Luar do Conselheiro fala sobre o Cangaço.

O Cangaço como ele é:

Creio eu e vocês devem convir que não há assunto mais polêmico na história do nordeste quanto o advento do Cangaço, tema que divide opiniões das mais diversas e provocam discussões inflamadas de paixão e ódio.

O que de verdadeiramente foi o advento do Cangaço? , para tecer minha opinião, devemos examinar bem os fatos.

Em 1834 são vistos pela primeira vez Cangaceiros, supõem-se que o Cangaço teria nascido em 1830, homens usando indumentária parecida a dos vaqueiros, que lhes funcionava como armadura para a vida na caatinga, pois lá, as plantas que não são cobertas de dolorosos espinhos, possuem substâncias urticantes que provocam queimaduras insuportáveis.

Assim, vestidos de chapéu, gibão, perneira, peitoral, luvas e botas de couro, portando clavinotes, cartucheiras cruzadas, punhais com bainhas de couro de onça e de cobra, os matutos excluídos formavam bandos armados, e com o poder do terror, desfilavam pelo sertão fazendo a sua própria lei.

Facínoras que estupravam, matavam, torturavam e roubavam; vez ou outra surgiam Cangaceiros com alguma noção de justiça, mas isso era raro.

A maioria dos bandos se formava em conseqüência de guerras entre famílias ou entre coronéis, e a formação de milícias armadas por estes coronéis às vezes saia ao controle dos mesmos e resultava numa explosão sangrenta e sem sentido... Sem sentido até onde?

Tudo mudou quando por motivo de guerra entre a sua família e a de um coronel, bem como a perseguição da polícia, ligada a este mesmo coronel, fez com que o jovem Virgulino Ferreira entrasse para o bando do Sinhô Pereira, iniciando-se no movimento do Cangaço.

Isso mudaria de vez os rumos do Cangaço, pois este jovem Cangaceiro botaria ordem e justiça num meio onde o descontrole era regra.

Virgulino ganhou a alcunha de Lampião quando de um combate com a polícia, seus disparos eram tão rápidos que enquanto ele atirasse a luz dos disparos iluminavam a trincheira tal qual um lampião.

Lampião não foi o primeiro nem seria o último Cangaceiro, antes dele houve o bando do Sinhô Pereira, o bando de Jesuíno Brilhante, o bando de Antônio Silvino, Bando de Miguel Carlos, (Tio de Antônio Conselheiro) entre outros, mas o bando de Lampião ficaria gravado na história.

Em 1922 já liderava seu próprio bando correndo os sertões de Pernambuco, Ceará e Alagoas, tinha muito respeito e reverência á Padre Cícero, e sua noção de justiça era clara, sempre foi considerado um vingador das injustiças por quem quer que tenha conhecido a ele e aos seus feitos.

Existem muitos trabalhos escritos sobre a vida e morte de Lampião, mas em minha opinião os dois que merecem real atenção e crédito são: a obra “Lampião na Bahia”, do célebre escritor e pesquisador Oleone Coelho Fontes, e a obra intitulada “De Virgulino á Lampião”, da neta do próprio Cangaceiro, Vera Lúcia Ferreira, as duas obras traçam um perfil de Lampião que a meu ver é o mais próximo do real Cangaceiro destemido e justo que ele foi.

Sua história de amor com Maria Bonita reflete a verdade de suas lidas, a Cangaceira Dadá, mulher de Corisco, o Diabo Loiro, uma das poucas pessoas do Cangaço a sobreviver para contar a história, disse já velhinha em várias entrevistas que não havia amor como o do cangaço, que a vida era dura, mas que era doce e feliz quando a polícia não os encontrava, o amor é o testemunho real da verdade no bando de Lampião, existia ordem, princípios e honra.

Sim, é verdade que ele não poupava polícia, até porque os “macacos” como ele chamava, não poupariam ele; Lampião tinha sangue frio e era brutal, como todos os homens forjados na guerra, Lampião matava mulheres, sim, para ele inimigo não tinha sexo, cor, nem credo. Muitos absurdos foram criados com o nome do Cangaceiro, até porque, existiam muitos bandidos que se aproveitavam do respeito que este nome causava, e se apossavam desta alcunha para fazer mil atrocidades... E quem levava a fama?

Lampião jamais aceitou ou praticou o estupro, seus homens pagavam com a vida a esta atitude, ele inclusive ficava furioso quando lhe imputavam estas ações, e chegou a responder com carta ao governo que isso não era atitude de homem, por isso nem ele nem os seus o praticavam, e sim as volantes (forças policiais).

Em 1917, Lampião já tinha em seu comando, mais de cem homens, e ataca a cidade de Mossoró, este ataque seria o grande troféu do Cangaço. Anos depois o movimento comunista da Coluna Prestes avançava sertão adentro e o governo preocupado com a invencibilidade de tal coluna, pede a Padre Cícero que reúna outro bando invencível para dar combate aos sulistas revolucionários, o bando de Lampião; esta parte da história é pouco conhecida, mas fantástica como todas as histórias do sertão; Lampião aceitou o convite de visitá-lo em juazeiro do norte com seus homens em paz, foi, e foi tranqüilo, pois era o Apóstolo do sertão quem o estava chamando, o Padre Cícero contou a Lampião que o governo estava oferecendo o perdão para seus crimes, dinheiro, armas, munição e a patente de Capitão do exército para ele e outras patentes que poderiam ser dadas por ele aos seus homens; em troca Lampião e seu bando dariam combate á Coluna Prestes; Lampião reuniu o bando e ponderou que todas as ofertas do governo eram boas, menos o tal perdão, pois isso era impossível, ele sabia que tinha conquistado inimigos ferrenhos e que jamais deixaria de ser caçado, por outro ângulo, ele jamais daria combate á um inimigo de seu maior inimigo, o governo, ora! Ele tinha princípios! Estava decidido; foi ao Padre Cícero e o comunicou que aceitaria, alguns crêem que pela proximidade e boa relação entre Lampião e Padre Cícero o Cangaceiro tenha contado seu plano ao apóstolo.

Claro que aconteceu o que todos esperavam, Lampião recebeu o dinheiro, armas, munição e a patente de Capitão, pegou tudo e caiu no mundo.

Em 1932 uniram se os governos dos estados de Pernambuco, Bahia, Sergipe e Alagoas para lançar uma campanha contra o Cangaço, por conta disso as forças policiais estavam triplicando a dificuldade de movimentação do bando, forçando Lampião a desmembrar seu bando em três. Corisco, o diabo loiro, braço direito de lampião já vinha a certo tempo discordando das táticas do capitão, e depois disso rompeu de vez com ele e com o bando, Lampião deu lhe a patente de capitão e assim o Capitão Corisco passou a comandar seu próprio bando.

Mas todo reinado chega ao fim e assim foi com o Rei do Cangaço, em 1938, Lampião e seu bando são traídos e cercados em seu acampamento na Gruta do Angico em Sergipe, todos são mortos, acaba a vida de uma lenda.

Suas cabeças foram degoladas e expostas em praça pública, uma afronta à moral e à dignidade destes guerreiros que foram o inimigo mais audaz e respeitável das vergonhosas forças policiais nordestinas.

Porém, quando o Capitão Corisco soube da desgraça, chorou num lamento rápido e conclamando seus homens partiu para vingar o seu comandante, e assim Corisco vingou a morte do rei do Cangaço, matando um por um os matadores do bando e os traidores mesquinhos que entregaram Lampião às mãos inimigas; ponto para o Cangaço, pois Lampião e seu bando foram pegos dormindo, numa covarde traição, essa era a única forma que o governo tinha para derrotar o herói do sertão.

O bando do Capitão Corisco ainda permaneceu ativo e operante durante muitos anos, e só com sua morte é que o governo declarou o fim do Cangaço, e cá pra nós, agente que anda por esse meio de mundo, sabe que esse papo de fim do Cangaço é conversa fiada.

Depois de examinar as informações disponíveis, o que poderia dizer sobre o Cangaço...

Creio que a única forma de classificar o advento do Cangaço em minha opinião, é dizer que o Cangaço, foi, é, e sempre será o maior exemplo de reação popular já experimentado pelo povo brasileiro.

Luar do Conselheiro
Enviado por Luar do Conselheiro em 13/09/2008
Código do texto: T1175984