441 anos de Sepetiba – Comemorar e lembrar para evoluir?
441 anos de Sepetiba – Comemorar e lembrar para evoluir?
Toda história depende de sua finalidade social, por isso, alguns moradores mais antigos buscaram durante algum tempo transmitir de geração em geração pela chamada “tradição oral” ou pela ínfima crônica escrita a importante história do bairro de Sepetiba, hoje esse costume se perdeu, pois os moradores conhecedores e disseminadores da história do bairro infelizmente não estão mais entre nós, seus familiares mudaram-se para outros bairros e agora cabe aos historiadores profissionais essa divulgação, o que de fato não vem ocorrendo, pois falta interesse pela historicidade desta região específica, apenas o núcleo (NOPH) localizado no ecomusseu de Santa CRuz ainda interessa-se pelo assunto, e,as nossas crianças aprendem o que alguns educadores sem o estabelecimento de um projeto político pedagógico sério que envolva a comunidade, concluem que seja importante para o desenvolvimento das mesmas não dando a mínima importancia para a questão da identidade histórica da localidade. Por meio da história as pessoas comuns procuram compreender as “revoluções” e mudanças por que passam em suas próprias vidas: transformações sociais, guerras, mudanças de regime, mudanças de atitude da juventude, mudanças tecnológicas etc. Por meio da história local, um bairro ou uma cidade busca sentido para sua própria natureza em mudanças, em constante transformação e os novos moradores vindos de fora podem assim adquirir uma percepção das raízes pelo conhecimento pessoal da história. Por meio da história política e social ensinadas na escola, as crianças são levadas a “compreender” e a aceitar o modo pelo qual o sistema político e social em que vivem acabou sendo como é, e de que modo a força e o conflito têm desempenhado e continuam a desempenhar um papel nesta suposta evolução, ou seja, a escola foi e ainda é como disse Gramsci, um aparelho ideológico do estado, onde permanece a imposição das ideologias dominantes. No último dia 5 de julho algo inusitado ocorreu em Sepetiba, finalmente o aniversário do bairro que um dia seria elevado a grande província pelo então príncipe regente D. João VI foi devidamente comemorado, ocorrendo juntamente com o resgate da importância histórica do bairro uma grande ação social, muito embora alguns ainda tenham muito que aprender, pois não pudemos contar com a presença dos alunos da rede pública municipal de ensino para realização do desfile, devido a interesses particularistas e políticos, nossos alunos foram privados de fazer valer seus direitos como cidadãos moradores do local, não obtendo autorização para participarem do desfile em homenagem ao bairro, contudo, alunos de algumas escolas privadas do bairro não deixaram a data passar em branco e não só participaram do desfile que a frente contava com um dos moradores mais ilustres de Sepetiba, o “Seu Erasmo”, velho lobo do mar e ferrenho defensor das causas ambientais na região, como também visitaram os stands presentes na festa, como o da CORES, denunciando toda a degradação ambiental que há muito vem ocorrendo com a nossa baía, e com a região em geral, do GAPZO (CEDAE) mostrando como é realizado o tratamento da água que chega até os nossos lares e o stand sobre a história do bairro onde podíamos observar a partir da exposição de murais uma espécie de retrospectiva da importante história do bairro, bem como participaram da aplicação de flúor realizada pelo projeto RONDON dentre outras tantas atividades realizadas, além é claro do “parabéns” para Sepetiba, que teve direito a bolo, a premiação para os 15 desenhos mais criativos feitos pelas crianças presentes no evento e no final foram exibidas denúncias em forma de documentário sobre a situação calamitosa de nossa baía, como o documentário histórias de pescador dirigido por Ernesto Xavier e Clementino Júnior, onde a degradação da Baía de Sepetiba (RJ) é transmitida através da ótica do mais velho pescador da região, Seu Erasmo. Cabe aqui ressaltarmos que no dia 2 de setembro de 2007 ocorreu em Santa Cruz um desfile cívico em comemoração pelos 440 anos do bairro, com participação integral de escolas dentre outras instituições, pois contava com o apoio do então prefeito César Maia e de seus “seguidores”, infelizmente em nossa região as coisas funcionam desta maneira, tudo é feito à base da conivência e da conveniência, ninguém está interessado no bem estar e satisfação dos moradores e admiradores do bairro. Não posso aceitar isso, claro que o bairro de Santa Cruz tem tanta importância histórica como o nosso, afinal a ponte mais antiga da cidade encontra-se lá, construída pelos jesuítas ainda no século XVIII, lá encontrava-se a fazenda real etc, porém estes patrimônios históricos foram mantidos e até certo ponto preservados, o que não ocorreu com nosso bairro, o cais, os fortes, a casa da esquina, a própria fachada da igreja de São Pedro inaugurada em 1895 se não me engano, nada disso foi preservado, aliás, me surpreendi ao ver que a grande maioria dos moradores não tinha conhecimento destes fatos, nem mesmo da tragédia de 6 de Setembro de 1893, o fuzilamento de 21 marinheiros na então ilha da pescaria, por que isto ocorre com esse bairro?. Exaltar a memória local não é algo sem validade, sem relevância, é algo muito importante, pois possibilita aos moradores conhecer um pouco mais a localidade onde moram e assim valoriza-la devidamente, estamos em pleno século XXI, vivemos em um mundo pós-moderno, e, como a mesma caracteriza-se cabe perfeitamente neste pequeno desabafo, pelo aumento frenético da velocidade de informação, a compressão dos entendimentos de tempo e de espaço, bem como pelo desinteresse pela história e pelo resgate da memória e da identidade histórica de determinadas regiões, ocorre fragmentação e descontinuidade, e conseqüentemente desmobilização, que podemos perceber claramente no caso de nosso bairro, desinteresse das populações locais para com a questão da preservação de patrimônios históricos, culturais, e acredito que estas transformações estão conduzindo a sociedade ao estabelecimento da chamada “amnésia coletiva” (Hanna Arendt, 1968), trazer a memória a baila significa romper com o processo de alienação, em minha concepção, restituindo assim a identidade dos sujeitos históricos (Pacano), de acordo com Pacano, a memória enquanto reconstrução do passado no presente e/ou enquanto determinações do passado sobre o presente pode tanto “escravizar” como “libertar”, a lembrança e o esquecimento, manifestações da memória dos indivíduos, só adquirem real significado e mais amplo se analisados na especificidade do contexto histórico de sua construção passada e de sua narração presente. Como conseqüência, debruçar-se sobre a memória não significa a reconstrução integral de como teria sido o passado, pois este já foi, mais sim a presença deste no presente, consciente ou inconsciente (Pacano). Observa-se como os moradores de Sepetiba foram manipulados e, até hoje o são, pelas autoridades que nunca se interessaram pelo resgate da história local, visando apenas eleger-se e/ou algum outro tipo de vantagem sobre os indefesos, despolitizados e muitas vezes alienados moradores de Sepetiba. Segundo Pollak podemos dizer que a memória é um elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual como coletiva, na medida em que ela é também um fator importante do sentimento de continuidade e de coerência de uma pessoa ou de um grupo em sua construção de si, acredito que a maioria dos males causados ao bairro de Sepetiba e conseqüentemente a sua população estão relacionados direta ou indiretamente ao fato de que a grande parte da população local não possui este sentimento de continuidade e de identidade com o local, direcionado é claro a importância histórica do mesmo. É muito triste concluir que não ouve interesse por parte das autoridades e dos moradores responsáveis (líderes)em manter essa história viva, não é justo que isso ocorra com nosso bairro, que nossas crianças e adolescentes tenham vergonha de dizer que moram em Sepetiba, porque são expostos a exclusão social e cultural total, a péssimas condições de transporte e não possuem nenhum motivo para orgulharem-se de morar neste Oásis em meio a toda correria do mundo urbano. Por isso este evento foi realizado, objetivando o resgate de nossas raízes, da auto-estima dos moradores e, é claro ao contrário do que alguns nos disseram, temos sim o que comemorar, pois mesmo em meio a todo descaso, degradação e esquecimento, alguns ainda lutam fervorosamente por nosso bairro, buscam enaltece-lo, eleva-lo, melhorar as condições de vida dos moradores, conscientizar as crianças e adolescentes, e mesmo com tudo isso, se nos dirigirmos a praia de Sepetiba, em um belo dia sol, no final da tarde, podemos ver como ainda é bela muito embora tão degradada e o porque de a família real e a elite carioca ter escolhido este recanto por muito tempo como seu balneário preferido.