NA ENCRUZILHADA DA POESIA
Minas. Minas. “Doce País das Gerais”.
Nascido em 22 de março de 1913, em Aiuruoca, cidade do Sul de Minas Gerais, a 370 quilômetros de Belo Horizonte, José Franklin Massena de Dantas Motta viveu mais de meio século dedicando-se à poesia e ao direito.
Morreu aos 60 anos, em 9 de fevereiro de 1974, há portanto 30 anos, deixando-nos órfãos de sua companhia, mas não de sua obra: seu grande legado.
Seus primeiros estudos foram ministrados por sua mãe, dona Ana Dantas Mota, que à época era professora primária, concluindo o secundário no Colégio Sul-mineiro.
Dantas Motta cursou a Faculdade de Direito da Universidade de Minas Gerais, onde se formou em 1938. Em Belo Horizonte, com seus colegas de escola, participou da revista Surto, publicação lítero-cultural “com expressiva importância dentro da renovação das letras mineiras contemporâneas”. Assim, nesse caminhar, com passos de mineiro, devagar e sempre, fez cantar de poesia o chão bruto, das montanhas e das planícies das Gerais.
A bibliografia de Dantas Motta, pouco conhecida, parece estar esquecida entre rosas e flores nas rochas de Aiuruoca, sua cidade natal.
Já se estudaram, em Dantas Motta, o homem, o advogado, o escritor. Também o poeta, que nós, brasileiros e mineiros, sabemos pouco. Poeta de Elegias: o artista dos poemas formados de cinco e seis versos alternados. Poemas líricos, cujo tema é quase sempre terno e triste.
Não se diga ser essa poesia meramente causal. Escreveu seus textos na Revista Elétrica (na cidade de Itanhandu), dirigida pelo poeta Heitor Alves, que circulou pela primeira vez em maio de 1927.
Foi precisamente em 1932 que se viu publicado o primeiro livro de versos Surupango: Ritmos Caboclos, num misto de Brasil com África. O poeta modernista Heitor Alves considerava Surupango com obra telúrica, “poema do Brasil roceiro”. Já Eduardo Frieiro reconheceu no adolescente Dantas Motta “pouca idade e muito talento”, ao observar que sua obra se inseria na “escola da brasilidade”, cujos versos eram inspirados no folclore afro-brasileiro.
Registram as Efemérides da Academia Mineira de Letras, cuidadosamente compiladas pelos acadêmicos Oiliam José e Martins de Oliveira, homenagem de Mata Machado.
A profundidade e a extensão de seus poemas estão registrados na tese de mestrado do professor Luiz Carlos Junqueira Maciel, aprovada na década de 80.
Toda a verdadeira poesia, com suas modalidades e com vários de seus fatores, está nitidamente fixada nas Elegias do País das Gerais – Poesia Completa, em edição da Editora José Olympio, Coleção Resgate, nº 6, de 1988.
Versos regulares e irregulares; quase todos, senão todos, os gêneros poéticos: o heróico, o lírico, o descritivo, o bucólico, o satírico, o epigramático. Versos, puros versos, poesia, pura poesia, é o que sempre salta, vivo, das páginas vividas das Elegias. Alguns versos pontuados pela melancolia, descrença, quase não pela ironia, crítica e sarcasmo.
O crítico literário Sérgio Milliet, ao discorrer sobre a obra de Dantas Motta, assim se manifestou: “Você já leu Dantas Motta”?. Não tinha lido, e Mário de Andrade, observou: “Carece”. Carecia mesmo. Entretanto, à primeira leitura não me entusiasmei tanto assim. Parecia-me que o poeta juntava belos versos sem contudo chegar ao poema. Esses versos isolados eram porém tão excelentes que mais de uma vez pensei em Mallarmé. Mas eu desconfiava das paixões de Mário de Andrade, embora nunca o houvesse visto elogiar com ardor um escritor... Dantas Motta não hesitou em descer ao abismo mais pobre e mais perigoso, e o que de lá nos trouxe é de espantar, é de assustar. Mário de Andrade tinha razão: carece ler”.
Simples leitor e anotador, penso haver grifado, quanto baste à minha tímida iniciação, a transbordante, completa e contagiosa poesia de Dantas Motta, que está escondida, ainda, por todo este país das Gerais.
Nesta providencial encruzilhada encontram-se Minas Gerais e Dantas Motta, para a perpetração do milagre. Só em terras mineiras podia ser escrito Elegias, porque de terras mineiras nasceram os importante escritores.
Depois de 30 anos de seu passamento, e 91 de grande vida, possa sorrir, do lugar reservado aos justos, com a homenagem de reconhecimento e de saudade.
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Adriano da Silva Ribeiro, 26, graduado em letras e literaturas, é acadêmico do Curso de Direito pela PUC Minas Betim
Publicado no Jornal Estado de Minas – Caderno Pensar – 14/02/2004