GANGA ZUMBA.... Herói ou traidor?

GANGA ZUMBA – HERÓI OU TRAIDOR?

POR ABILIO MACHADO

Jornalista revê a figura de Ganga Zumba dentro da história do quilombo dos Palmares.

Um dos pontos a ser revisto na história do negro no Brasil é a figura de Ganga Zumba, retratado erroneamente como traidor do Quilombo dos Palmares. Há gente que até para qualificar no Movimento Negro, quando um companheiro, trai a causa, ele seria um “Ganga Zumba” – uma espécie de Joaquim Silvério dos Reis – o delator da Inconfidência Mineira. Mas essa leitura é correta?

Ganga Zumba não tem sua origem explicada oficialmente. Fisicamente é descrito como um homem alto e de forte constituição física. Há quem diga que seja oriundo do povo jaga, sendo um membro de uma dinastia liderada pela princesa Aqualtune e enviado escravo para o Brasil.

Aqui conseguiu fugir e chegar ao conjunto de quilombos no futuro denominado de Palmares no ano de 1630. Passa algum tempo ajudando na organização da população e nas lutas de resistência do local e incursões de libertação de africanos escravizados, ganha renome e a liderança.

Há teorias que Ganga Zumba vem a suceder a princesa Aqualtune na liderança da comunidade. Há outros que afirmam que ele seria o sucessor de Ganga Zona - seu irmão. Ainda sobre sua família, o líder teria como irmã, Sabina – provável mãe de Zumbi.

De origem jaga, povo guerreiro D Angola, ele organiza as tropas dos quilombos e passa a lutar em estilo de guerrilha, nunca buscando o confronto frontal com as tropas enviadas para destruir a comunidade e atacando pelos flancos. Além disso, Ganga Zumba ordenava o recuo momentâneo da população das habitações para evitar a captura.

Ganga Zumba também se mostra um articulador político, quando organiza os vários povoados num só comando central, com o treinamento de tropas regulares para defesa dos quilombos. O poder é hierarquizado com ele no topo e vários outros chefes abaixo comandando cada um, seu povoado, mas com as decisões tomadas em um colegiado.

Há também a divisão de tarefas e a criação de um código interno de conduta, que punia severamente a traição ou covardia nas lutas de resistência. Nessa liderança forte e centralizadora ele eleva o conjunto de quilombo ao nível de um reino africano, encravado dentro do território do Brasil.

De fato agiam como nação independente, pois dentro desta confederação de quilombos havia até uma língua própria – o quimbundo, original da D Angola, hoje ainda fala em regiões de Angola e Moçambique.

Outra inovação foi o estabelecimento de relações comerciais com as populações dos vilarejos, da região circunvizinha do conjunto de quilombos; numa relação de troca de produtos excedentes da produção agrícola e artesanal da comunidade quilombola com itens necessários. No quilombo era produzido feijão, milho, batata-doce, mandioca, cana-de-açúcar, algodão, fumo e banana. No local também era praticada a caça e a pesca para aquisição de carne.

Dessa troca também se estabeleceu uma rede de informações, que dava a comunidade quilombola informação sobre tropas enviadas para sua destruição. Com base nesse dado adicional, conseguiam antecipar a estratégia e surpreender o adversário.

É necessário analisar que este tipo de organização se repete na resistência a invasão portuguesa em Angola, no mesmo período por comunidades jagas protegidas por fortificações também denominadas kilombos. Na ilha de São Tomé, também é registrada a mesma forma de luta, lá chamada de angolares. E no Continente Americano é registrado focos de povoados predominantemente formados por ex-escravizados na Jamaica e no Suriname.

Sob o reinado de Ganga Zumba o Quilombo dos Palmares resiste a mais de 30 expedições militares, tanto holandesas, quanto portuguesas, pois a nenhuma das nações que dominaram o Brasil no período interessava a manutenção dele. Numa dessas tentativas, a mãe de Zumbi, é morta e ele levado prisioneiro, ainda criança e entregue ao padre, só conseguindo escapar com quinze anos idade e batizado de Francisco. Como cativo de um religioso, Zumbi tomou contato com o latim - língua oficial da Igreja Católica, adquirindo conhecimento para ler e escrever.

Os principais ataques foram em 1644 de Baro, em 1645 de Blaer Rejmbach, em 1654 contra os Batavos. Em 1667, o mestre-de-campo Zenóbio Accioly de Vasconcelos consegue surpreender Ganga Zumba, atacando pela retaguarda e faz o primeiro do reconhecimento tático do local, que ajudaria em muito as futuras investidas. Mas Vasconcelos apenas destruiu parte da produção agrícola.

Entre os anos 1671 a 1677 são organizadas expedições menores para enfrentar os quilombolas. Dessa se registra em 1671, dirigida pelo Capitão André da Rocha, organizada pelo herói da guerra contra os holandeses, Francisco Barreto. Ganga Zumba submete Domingos Gonçalo, em 1672 a uma derrota humilhante onde seus homens fugiram ante o ataque intenso dos quilombolas. Outro derrotado no mesmo ano foi Jacome Bezerra, oriundo de Alagoas.

Com a crescente fama criada pelos os guerreiros de Palmares, a elite da época começou a organizar melhor sua luta contra o foco de resistência a escravidão. Em 1675 a grupo de Manuel Lopes conseguiu matar mais de 800 moradores.

O homem que vira mudar a sorte de líder do quilombo foi Fernão Carrilho, experiente exterminador de quilombo. Tinha em seu currículo a eliminação de dois no estado de Sergipe, com requinte de crueldade. Em 1676, os dois se enfrentam com vitória de Ganga Zumba.

Mas em 1677, Carrilho consegue dinheiro e número de homens suficientes para travar com o líder de Palmares uma luta a seu estilo- também em guerrilha – formando pequenos grupos, atacando e isolando determinados povoados de Palmares. Na última investida, ele consegue o que tanto ambicionava: captura dois filhos do rei: Zambi e Acaiene, juntamente com dois chefes militares, Acaiúba e Ganga Muíça.

Nesta batalha, o líder, é ferido e ainda perde um filho, Toculo.

Mesmo com parte da família em poder dos adversários, Ganga Zumba mantém os ataques às fazendas libertando mais negros e causando desacreditando assim o poder da elite.

Em 1678, o governador Pedro de Almeida, faz um sinal de paz, oferecendo de volta os parentes do rei, sendo eles portadores de uma proposta de paz. A oferta divide as lideranças: de um lado Ganga Zona – irmão do rei que propõe o inicia das negociações; de outro lado Zumbi – o mais novos dos chefes, que desconfia das intenções dos portugueses.

O debate não foi só de liderança: dentro das comunidades de Palmares, haviam os que estavam cansados dessa guerra, pois a cada investida, produção, casas e pessoas morriam. Um acordo de paz, mesmo que não eterno, seria um período bem vindo de reagrupamento e rearticulação do povo. Outros eram contra, principalmente os mais jovens e os recém chegados, pois desconfiavam que os portugueses quisessem o mesmo – tempo para se fortalecerem e atacar Palmares com toda carga.

Entretanto as duas linhas de pensamentos sabiam que o fim de Palmares seria questão de tempo, pois tinham consciência que só a existência dele, encorajava os escravizados a lutar e fugir. No fim, venceu a posição de ir até Recife, com uma delegação de 15 pessoas para tratar os termos com acordo.

A atitude de Ganga Zumba não é traiçoeira com a causa, ele pensa na sobrevivência do reino clandestino que lidera. Contemporâneo a ele a rainha N`Zinga Mbandi também faz acordo com os portugueses para obter a paz e o fato se repete também em outras localidades da África e da América.

Foi oferecida no acordo, a possibilidade de manutenção do status de território independente, a continuidade da relação comercial com as cidades e vilas circunvizinhas e liberdade para aqueles nascidos em Palmares.

A exigência de que as pessoas fugidas de senzalas, e os que futuramente se dirigissem ao território, deveriam obrigatoriamente ser entregues as forças oficiais de Portugal, representado pelo Governo de Pernambuco, foi o estopim da divisão do povo palmerino e da ascensão da liderança de Zumbi, radicalmente contra a idéia.

Ganga Zumba também não aceita a principio as condições, mas tenta com seu grupo provar que era a chance para um período de paz e recuperação de Palmares. É vencido no debate e parte com parte dos moradores para o Cacau – local destinado pelo governador de Pernambuco, a quem aceitasse o tratado de paz.

Lá chegando o rei percebe que as terras são inférteis e aquém das condições necessárias para manter a comunidade. Descobre ainda que não seria um território livre e sim um campo de prisão, onde ele é mantido sob vigilância constante em clima de pouco respeito e beligerante.

O desfecho da vida do líder tem várias versões. Uma linha defende que ele foi morto por partidários de Zumbi, por ainda exercer uma liderança forte e impedir o comando total do herdeiro de Aqualtune. Outros dizem que Ganga Zumba foi morto por seus liderados quando perceberam que o Cacau era uma prisão e seriam feitos novamente escravos se ali ficassem. Outros dizem que ele teria se matado ao entender que tinha sido enganado pelos portugueses. E uma ultima versão mais digna que ele teria solicitado a Zumbi para salvar o povo que estava com ele e na fuga teria sido morto pelos portugueses.

Ganga Zumba, ou Grande Senhor, foi o primeiro líder do Quilombo dos Palmares, governando entre 1670 e 1678. Foi o antecessor de seu sobrinho Zumbi. Ganga Zumba foi o primeiro líder do Quilombo dos Palmares, ou Janga Angolana, no atual estado de Alagoas, Brasil. Zumba era um escravo que escapou do cativeiro nos canaviais e assumiu uma posição como herdeiro do reino de Palmares e o título de Ganga Zumba. Apesar de alguns documentos portugueses lhe darem este nome e o traduzirem como "Grande Senhor", ele provavelmente não está correto. Entretanto, uma carta endereçada a ele pelo governador de Pernambuco em 1678, que se encontra hoje nos Arquivos da Universidade de Coimbra, chama-o de Ganazumba, que é a melhor tradução de Grande Lorde (em Kimbundu), e portanto o seu nome correto.

Os quilombos ou mocambos eram refúgios de escravos foragidos, principalmente de origem angolana (Angola), que se refugiavam no interior do Brasil, principalmente na região montanhosa de Pernambuco. À medida que seu número foi crescendo, eles formaram assentamentos chamados de "mocambos". Gradualmente diversos mocambos se juntaram no chamado Quilombo dos Palmares, ou Janga Angolana, sobre o comando do Rei Ganga Zumba ou Ganazumba, que talvez tenha sido eleito pelos lideres dos mocambos que formavam Palmares. Ganga Zumba, que governava a maior das vilas, Cerro dos Macacos, presidia o conselho de chefes dos mocambos e era considerado o Rei de Palmares. Os outros 9 assentamentos eram comandados por irmãos, filhos ou sobrinhos de Gunga Zumba. Zumbi era chefe de uma das comunidades e seu irmão Andalaquituche comandava outra.

Por volta dos anos de 1670 Ganga Zumba tinha um palácio, três esposas, guardas, ministros e súditos devotos no "castelo" real chamado "Macaco" em homenagem ao animal que havia sido morto no local. O complexo do castelo era formado por 1.500 casas que abrigavam sua família, guardas e oficiais que faziam parte de nobreza. Ele recebia o respeito de um Monarca e as honras de um Lorde.

Em 1678, Ganga Zumba aceitou um tratado de paz oferecido pelo Governador Português de Pernambuco, o qual requeria que os habitantes de Palmares se mudassem para o Vale do Cucau. O tratado foi desafiado por Zumbi, um dos sobrinhos de Ganga Zumba, que se revoltou contra ele. Na confusão que se seguiu Ganga Zumba foi envenenado, muito provavelmente por um dos seus, por fazer um tratado com os portugueses. Os que se mudaram para o Vale do Cucau foram reescravizados pelos Portugueses. A resistência aos Portugueses continuou com Zumbi.

É complicado estabelecer em cima disso, os estereótipos de herói para Zumbi e traidor para Ganga Zumba. Nem é certo também usar a visão inversa de que o primeiro tinha razão e o acordo seria bom e Palmares sobreviveria até os dias de hoje, igual aos mais de 2 mil quilombos ainda existentes.

Palmares era grande e organizada demais para ser tolerado como território independente. Seria uma verdadeira Aruanda - paraíso negro, dentro de um país dominado pela escravidão. Sem contar que o preço do africano escravizado estava elevando por causa da dificuldade ocorridas na África, onde ao contrário do que dizem alguns historiadores havia resistência. Além disso, para lá iam também todo tipo de pessoas fugindo da tirania da coroa portuguesa: caboclos, mulatos, índios, e brancos pobres. Seria pelo tamanho da população sempre uma ameaça a escravocracia vigente.

Essa divisão permanece até hoje, devem os negros, optar por acordos com a elite para a real promoção da igualdade racial ou serems adeptos da tática de freqüente enfrentamento usada hoje pelo MST.

Só o futuro dirá quem está certo.

Recomendações bibliográficas:

- História do Quilombo no Brasil - Flavio dos Santos Gomes e João José dos Reis

- Rebeliões da Senzala – Clovis Moura

- O Negro no Brasil – Julio Chiavenato- Ed. Brasiliense.

- Palmares- A Guerra dos Escravos – Décio Freitas

- Bantos, Malês e Identidade Negra – Nei Lopes – Editora Forense Universitária.

-Wikipédia.