ACADEMIA LITERÁRIA GAÚCHA FAZ 14 ANOS

Quando o grupo de intelectuais liderado pelo Dr. José Moreira da Silva, em maio de 1994, resolveu criar uma academia, acatou uma novidade: os seus membros não teriam de ter, necessariamente, mérito literário e/ou notoriedade pública. Contrariava-se o exemplo e a prática da entidade mater do academicismo brasileiro: a Academia Brasileira de Letras. E esta tradição de seriedade literária assentada na cultura castiça vem sendo seguida pela maciça maioria das congêneres estaduais, no Brasil.

Para ser acadêmico da ALGA não seria necessário sequer ter livro publicado. Os postulantes teriam de ser, no mínimo, interessados leitores e terem gosto em conviver com os segmentos da população menos favorecida, traduzida pelos alunos das escolas públicas e privadas da rede escolar de ensino, e não só freqüentar as redações, rádios, emissoras de televisão e as páginas dos jornais comerciais e alternativos culturais.

Reconhecia o grupo que era necessário se agregar ao esforço de unir os vetores formadores do binômio Cultura e Educação através do vigor associativo, do trabalho difícil de campo, laboratório. O trabalho acadêmico se daria fora dos estreitos limites corporativos de uma academia, exceto a investidura acadêmica, que se daria aos moldes convencionais.

A rigor, a recém-criada nem precisava ter uma sede pra tomar o “chá das cinco”. Desejava-se o trabalho ativo pra que o sonho de fazer o Brasil crescer com alguma consciência de cidadania se tornasse verdadeiro e exeqüível. Reuniria os idealistas da prosa, do verso, da música e das ciências.

Sonhavam o que um dia os criadores das primeiras Feiras do Livro em Porto Alegre fizeram. Através do estímulo que o evento representava, oferecer produtos e serviços que produzissem leitores e se pudesse ver o que hoje ocorre: milhares de crianças e adultos mexendo nos balaios de saldos livrescos e levando obras para suas casas com um custo realmente menor que o costumeiro durante quinze dias ao ano.

Os fundadores acatavam o indicativo de que era preciso fazer leitores e estimular a criação literária nas escolas, nos grêmios estudantis, nos diretórios acadêmicos, através de ações integradas com os usuários dos serviços educacionais e outras entidades públicas ou privadas.

Todos os seus membros empossados são militantes do associativismo e o exercem nas suas entidades de origem, não só na ALGA. Esta prática faz com que a direção da ALGA não tenha pressa em empossar membros titulares nas cadeiras acadêmicas.

Quando o postulante chega à Academia Literária Gaúcha já vem com o serviço feito, comprovado e testado no ativismo cultural. A academia funciona apenas como o órgão de comunidade que recebe mais um obreiro para a lida, para a luta contra a inatividade e precariedade de alguns setores governamentais ou não.

Muitas ONGs têm recebido o apoio dos ativistas congraçados na ALGA, e conseguem atender melhor à sua destinação e compromissos, com mais funcionalidade no cenário do associativismo da capital e até mesmo no interior do RS.

Neste ano da graça de 2008, a ALGA completa quatorze anos. Uma novel entidade que vem cumprindo os objetivos que ensejaram a sua criação: o ATIVISMO CULTURAL E LITERÁRIO.

Que venham as novas posses acadêmicas previstas pela diretoria atual. Os galardoados não virão à busca de reconhecimento assentados na auto-estima ou na vaidade. Terão na sua mala de garupa os frutos das sementes levadas à terra lavrada. Em alguns casos já terão feito novos jovens ativistas com brilhantes trabalhos comunitários.

Mas uma coisa é certa: fazer um ativista cultural é tarefa que demanda tempo e paciência. A ALGA não os pretende fazer, mas somente revelar a quem merecer a láurea do trabalho feito.

O futuro dirá do acerto das escolhas neste sodalício sem vaidades onde se tem que chegar com as mãos já calejadas pela luta em favor do soerguimento da comunidade.

É tão forte o entrosamento entre os seus membros que a Poesia alumbra os espíritos. Parece que viver continua valendo a pena, como sugeria Fernando Pessoa. Vejam os versos que se seguem.

ANJOS NUMA NOITE SUJA

(poema a oito mãos)

Bom momento aquele:

a flor querendo nascer,

a seiva subindo o caule;

o amor navegando bandeiras

e o entardecer a descobrir tristezas.

Eu recomponho o mundo,

o quebra-cabeças.

A vida é um canto triste,

uma choça, uma lança

sem destino certo.

– Não há nada a colocar aqui.

– Tudo está dito!

A noite está suja.

– composto por José Moreira, Andréa Jerônimo, Joaquim Moncks e Ruth Telles, no “Restaurante Garcias”, em Porto Alegre, na noite de 28 de maio de 2003, comemorando os nove anos da ALGA.

ODE À ACADEMIA LITERÁRIA GAÚCHA

José Moreira da Silva

Eis a ALGA: menina, onze anos,

pronta para a primeira comunhão.

Tão bela no seu vestido de cetim,

Branco círio na mão, laço de fita.

Lentamente, som de música sacra,

para o altar do reconhecimento.

Aqui me tens, Senhor dos Mundos!

Chego na bagagem dos amantes.

Distâncias. Persistência, paciência...

Tolerância ajudou a caminhada.

Jamais sentei-me à mesa dos céticos.

Venci todas distâncias.

Incrédulos: mostrei-lhes

cruz de amor, fé, esperança.

Naveguei mares de tempestades,

calmarias. Ao fim e ao cabo,

Netuno acolheu-me nos abraços.

Chego finalmente à praia dos justos.

Acreditai: vós compondes braços,

pernas, cérebro. O meu tudo guarda

brinquedos da pré-adolescência.

Colho flores, embalo-me de sonhos:

luzes não se apagarão jamais.

Levai-me e adentrai-me

à colenda assembléia da palavra.

Os ativistas me levarão pela mão,

Letras presentes rabiscarão o futuro.

– refere-se à agremiação cultural e literária fundada em 12 de maio de 1994, em Porto Alegre, estruturada no modelo tradicional de 40 cadeiras. Os seus titulares têm de professar o ativismo cultural.

http://www.recantodasletras.com.br/artigos/1138513