativamente do hábito alimentar nocivo, objetivando o contexto da vida verdadeira no qual a alma se nutre de substâncias mais quintessenciadas, destinadas à profilaxia do corpo espiritual com vistas à adaptação do recém chegado aos moldes do mundo ao qual haverá de se reintegrar; o vício do fumo, do álcool e outros, bem como as vibrações funestas nutridas arraigadamente nas expressões baixas do nosso campo emocional, como as do ódio, da mágoa, vingança e rancor, tanto mais se vejam entranhadas no padrão energético do nosso espírito, haverão de nos chumbar, infelizmente, via sintonia, durante período indeterminado em paragens obscuras condizentes, para além das portas da fugaz passagem pela vida corpórea.

E assim, também, ocorre com o entendimento tacanho e a obsessão doentia acerca do que seja a prática sexual, através da canalização imprópria das energias reprodutoras utilizadas ao extremo, se governadas exclusivamente em função de um idealizado "número de vezes" tido aleatoriamente como saudável - e ancorando, com isso, o ser à percepção estreita do que seja a função mais nobre da sexualidade humana: jamais número de vezes em que se pratica o sexo, mas, sobretudo, a qualidade, o como; o de dentro de que contexto emocional, obedecendo ao padrão mais ou menos depurado da química entre os parceiros; o saber canalizar a mesma energia para fins outros, mais criativos.

Deixemos, portanto, de lado, estes clichês que mais amarram os seres em ansiedade, expectativas calcadas em valores inexistentes e numa compreensão mesquinha da amplitude da vida e das suas inúmeras possibilidades de felicidade, num contexto insuspeitadamente ilimitado para todos nós. E assim, sem o peso desnecessário dessas amarras, nos deixaremos governar pelo próprio fluxo leve e salutar dos acontecimentos, que haverão de nos situar e sintonizar com as pessoas certas e mais necessárias ao nosso crescimento, regozijo e amadurecimento espiritual, com vistas à uma melhor adaptação, desde já, aos parâmetros luminosos do Mundo Maior!


Christina Nunes
Enviado por Christina Nunes em 27/10/2008
Código do texto: T1251496
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