Ética e moral. Conceitos distanciados do povo?
A ausência de ética e a não aplicação dos valores morais constituem uma enfermidade a contaminar e, silenciosamente, fazer definhar a honra de parcela expressiva da sociedade brasileira, notadamente aquela que empolga o poder em suas variadas formas.
Não há neste País pessoa ou instituição que não tenha sido aviltada pela carência de sentimentos enobrecedores, como a solidariedade, o espírito de companheirismo, a fidelidade, o amor ao próximo e a honestidade, atitudes coerentes e respeitáveis, que sempre constituíram marcas da dignidade dos cidadãos de bem.
Ao contrário do que pensa a sociedade, os políticos nada mais são que frutos de um contexto social desprovido desse respeito e de valores morais, onde a barganha inconfessável transformou–se em moeda forte dos inescrupulosos ávidos pelo poder. O voto transmudou–se de um direito de cidadania em a mais fácil porta de acesso à indignidade e à velhacaria. Exaltem-se os não raros homens que perseveram no culto da honra, mudos ou silenciados, posto que a política, em nossos dias, despiu–se da decência. O procedimento social desonesto sufoca o homem de bem , que enfrenta as conseqüências desse mal que grassa sem respeitar limites e chega aos pontos mais longínquos deste País.
Diziam os antigos que “a língua era o chicote do corpo”, o próprio veneno que maculava o homem e o levava ao descrédito. Hoje, ao contrário, é ela que promove os iníquos. Dizia–se até que “em casa que não tem pão, todos gritam e ninguém tem razão”. Entretanto, agora, troca – se o pouco de pão que resta pelo voto inconseqüente e descompromissado, alheio ao modelo de cidadania atuante, participativa e crítica. Por omissão ou desalento, escasseiam eleitores como os de antigamente.
De outra parte, vive–se num contexto de perguntas sem respostas. Onde se encontram os homens de bem, voltados ao sublime cumprimento do dever em prol da nação? Em que planeta se escondeu o sentimento de amor à Pátria e o respeito pela dignidade humana?
Deparamo-nos com um povo aguilhoado pela vergonha da escolha mal feita, enlameado pela falta de decência e dignidade de seus escolhidos, que insistem em enodoar os poderes da República. É a era do nepotismo e da usura, onde a falta de caráter deixou de ser exceção. Vivemos um período em que os demolidores da ética não mais se contentam com o ocultar de verbas nas vestes mais íntimas. Julgam melhor acolher o fruto da desonra e da fraude no próprio reduto doméstico, onde, supostamente, repousa a esfinge da imoralidade.
Por outro lado, o cidadão correto, de conduta ilibada, vê-se defenestrado do aparelho estatal, doutrinariamente a ele privativo, no qual sempre se houve com altivez, nos mais diversos escalões do poder. Não faz parte, por sua retidão de caráter, do mundo atual, onde a licenciosidade rompeu com o recato e pudor da função pública. Mundo em que a verdade perdeu a razão de ser, por absoluta impropriedade e inadequação, no repugnante covil dos iníquos. Tempo no qual se justapôs a infâmia e o destemor pela justiça, instituiu-se o verdadeiro “toma lá da cá”, não se cultuam valores, mas pratica-se a mais desabrida bandalheira. Tudo isso porque a consciência não tem voz e, em conseqüência, deixou de ocupar o lugar que lhe é devido, abrindo-se privilegiado espaço para os apadrinhados, mancomunados e apaniguados, que desfilam felizes, guardados pela alcatéia da imoralidade.
Enquanto isso acontece, a ética e a moral gemem num canto obscuro de uma sociedade enferma, anêmica pela ausência de brio e dignidade, onde a incúria reina livre e audaciosa, a impunidade é a regra e os princípios éticos tornaram–se ficção. A moral decaiu e, ainda relutante, luta para não esvanecer no tempo.
Vivemos à espera dos homens de bem, dispersos e ausentes, para repelir a invasão dos escroques que comandam e direcionam o poder.
Espera–se que esses homens de bem não hesitem em se posicionar diante de tanta mazela e descalabro. Nisto repousa a consciência do voto, como verdadeira arma contra o mesmismo.
A sociedade anseia por um líder, que, com astúcia, integridade e compromisso democrático, remova os corruptos da vida pública. Espera menos leis e mais ação, menos leniência e mais cobrança. Não busca um ser sobrenatural, mas alguém que seja apenas um exemplo de virtudes e que, em nome da honra e do verdadeiro amor ao Brasil, possa defendê–la desses sórdidos personagens e seja capaz de restabelecer o respeito ao próprio homem e ensiná-lo a não ser seu próprio lobo.
Espera–se muito pouco, apenas alguém que acredite no retorno da ética e da moral. Não ansiamos por atitudes épicas e avassaladoras; queremos apenas que se estabeleça o primado dos princípios republicanos. A necessidade nacional é de supremacia dos homens honrados, incapazes de negociar a nossa dignidade, que não estejam imersos no lodo da ambivalência de caráter. Precisamos, sim, de homens probos, que não se prostituam por uma tapinha nas costas ou a promessa de dinheiro fácil, como sempre, em detrimento dos desafortunados. Queremos a volta do sonho de liberdade, a proteção de nossas reservas, queremos de volta o orgulho de sermos apenas brasileiros!
Cleuza Ribeiro dos Santos ** Teacher
* Cleuza Ribeiro dos Santos é advogada, membro da Comissão OAB/MULHER, Coordenadora de Assuntos Culturais da ADESG/JF, Professora de Direito Penal, Processual Penal e Direito Administrativo.
Juiz de Fora ,25/06/2008