A INCLUSÃO DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA NA ESCOLA, SOB O PONTO DE VISTA DA PSICOLOGIA E DE UMA PSICÓLOGA!
A integração dos portadores de deficiências tem sido a
proposta norteadora e dominante na Educação Especial,
direcionando programas e políticas educacionais
e de reabilitação em vários países, incluindo-se o Brasil
Elaborada em 1972, na Educação Especial, por um grupo de
profissionais da Escandinávia, essa proposta baseou-se no princípio de normalização que apregoa que todas as pessoas portadoras de deficiências têm o direito de usufruir de condições de vida o mais comum ou “normal” possível, na sociedade em que vivem garantindo assim seu direito de ser diferente e de ter suas necessidades reconhecidas e atendidas
pela sociedade.
A inclusão exige a transformação da escola, pois
defende a inserção no ensino regular de alunos com quaisquer
déficits e necessidades, cabendo às escolas se adaptarem
às necessidades dos alunos. Ou seja, a inclusão acaba
por exigir uma ruptura com o modelo tradicional de ensino poder integrar o portador de deficiência à sociedade e poder se desenvolver e exercer sua cidadania.
Na prática inclusiva, no entanto, percebe-se que mesmo aqueles
alunos que se encontram inseridos no sistema regular de
ensino continuam sendo isolados dos seus companheiros de
turma não-deficientes e, de certa forma, rejeitados pela escola e professores. Isto tolhe a oportunidade deles desenvolverem amizades e de se socializarem.
Sabe-se que uma das formas de desenvolvimento psicológico do ser humano é por meio das brincadeiras entre os colegas de escola, pois é o grupo o principal protagonista na determinação da personalidade adulta de uma criança e é seu principais agente socializador. É entre seus colegas de grupos, depois da família, na percepção das semelhanças entre o eu e o outro, que a criança inicia seu processo de identificação, processo este fundamental para construir uma imagem de si mesmo. E uma boa auto-imagem que a pessoa constrói , define seu amor próprio e segurança para aceitar-se como elemento querido de um grupo e poder construir uma verdadeira cidadania.
No entanto, há algo complicado neste convívio social: a percepção de que nem todos somos semelhantes. Assim, as diferenças dentro do grupo tendem a manifestar reações muito agressivas entre os “iguais”.
Para manter a identidade e a coesão do grupo, as crianças
usam diversos métodos, às vezes cruéis, de exclusão das ditas crianças diferentes. Surgem, assim, as críticas e ridicularizações dos “bobos ou palhaços” do grupo, que as vezes se tornam o “bode expiatório” ou o BULLING do grupo (pratica perversa entre os jovens para humilhar, intimidar, ofender, agredir estigmatizam e traumatizam crianças e jovens).
Existe um texto de Freud, no seu livro Mal Estar da Civilização, 1929-30, chamado narcisismos das pequenas diferenças. Nele, Freud examina as contradições produzidas por uma cultura que exige a repressão (o recalque) das tendências destrutivas /agressivas dos sujeitos em nome da felicidade coletiva. O narcisismo tolera mal a convivência com o diferente – mas suporta menos ainda o confronto com o minimamente diferente, ou seja aquele que ameaça o campo das identificações - daí o caráter totalmente reativo ao mandamento “ama ao próximo como a ti mesmo”. Aqui ele, ironicamente, diz que se o altruísmo fizesse parte da natureza humana não teria sido necessário se inventar um mandamento para nos convencer a amar ao próximo.
Supomos então que o ser humano precisa de leis e, principalmente, de EDUCAÇÃO, para desenvolver sentimentos mais nobres e não se destruir enquanto civilização. No caso da inclusão do portador de deficiências nas escolas, este projeto estará fadado ao fracasso, se a própria escola, seus diretores e professores não estiverem conscientes de seus próprios preconceitos e fizerem um trabalho psicológico de elaboração deles.
A aceitação do diferente é trabalhoso e exige uma auto observação e análise de seu próprio narcisismo. Sabemos que o narciso só aceita o espelho, o que lhe é semelhante e isto é uma das principais causas da violência, ódios e guerras entre os humanos. Ver e aceitar o outro diferente de si mesmo, é um trabalho hercúleo, porém necessário para o exercício da cidadania, o enriquecimento de si mesmo enquanto sujeito e evolução do ser humano. Este trabalho, de altruísmo e amor fraterno, deve começar em casa na relação com os pais, depois na escola, com professores conscientes do sentido de alteridade, e depois na sociedade como um todo.
Pressupõe-se que a proposta de inclusão escolar de crianças com necessidades educativas especiais procura evitar os efeitos deletérios do isolamentosocial dessas crianças, criando oportunidades para a interação entre as crianças, inclusive como forma de diminuir o preconceito. Não obstante, nada disso funcionará, se o próprio educador não for o primeiro a dar o exemplo de aceitação do diferente.
Marisa Queiroz, é psicanalista, membro efetivo da Sociedade de Psicanálise da Cidade do Rio de Janeiro, RJ