VIVA O POVO BRASILEIRO! - João Ubaldo Ribeiro
O livro histórico e de ficção, VIVA O POVO BRASILEIRO, de João Ubaldo Ribeiro, marca uma nova era no estilo romance épico (se assim podemos caracterizar sua obra). Começa com a narração do episódio incrível da morte do jovem Alferes José Francisco Brandão Galvão, de apenas dezessete anos, morto por um tiro de canhão em Ponta das Baleias, cujo final, dá-se na mesma Ilha de Itaparica, com a morte do General Patrício Macário, ex combatente da guerra do Paraguai, na comemoração do seu centésimo aniversário.
Desde a resistência aos portugueses que se deu no Recôncavo da Bahia e na Ilha de Itaparica, o autor entremeia as figuras históricas de João das Botas e Madeira de Mello com o índio Caroba e suas filhas (canibais, com o hábito de caçar e matar portugueses para se alimentarem, deixando-os para banquetearem-se com os holandeses, cuja carne achavam mais gostosa), Nego Leléu, a guerreira Maria da Fé, Budião e outras figuras, barões e comendadores, além de citações de vários serviçais, escravos e escravas, bem como a genealogia das famílias, entrelaçadas num grande parentesco de um povo que vive na Bahia, mas representa todo o país.
O General Patrício Macário, filho de Amleto, braço direito do barão, que era dono de quase tudo na Ilha de Itaparica e na Bahia, cuja fortuna, após a sua morte por envenenamento, transferiu-se para o seu “fiel” empregado. Após a morte de Amleto, a família milionária migra para o Rio e São Paulo, mas a história se finda na Bahia, com a morte do General Patrício Macário em sua terra natal, Itaparica.
Detalhes do sofrimento dos escravos e dos índios, revolta dos negros em Salvador (Malês), pinceladas sobre a Farroupilha e a espetacular fuga do líder gaúcho, Bento Gonçalves, da prisão no Forte de São Marcelo, narração dolorosa de episódios da Guerra do Paraguai, a queda da monarquia e o advento da República, relatos sobre a destruição de Canudos e o desprezo do General Patrício Macário pelos expedientes de promoções de pessoas incompetentes a cargos importantes na República e o fato do exército massacrar o povo, quando deveria defendê-lo...
Referências importantes ao nosso mundo político, o jeitinho brasileiro, a mania de querer levar vantagem, a rapinagem, a malandragem, farinha pouca meu pirão primeiro, etc.
Ao lado de tudo isso, a palavra de ordem dos resistentes Maria da Fé (que o General Patrício Macário conheceu e por quem se apaixonou) – “Viva O Povo Brasileiro... Viva Nós...” que encerrava as reuniões da Irmandade da Casa de Farinha, guiados pela canastra, como o jargão que marcou a necessidade de auto-estima do nosso povo, oprimido e desprezado, inicialmente pelos portugueses e após a independência, oprimido e maltratado pelos próprios conterrâneos brasileiros, abastados...
Sem dúvidas é um tratado histórico misturado à ficção. Trata com requinte a religiosidade africana, evidenciando sucessivas reencarnações e o esclarecimento de muitas das suas divindades.
De início complexo, com o desenrolar dos fatos, vai-se tornando cada vez mais interessante, levando o leitor a apaixonar-se pelo texto, em exatas 673 páginas de magia, erudição prosaica e profundos conhecimentos da nossa cultura.
Por fim, a morte do General e o furto da canastra, que ele guardara por tantos anos, por três pivetes que acabaram entrando nas ruínas da Casa de Farinha e...
bem. Quem ainda não leu esta obra prima, que se apresse em fazê-lo, sob pena de passar pela vida sem compreender o porquê de muitas das nossas mazelas...