SERMO 01 - O segredo da vitória

Se perguntarmos a qualquer pessoa, ou em qualquer auditório, “Quem quer vencer na vida?”, a resposta será unânime: todos vão levantar a mão e gritar: “Eu, eu!”. Os cursos de liderança, de marketing e de relações humanas, assim como a maioria de livros de motivação e auto-ajuda que existem por aí, todos não cessam de oferecer pistas e dar conselhos no sentido de tornar leitores ou participantes, autênticos “vencedores”. O que é para eles, ser um vence-dor? Para a maioria desses promotores, vencer na vida é ajuntar coisas materiais, casa, apartamento, automóvel, dinheiro no banco, casa na praia, fama, conquistar pessoas, etc.

Os materialistas afirmam que vencer e adquirir um bom futuro é ser fe-liz. Até aí tudo bem. Mas o que é ser feliz? Sob a ótica desses grupos, a felicidade se resume em amealhar coisas materiais, prazeres e honrarias. Só isto! Temos um futuro a preparar, e ele não é feito apenas de coisas materiais.

Há dias caiu em minhas mãos um DVD desses que visam fazer uma la-vagem-cerebral nas pessoas, de orientação esotérica universalista, do tipo de alguns que se vê nos canais Discovery e History Channel das tevês a cabo. Este trabalho era um dos tantos que tentam vender a imagem da existência de um “segredo”, no qual as pessoas aprendem a verbalizar seus desejos e, quase que imediatamente, estes se realizam. Misturando esoterismo e rudimentos de física quântica, os mentores do “segredo” trabalham com as idéias espiritualistas do retorno e da “lei da atração”.

Eu gosto de assistir essas manifestações, primeiro porque para poder criticar você tem que conhecer. Depois, a gente tem que conhecer as táticas com que os adversários se organizam e buscam assaltar os filhos de Deus. Pois naquele “segredo” preconizado pela produção do vídeo, o universo é mencionado como uma força suprema, cheia de energia e poder, capaz de escutar e realizar aquilo que as pessoas falam. Serão boas realizações se a verbalização se referir a coisas positivas. O mal acontecerá se a pessoa falar coisas negativas, do tipo “comigo nada dá certo”.

Pois o tal vídeo está repleto de entrevistas de “especialistas”, como filósofos, psicólogos, metafísicos, até um recreacionista (enterteiner) e outros menos votados, que, por quase duas horas, tentam fazer a cabeça dos expectadores no sentido de se submeterem à energia cósmica que, segundo eles, rege a terra, a vida e o futuro das pessoas.

Trata-se de uma tentativa forçada de explicar o bem e o mal, a sorte e o azar através de um raciocínio simplista, para não dizer simplório, de que tudo o que nos acontece está ligado àquilo que pensamos.

O mais risível nessa apresentação, é que os especialistas atribuem os fa-dos à impessoalidade cósmica. Em momento algum os escutei falar em Deus, na Providência Divina ou na misericórdia. Tudo é mecanicamente obtido atra-vés do poder do pensamento, como nas antigas programações de neurolingüís-tica. O curioso é que entre os especialistas há “doutores” sei lá em quem, desconhecidos membros de institutos mais desconhecidos ainda. É o tipo da armação organizada para seduzir incauto, ingênuos e pessoas deficientemente catequizadas e evangelizadas. Não havia teólogos nem místicos sérios entre os entrevistados. Apenas um dos painelistas tinha a titulação de “visionário”, o que, convenhamos, não credencia em nada o grupo.

Todos queriam convencer-nos que o caminho da felicidade passar pela sugestão e pela “atração”. O pior é que muita gente que consegue algum sucesso, vitória ou cura e – desprezando os dons do Espírito, especialmente o da “fortaleza” – atribui isto a si próprio, ao controle da mente ou ao pensamento positivo. Coitados deles!

Pois hoje eu pergunto a vocês: como é que se prepara um futuro de feli-cidade? Será que é cultivando a tal da “lei da atração”? Ou quem sabe as leis do “eterno retorno”? Lembram o que diz o adágio popular? “O futuro a Deus pertence!”. O que dizer dessas ofertas mirabolantes de felicidade e de vitória? Para mim é embuste! Mais que isto: abuso da ingenuidade do povo. Vou até mais longe: um caso de polícia! Como então achar a verdadeira felicidade? Para quem tem fé, ela está, como ensina o salmista, no Nome do Senhor, que fez o céu e a terra.

Desde o Antigo Testamento, a Bíblia está cheia de referências à construção de um bom futuro para os filhos de Deus. Falo em bom futuro, pois se não houver diligência em construir uma vida, ela pode desembocar em uma derrota, que ira caracterizar um mau futuro. Um porvir de trevas e decepções. Pois é nos textos antigos que vemos um bom conselho, no sentido de “não tenha inve-ja dos pecadores, mas viva sempre no temor de Javé, pois é certo que assim você terá futuro e sua esperança não fracassará!” (Pv 23,17s). A inveja do sucesso dos maus é nociva a quem deseja um bom futuro.

Nas mesmas águas, no Salmo 73 lemos que história de “um justo que sofre olhando a prosperidade do ímpio...”, quando ele começa a destruir sua fé. A comparação de um simples momento de vida, a inveja do sucesso de alguém que não vem à Igreja, por exemplo, ou a impunidade de um corrupto que enriquece do dia para a noite, isto acarreta para nós uma série de complicações no terreno espiritual, como, por exemplo:

1. murmuração contra Deus (ele não é Deus suficiente para meus

desejos);

2. quando compara seu momento de vida com a prosperidade do

ímpio você começa a desanimar;

3. o passo seguinte é desviar-se da fé.

Somente obedece a Deus quem reconhece seu senhorio e sente sua presença em todos os movimentos da vida. Se ele é o meu Senhor eu devo manter-me fiel ao que ele me diz. Ao cristão que deseja construir uma vida feliz cabe ser temente a Deus todo o dia, caminhando docilmente por seus caminhos, na direção do futuro. A partir dessa resolução, há questões a aprofundar:

1. você está no centro da vontade de Deus?

2. você está onde Deus quer?

3. você faz exatamente o que ele quer?

4. como você está construindo seu futuro?

5. você crê que a vitória nos chega pela misericórdia de Deus:

O segredo da vitória está em ser no temor de Deus. Nesse aspecto, ser é mais que estar. Ser no temor é ter amor de Deus entranhado em sua vida. Estar no temor pode ser algo provisório, transitório.

Para essa união com Deus é preciso avaliar a vida. Com quem você anda? O que você faz? Está disposto a se desviar do mal? É capaz de não viver no pecado todo o dia? (difere de pecar). O justo é enaltecido pelo salmista como um bem-aventurado:

Feliz o homem que não vai ao conselho dos injustos, não pára no

caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos zombadores.

Pelo contrário: seu prazer está na lei de Javé, e medita sua lei dia

e noite (Sl 1,1s).

O Salmo 1 que acabamos de ler nos revela que o segredo da vitória dos fi-lhos de Deus está em manter a integridade, o caráter, a decência na vida comum e na sociedade. Ser fiel às vozes do mundo é desprezar o ensino de Jesus. Vejamos o caso de um “produto pirata”. Se você se corrompe por causa de dez reais (o preço de um vídeo), se for político ou homem público, vai roubar milhões, deixando a dignidade em plano secundário.

Quem não é fiel nas pequenas coisas não o será nas grandes. Ao contrário, quem adota a ética cristã como norma de vida, não se amolda às estruturas do mundo, mas assume sua posição de cristão. Foi a esses (e a nós) que São Paulo falou: “Assim também vocês considerem-se como mortos para o pecado e vivos para Deus em Jesus Cristo” (Rm 6,11).

Hoje, sob os mais torpes motivos, os inimigos plantam noticias para denegrir, invadem uma casa ou uma empresa para criar um fato ou plantar uma prova, que depois é difícil desmentir. Quem atua assim não age no temor de Deus. Em muitos casos a polícia invade e depois não ocorre nada e a pessoa, mesmo inocente, fica difamada. A mídia, ao dizer que “fulano está sendo investigado” cai naquele denuncismo barato, movido por ciúme, ideologia, interesses comerciais ou inveja, que, mesmo sem provar nada, difama e denigre.

Ser no temor de Deus é ser íntegro em todas as circunstâncias. Se quero ter um bom futuro (social e espiritual) é preciso, como ensina São Paulo,

fazer tudo sem murmurações e sem críticas, para serem inocentes

e íntegros, como perfeitos filhos de Deus que vivem no meio de

gente pecadora e corrompida, onde vocês brilham como astros no ]

mundo, apegando-se firmemente à Palavra da vida.

(Fl 2,14-16a).

Em 1Jo 4,20 lemos que “quem diz que ama a Deus a quem não vê e deixa de assistir ao irmão, a quem vê, é mentiroso”. Ser no temor de Deus é ser soli-dário com o irmão, seja ele simpático ou antipático. Se não houver caridade, a esperança dele será defraudada e você, porque não foi solidário não terá um bom futuro no Senhor.

O segredo da nossa vitória espiritual está em relacionar-se com Cristo, como aquele que salva, liberta e resgata. Quando o véu do templo foi rasgado de alto-a-baixo (cf. Mt 27,51), Deus se revelou a mim. Passamos a nos olhar face a face através de Jesus.

A vitória, em muitos casos, subentende provação e, não-raro, sofrimento. Ao jovens que retornavam a Emaús, Jesus pergunta: “Será que o Messias não deveria sofrer tudo isto para entrar na sua glória?” (cf. Lc 24,26). Jesus, na preparação de sua vitória (a ressurreição) mostrou aos seus amigos que deveria sofrer para ser glorificado ao terceiro dia (cf. Mt 16,21).

No Getsêmani ele se entrega à vontade do Pai (26,39). Mesmo assim, num certo momento, Pedro tentou dissuadi-lo da missão, e Jesus chega a chamá-lo de Satanás (cf. v. 23). É preciso que sejamos determinados, pois sempre há gente querendo nos afas-tar de nossos propósitos.

Recordo que uma vez eu estava escrevendo um livro, uma história sociopolítica, e algumas pessoas aconselharam que eu não o es-crevesse, pois ia gerar polêmica. Não se deixe abater: seja determinado! Sempre haverá pessoas que irão contra uma viagem que vamos fazer, uma casa que vamos construir, um carro que queremos comprar. Há, também, quem tente nos dissuadir de nossos projetos de apostolado. Não se deixe abater! Vá em frente: há uma vitória reservada para você!

No entanto, como eu disse, há um preço a pagar pelas vitórias. São Pau-o, alguém que experimentou a vitória em Cristo, retrata isto de maneira bem clara, descrevendo uma de suas viagens: “Na verdade, quando chegamos à Macedônia, nossa pobre pessoa não teve um momento de sossego; sofremos toda a espécie de tribulação: por fora, lutas. por dentro, temores” (2Cor 7,5). Vamos ver o preço da vitória?

1. sofrimento

praticamente não existe vitória sem sofrimentos: “convinha

que o Messias sofresse para entrar em sua glória”;

2. desgaste

o segredo de se chegar à vitória é vencer o desgaste físico,

espiritu-al, as angústias e os palpites; sempre haverá

pessoas, amigos, pa-rentes, colegas que tentarão mostrar-

lhe caminhos diferentes, segredos fantásticos ou teorias

mágicas;

3. aprender nas derrotas

a derrota nos deixa dois ensinamentos: um negativo e outro

positi-vo; é salutar a gente estabelecer uma reflexão

profunda e séria pa-ra saber onde ocorreram os erros; você

está vivo? Pois lembre-se que Deus tem um plano para

você! Só os planos dele são eficazes e verdadeiros. Foi

derrotado? Talvez porque você foi incompetente, limitado,

preguiçoso, confiou demais nos outros. Entregue-se a Deus e

ele lhe dará a pista para a vitória!

É preciso acreditar em Deus e não nos deixarmos levar por essas fábulas que aparecem por aí, acenando com vitórias fáceis, curas assombrosas e riquezas inesperadas. Não se esqueça que pela “maior vitória” você não tem que pagar preço algum, porque já o pagaram por você. E isto não é segredo, é algo revelado às claras. Foi Jesus que, ante a vacilação de seus discípulos disse algo para eles que se aplica para nós hoje: “Tenham confiança, eu venci o mundo”. (Jo 16,33). Essa vitória sobre o mundo tipifica um senhorio sobre a morte, a doença, a descrença e todos os problemas da vida humana.

Na cruz Jesus, o Filho de Deus se imolou para que você tivesse uma vida em abundância, conhecesse todos os segredos do infinito e obtivesse a vitória. Jesus pagou o preço! Tanto que na hora da morte, antes de deixar pender a cabeça ele bradou: “Não tenho mais nada a fazer; o projeto do Pai está realiza-do!” (Consumatum est). A nós que recebemos o penhor da vitória de Cristo como uma graça, não cabe mais preço alguém. Não temos que pagar mais nada. Não há mais preço a pagar. Preço não, mas atitude sim! Que atitude ou atitudes são essas?

1. Crer que Jesus Cristo é seu Redentor

Mais que crer, é preciso ter fé que “todo o que nele crer não

irá perecer, mas terá a vida eterna” (Jo 3,16);

2. Arrepender-se

O principal elemento do arrependimento é a

sinceridade: “Portanto, ar-rependam-se e convertam-se para

que os pecados de vocês sejam per-doados” (At 3,19);

3. Converter-se

Converter-se é mudar de direção, de sentimentos e de

propósitos. De nada vale uma conversão de “discurso”,

apenas mudando as palavras. é preciso mudar radicalmente

as atitudes: “Convertam-se e creiam no evangelho!”

(Mc 1,15);

4. Confessar seus pecados

Não resolve eu bradar o nome do Senhor e continuar preso

ao barro dos meus pecados; é preciso confessá-los e

receber o perdão sacra-mental: “Se reconhecermos os

nossos pecados. Deus que é fiel e justo, perdoará nossos

pecados e nos purificará de toda a injustiça” (1Jo 1,9);

5. Obedecer a Deus

Não adianta dizer “Senhor, Senhor” e não fazer o que ele

manda (cf. Mt 7, 21). Só obterá a vitória (entrar no Reino

dos céus) quem pratica a vontade do Pai? “Quem diz que

conhece a Deus e não cumpre seus mandamentos é

mentiroso” (1Jo 2,4).

Para refletirmos mais tarde, depois do almoço, vou contar a vocês uma parábola; uma historinha meio besta, dessas que tiramos do cotidiano. Numa noite fria, a família se aquecia em frente à lareira, quando bateram à porta. A dona da casa foi abrir. Eram três anciãos, de barbas bem brancas, que pediam para entrar por causa do frio e do vento. Ela não os reconheceu: “Acho que não os conheço, mas devem estar com frio e com fome. Por favor, entrem, aqueçam-se e comam algo”. Um deles respondeu: “Não podemos entrar juntos”. A mulher quis saber o porquê. Um dos velhos falou: “Meu nome é Fartura, e apontou os outros dois: ele é o Sucesso e o outro é o Amor. Agora entre e discuta com sua família qual de nós vocês querem que entre em sua casa”.

A mulher entrou e falou ao marido que, arrebatado, disse: “Que bom! Vamos convidar a fartura”. O filho discordou: “Por que não convidamos o sucesso?”. A mulher pensou e disse: “Não! Vamos convidar o amor!”. Assim que o amor entrou naquela casa, os outros dois se levantaram e o seguiram. Surpresa a mulher perguntou: “Só convidei o amor e os outros dois entraram?”. Os velhos responderam: “Se você convidasse a Fartura ou o Sucesso, os outros dois ficariam de fora, mas como convidaram o Amor, onde ele for, nós iremos com ele. Onde há amor há fartura e há sucesso”.

A reflexão sobre a parábola nos levou a desvendar o grande segredo de nossa vida, capaz de nos levar à vitória. Que segredo é este? É o amor! A partir do amor de Deus nossa vida se estrutura, se torna próspera e nos traz sucesso. Não o sucesso do mundo, dos artistas, dos intelectuais ou das celebridades, mas o sucesso entre os santos, entre aqueles que buscam a santificação e se encaminham para a “cidadania do Reino”.

Não existe neste mundo nenhuma teoria secreta, tenha ela a coloração que tiver, que seja capaz de nos fazer felizes, curar doenças, trazer fartura ou ancorar algum sucesso. Tudo é passageiro, insuficiente e enganoso.

No meu estado, Rio Grande do Sul, lá nas colônias, existe um provérbio popular que pode colocar um fecho nesta nossa meditação:

Queres ser feliz um dia? Compra uma roupa nova!

Uma semana? Mata um porco!

Um mês? Acerta na loteria!

Um ano? Casa-te!

Toda a vida (e na outra)? Une-te a Deus!

A sabedoria popular ensina que só unindo-se a Deus o homem pode ser feliz por toda a sua vida (e também na futura). O amor, a fartura e o sucesso, vem de Deus, como um autêntico dom. O segredo da vitória está em descobrir no Reino dos céus a verdadeira luz e a felicidade perene.

O Reino dos céus é como um comprador que procura pedras preciosas. Quando encontra uma pérola de grande valor, ele vai, vende todos os seus bens, e compra essa pérola (Mt 13,45).

É desnecessário explicar o significado da pérola encontrada e de todos os bens que o homem possuía. Aí está o retrato da vitória e a radiografia da felicidade humana. Fora disto é fábula, fantasia ou coisa oca. Se não for blasfêmia e até heresia.

Para finalizar, queria me reportar a uma alocução da Virgem Maria transmitida a um dos jovens videntes, em Medjugorje, lá pelo ano de 1984. Ela serve para todos nós, especialmente para as pessoas que buscam “segredos” e “soluções” em lugares onde não há nada:

“Vocês buscam soluções em tantos lugares, teorias e ciências, e

não se satisfa-zem nem são felizes. Abram o evangelho!”

(Esta reflexão foi levada a efeito em um retiro de seminaristas na cidade de Apucarana, em 2000).