A RESISTÊNCIA DAS TRADIÇÕES EM MODERNAS 
                               NARRATIVAS  AFRICANAS
                                
                                                                     
Carmen Lucia Tindó Ribeiro Secco - UFRJ

Concebendo o mar como um “espaço de fronteira” que, metaforicamente, reflete o hibridismo cultural de países colonizados por Portugal, pretendemos, a partir da análise dos livros A Varanda do frangipani, do moçambicano Mia Couto, e Rioseco, do angolano Manuel Rui, investigar de que maneira a moderna ficção africana em língua portuguesa problematiza a questão da perda das tradições nos tempos “pós-coloniais”. Os romances selecionados para estudo tecem, respectivamente, uma leitura alegórica de Moçambique e de Angola dos anos 90. [...]


                           VIEIRA, O PREGADOR DA PALAVRA
 
                                                                  Cláudia Cristina Couto - PUC-Rio

            O olhar, este instigante sentido, dos cinco, o mais penetrante, o mais agudo. Luz dos olhos, “centelha divina” a guiar-nos por insondáveis caminhos, está ele, nos sermões de Vieira, a tentar-nos, a fazer-nos indagar, confrontar. [...]


RESSONÂNCIAS DO AMOR E DO DESCONCERTO: ECOS
   CAMONIANOS NA POESIA DE FLOBERLA ESPANCA

                                                                          
Jorge Valentim - UFSCar

Para a Profª. Cleonice Berardinelli.
Mestra, sempre.

As almas das poetisas são todas feitas de luz, como as dos astros: não ofuscam, iluminam...
(Florbela Espanca. O dominó preto)
 
   Nascida no limiar do século XIX, Florbela Espanca despontaria literariamente no início do século seguinte como, talvez, uma das grandes vozes da lírica portuguesa. Com uma curta trajetória de vida (1894-1930), deixa de herança uma obra constituída de 5 livros de poesia (Trocando olhares, 1915-1917; Livro de Mágoas, 1919; Livro de Sóror Saudade, 1923; Charneca em flor, 1913; Reliquiae, 1931), 2 livros de contos (O dominó preto e As máscaras do destino), além de obras que passam pela epistolografia e pelo diário. [...]


        MODERNO OU MODERNISTA? A TRADIÇÃO E O 
   TRADICIONALISMO NO MODERNISMO BRASILEIRO

                                                       
Leandro  Garcia Rodrigues - PUC-Rio

  São vários os conceitos equivocados quanto ao Modernismo e o seu campo de expressão na historiografia da Literatura Brasileira. Em geral, temos a noção errônea de que o movimento modernista simplesmente se implantou e forçosamente “destruiu” as influências e as permanências do passado e do academicismo.   As diversas cartas de Mário de Andrade e Manuel Bandeira1 contribuem para repensarmos tais conceitos, elas nos permitem uma visão crítica quanto à importância da Tradição na configuração do Modernismo na nossa literatura que não foi simplesmente “exterminada”. [...]


1 Todas as cartas aqui utilizadas foram retiradas de MORAES, Marcos Antônio (org.). Correspondência Mário de Andrade & Manuel Bandeira. São Paulo: EDUSP, 2001. Por uma opção metodológica, ao passo que as mesmas forem sendo analisadas, limitaremos em declarar apenas a data de escrita das mesmas, bem como o seu destinatário. 


 FICÇÃO, MEMÓRIA E ESQUECIMENTO: A PRÓPOSITO
                         DE
EXORTAÇÃO AOS CROCODILOS

                                                               Mariana Custódio do Nascimento - PUC-Rio

Não há dúvida de que a memória é como o ventre da alma.
(Santo Agostinho)
 
  Os limites que diferenciam literatura e história são muitas vezes considerados tênues e muitos foram os pensadores que se dedicaram a refletir sobre o tema. Já no século III a.C., Aristóteles afirmou em sua Poética que a poesia tinha um caráter muito mais filosófico que a história. Enquanto a história se dedicava ao particular, ou seja, a alguns indivíduos, a poesia detinha-se sobre o universal. Sob o âmbito da universalidade, é da esfera da literatura pintar o ser humano segundo o verossímil, de modo a possibilitar o reconhecimento do indivíduo real na ficção que desvela aspectos do mundo em que vivemos e dos sujeitos que somos. Anatol Rosenfeld, em sua “Reflexão sobre o romance moderno”, afirma, muitos séculos depois, que a extrema abstração encontrada nos romances do século XX, que optam pela presença direta do “fluxo psíquico” (ou fluxo de consciência) através de elementos como “a inversão cronológica dos acontecimentos, [...] a irrupção do passado no presente” (Rosenfeld, 1996: 90-91), é a expressão do esfacelamento da personalidade individual que “tinha de desfazer-se e tornar-se abstrata no processo técnico descrito: para que se revelem tanto melhor as configurações arquetípicas do ser humano” (Rosenfeld, 1996: 89). [...]


FICÇÕES FEMININAS DE EXORTAÇÃO AOS CROCODILOS:
      LEITURAS DO COTIDIANO NO PÓS-25 DE ABRIL

                                                              Raquel Cristina dos Santos Pereira - PUC-Rio

                                                       Se as gerações futuras quiserem saber que
                                                       país era este, que país é este, é nos livros de
                                                       António Lobo Antunes que elas vão lê-lo.
(Eduardo Lourenço)

[...] uma categoria de pessoas de larga repercussão
na história moderna: pessoas que estão  no 
caminho - no caminho da história, do progresso,
do desenvolvimento [...]

(Marshall Berman)
 
“Isto é uma guerra santa meus amigos / Uma guerra santa [...]” (Antunes, 2001: 10), declara Mimi, a primeira personagem – protagonista de Exortação aos Crocodilos a iniciar uma série de “testemunhos” que configuram o cotidiano do indivíduo português no romance. Publicado em 1999, este romance traz à cena aspectos da história mais recente de Portugal, como os problemáticos e conturbados anos 80 do século XX, época de transição (FERREIRA apud MATTOSO,1983) na política portuguesa, a da construção e da estabilidade democrática no país. Por meio das palavras singulares de Mimi, Fátima, Celina e Simone, as narradoras de Exortação aos Crocodilos, recria-se um cenário de suspense, de mortes e de atentados políticos ocorridos nos anos posteriores à Revolução de Abril, em Portugal, como o atentado ao então Ministro Sá-Carneiro. [...]


                      INTERAÇÕES ENTRE A RENÚNCIA 
        SCHOPENHAURIANA E A IRONIA MACHADIANA

                                                                              Renato Nunes Bittencourt - UFRJ

Introdução
 
A obra de Machado de Assis se encontra em um patamar de inestimável destaque na cultura literária brasileira e mundial. Em consideração a essa valorosa proeminência intelectual, pretendo, no presente texto, explanar sobre a influência exercida pela filosofia de Schopenhauer na visão de mundo machadiana, enfatizando principalmente o romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, texto que, indubitavelmente, demonstra a presença de grandes questões enunciadas por Schopenhauer no corpo de seu sistema filosófico. [...]


                               POESIA É REVOLUÇÃO

                                                 
Rita Barbosa de Oliveira - UFAM / PUC-Rio

O primeiro livro de Sophia de Mello Breyner Andresen, Poesia, (1944) mantém estreita relação com o texto “Poesia e revolução”, que integra os escritos de 1975 de O nome das coisas. O processo de mascaramento que predomina no primeiro dá lugar à reflexão sobre a arte da palavra, o ato poético e o papel do artista diante do mundo. [...]



     SOPROS MODERNISTAS EM ÁLVARO DE CAMPOS:
     UMA LEITURA DA SAUDAÇÃO A WALT WHITMAN

                                                                            Roberto Nunes Bittencourt - UFRJ

                                             Multipliquei-me, para me sentir,
                                             Para me sentir, precisei sentir tudo
                                             Transbordei, não fiz senão extravasar-me,
                                             Despi-me, entreguei-me,
                                             E há em cada canto de minha alma um altar a
                                             um deus diferente.
                                                                                                                                                                                  (Fernando Pessoa)
                                             Eu celebro a mim mesmo,
                                             E o que eu assumo você vai assumir,
                                             Pois cada átomo que pertence a mim pertence a você.
(Walt Whitman)
 
Tem-se dito de Fernando Pessoa que se encontrou em Alberto Caeiro, em Ricardo Reis e em Álvaro de Campos, ficando, porém, a pergunta: teria ele, Fernando Pessoa, encontrado a si mesmo, Fernando Pessoa? Uma pergunta que parece não ter resposta:
 
Não sei quem sou, que alma tenho.
Quando falo com sinceridade não sei com que sinceridade falo. Sou variamente outro do que um eu que não sei se existe (se é esses outros). Sinto crenças que não tenho. Enlevam-me ânsias que repudio. A minha perpétua atenção sobre mim perpetuamente me ponta traições de alma a um caráter que talvez eu não tenha, nem ela julga que eu tenho.
Sinto-me múltiplo. Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos que torcem para reflexões falsas uma única anterior realidade que não está em nenhuma e está em todas. (Pessoa, 2005: 81) [...]



VELHAS MARGENS, NOVOS CENTROS A LÍNGUA 
       DO  EXÍLIO EM
VENTOS DO APOCALIPSE DE 
                                PAULINA CHIZIANE

           Sheila Khan - University of Manchester /  Centro de Estudos
                                                                                                   Sociais (Coimbra) 

                           Pode ser quando que a gente pensava que o tempo do   
                           fim-final da guerra de encontra com os portugueses era 
                           o tempo de criança de Moçambique, sem mais outros 
                           antes passados, e afinal foi só o começar das outras 
                           nossas piores lembranças”.
                                                                                                                       (Ascêncio Freitas, A Paz Enfurecida)

      Introdução

      Deixo-me navegar pela leitura dos Ventos do Apocalipse (1999) de Paulina Chiziane, e surge-me aos olhos do meu pensamento, que a teoria pós-colonial traz, estoicamente, no seu encalço os resquícios do passado colonial (McClintock, 1994; Ribeiro e Ferreira, 2003). Mais do que esse passado que se procura anular, denegrir e maldizer, sempre o prefixo pós assume, aparentemente, o papel de arauto de novos rumos, novas mudanças que prometem a restituição da voz àqueles que se viram espoliados na sua identidade e cultura indígenas. No fundo, a possibilidade de se erguerem como sujeitos titulares de uma narrativa que lhes foi roubada, silenciada, como que tornada invísivel, ou inexistente, mediante esse grande aparato ideológico, que foi o colonialismo português no território moçambicano. Com a independência em Moçambique a 25 de Junho de 1975, o prefixo pós reavivou-se de uma forma unânime, pujante e calorosa perante o projecto de construção da nova sociedade moçambicana. Contudo, a Revolução não se concretizou do modo como foi sonhada e pugnada por tantos moçambicanos e moçambicanas (e.g. Khan, 2003), pois das promessas pós-coloniais emergiram milando, ódios, angústias, desesperos e apocalipses humanos, que o livro de Paulina Chiziane, Ventos do Apocalipse (1999) permite tocar, sentir através dessa genialidade em trazer para a escrita a oralidade africana, neste caso, as formas vivenciais e culturais da oralidade moçambicana. [...]



Os artigos na íntegra encontram-se na seção e-books, revista Teia Literária 1.